Poetisa surda, Renata Freitas realiza projeto de inclusão por meio da literatura

Renata Freitas é professora de libras e trabalha para ampliar conhecimento e acesso cultural de outras mulheres não ouvintes

"Sou referência para outras mulheres surdas", afirma com orgulho a artista Renata Freitas. É por se considerar um exemplo de força que a poetisa idealizou o projeto Vozes Surdas, que conta histórias de inspiração e ajudam mulheres que não usam a voz para se comunicar.

Renata, de 34 anos, nasceu com surdez e foi educada em escola de ouvintes. Por meio da leitura labial, ela cresceu se comunicando com seus amigos do colégio.

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"Na infância é muito fácil brincar entre crianças, mas na adolescência a gente sente esse impacto porque as meninas conversavam em português sobre futuro e paqueras, nesse momento eu comecei a sofrer os impactos de não conseguir compreender o que elas diziam e não conseguir interagir com elas", relata a artista sobre seu amadurecimento.

"Quando eu estou nesse meio em que minha família e amigos ficam falando em português, eles esquecem de mim, é como se eu não existisse naquele momento", conta Renata, que somente na faculdade passou a ter contato com a comunidade surda.

Aos dezoito anos, Renata conheceu a Associação de Surdos do Ceará e um "novo mundo" se abriu. "Quando eu comecei a ter contato com a comunidade surda foi que eu passei a ter informação de verdade porque eu comecei a ver as coisas na minha língua. Meu mundo com a lingua de sinais ficou bem mais completo", explica.

A partir do aprendizado em libras, Renata cresceu em todos os âmbitos de sua vida. Ela se formou em moda, fez pós-graduação em Tradução e Interpretação de Língua de Sinais/ Língua Portuguesa, estudou educação bilíngue no ensino de libras e atualmente é professora de libras e artista.

"Eu tenho várias manifestações artísticas, dou oficinas, palestras, faço poesias, trabalho com interpretação de música, dou aula de literatura e vou para todos os eventos. Tudo isso que eu tenho feito começou de fato em 2019, visto que as redes sociais deram um 'boom' e eu comecei a apresentar minhas poesias nas redes sociais e faço até hoje", explica.

Nesse processo de autodescoberta, também encontrou o amor. Renata conheceu Daniel enquanto tinha os primeiros contatos com a lingua de sinais.

Foi a partir de uma troca de olhares em um primeiro momento e um beijo posterior em viagem de Réveillon que os dois se aproximaram. De lá para cá, montaram sua família, atualmente com dois filhos.

O fazer artístico de Renata está diretamente relacionado a Daniel, que foi posteriormente o seu professor de literatura surda na pós-graduação.

"Era um assunto que me chamava muita atenção. Nesse processo que ele preparava as aulas e eu participava delas, comecei a me identificar com isso e tentar fazer poesias também", narra.

Ela destaca que na literatura existe uma forma específica de fazer poesia em libras e que elementos como expressão facial e ritmo são recursos usados para aguçar o interesse dos visual das pessoas surdas. Em suas obras, a artista narra sobre perspectivas do mundo, crianças, e vivências.

Outra curiosidade sobre Renata é uma das ferramentas que ela usa para ensinar e despertar o interesse das pessoas por lingua de sinais: a estranheza. Em suas redes sociais: ela traduz histórias curiosas e estranhas que viralizam em português nas redes sociais.

"A nossa vida como surdos é 24 horas num mundo de ouvintes, que é um mundo em que todo está falando em português e a gente não tem acesso a essas informações. Se alguém traz uma história curiosa, a gente fica logo querendo saber e querendo mais e mais", afirma a artista.

Ela continua: "Eu vi nas redes sociais uma história bizarra e quis ter o papel de ser multiplicadora daquela história, eu queria levar para os surdos que não tem acesso àquilo. Então eu comecei a trabalhar com tradução".

A partir desse interesse, Renata começou a compartilhar histórias interessantes da internet também por meio de libras nas redes sociais.

"Nós somos sedentos de saber mais coisas porque o que tem em português não é acessível para todos os surdos, pois alguns não têm acesso ao português escrito por uma questão histórica educacional. Ler em português não é fácil para todos", compartilha.

Segundo ela, os surdos no Brasil têm ganhado cada vez mais destaque no meio artístico. No Ceará, ainda são poucos nomes conhecidos e estes se popularizaram principalmente a partir de 2019; como é o caso das contadoras de história Lyvia Cruz e Kátia Lucy.

"Isso é muito importante porque cada uma dessas artistas traz um pouco de si, algo específico da sua vivência e é uma referência para todos nós. No meu caso, eu trago a poesia e isso é referência para outras surdas também", destaca Renata.

Representatividade e informação

Em atuação desde fevereiro deste ano, "Vozes Surdas" é um projeto que começou no Instagram por meio de três mulheres: Renata Freitas, Graziele Gomes e Tay Parente. A ideia da iniciativa começou por uma vontade que as três tiveram de fazer vídeos incentivando outras mulheres surdas.

"Esse sinal que a gente faz do Vozes Surdas não é referência à fala oral, mas sim com a voz de "dar voz", de "ter voz", de se expressar. No caso, é a língua de sinais", explica Renata.

Sobre a idealização dele, ela aponta: "A gente tem muitas mulheres surdas com representatividade muito grande na academia, no mercado de trabalho… queríamos mulheres reais contando suas vidas reais e trazendo questões da realidade da mulher surda".

Ainda no início, o projeto está desenvolvendo poesias, entrevistas com mães que são surdas, debates sobre feminismo, informações sobre saúde e direito da mulher, e histórias reais de mulheres surdas.

"Esse projeto tem o foco na mulher surda, mas também é um convite para as ouvintes. Tudo vai ser acessível. As mulheres surdas vivem uma realidade que nem todo mundo conhece, as pessoas têm uma ideia muito equivocada de que não somos capazes, não nos expressamos e nem temos nada a oferecer e essa curiosidade vai ser sanada com o 'Vozes Surdas'", sustenta.

Vozes Surdas

  • Instagram: @vozessurdas
  • Para acompanhar as poesias de Renata Freitas nas redes sociais: @renata_freitas_libras

 

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