'Homem com H' honra a música brasileira com desbunde e Ney 'comportado'

Em musical em cartaz no Teatro RioMar, a personalidade de Ney Matogrosso é fio condutor de espetáculo emocionante e divertido

A saga do garoto tímido que busca o teatro para “se soltar” e se transforma, com talento e rebeldia, em um dos maiores performers da cultura brasileira. Assim se estrutura “Homem com H”, musical que faz jus à grandiosidade de Ney Matogrosso. A montagem segue em cartaz até sábado, 27, no Teatro RioMar.

Em diálogo que mostra negociações de Ney com representantes de uma gravadora, o executivo “acusa” o artista de estar “comportado demais” ao escolher um figurino que escapa das plumas e lantejoulas de outrora. Essa cena sintetiza bem a premissa do espetáculo: Ney não quis se repetir nem se caricaturar.

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Conhecido nacionalmente desde 1973 com o estouro da banda Secos & Molhados, o músico cravou no imaginário popular suas clássicas maquiagens e figurinos ousados. Ao longo de mais de cinco décadas de carreira, porém, o cantor também optou por uma calça jeans azul básica e uma regata branca. Ainda assim, continuou exuberante.

A dramaturgia de Emilio Boechat e Marilia Toledo reverencia os múltiplos lados da voz de músicas como “Sangue Latino” e “Rosa de Hiroshima”. A partir dessa personalidade abundante de nuances, a obra desfila as canções marcantes de maneira orgânica e costuradas com exatidão a partir da direção musical de Daniel Rocha.

Exemplo disso é a escolha de “Eu quero é botar meu bloco na rua” para o momento de chegada do Ney, aos 20 e poucos anos, na assustadora Brasília das burocracias. Antes da carreira artística, o jovem da cidade Bela Vista, no Mato Grosso do Sul, foi funcionário público e precisou bailar com a caretice mantendo seu rebolado. No musical, o elenco dança o estranhamento em passos nada óbvios.

As coreografias, inclusive, são outro acerto da obra cênica. Fernanda Chamma conduz corpos versáteis que escapam do problema recorrente de musicais com elencos grandes: um abismo entre a atenção para o canto e para o corpo. Em “Homem com H”, a trupe encabeçada pelo ator Renan Mattos orquestra passos e notas com zelo.

O protagonista, inclusive, se equilibra na corda bamba. Não é fácil levar Ney Matogrosso para o palco sem soar fantasioso. E Renan consegue com devoção ao seu muso. O respeito ao homenageado permeia as decisões do ator ao não buscar o caminho mais fácil de imitar sotaque ou trejeitos. O Ney está ali – e Renan está junto.

Na busca por engajar o público com identificação, a peça derrapa na pressa de incluir famosos como Rita Lee, Leonardo Villar, Luiz Fernando Guimarães e Simonal. Essas aparições são corridas na dramaturgia e não precisariam ser tão literais, afinal, a música brasileira já está devidamente celebrada ao longo de todo o espetáculo.

Um contraponto é o aproveitamento do tempo dedicado a Cazuza (interpretado por Vinícius Loyola). O arco da relação dos dois é bonito e tem os silêncios necessários para contar o amor livre de Ney e “Caju” – mesmo que tenha ficado repetitivo o arquétipo de “porra do louco” da voz de “Exagerado” versus o pé no chão do protagonista da obra.

Isso não significa, entretanto, que o desbunde não esteja presente. O sexo, as drogas e o ambiente descontraído dos bastidores da arte tecem a montagem. A farra também faz parte da história do Ney e isso é gostoso de ver em cena.

Assim como o clima de festa e muitos toques de humor (alguns até deslocados, como as cenas de estúdio da TV no início da carreira de Ney), o musical não tem pudor de abraçar a emoção. “Poema” cantada em meio à epidemia de Aids e “Mal necessário” numa cena de luto e fé constroem momentos de genuína conexão com a plateia.

Unindo talentos plurais em ficha técnica assertiva, “Homem com H” homenageia a diversidade da cultura brasileira e, como escreveu Caio Fernando Abreu, é fiel a um artista “épico e arquetípico”, pois com o Ney Matogrosso entre nós “nos tornamos belos através dele e muito mais livres e muito mais nobres”.

Espetáculo: Ney Matogrosso - "Homem com H"

  • Quando: sexta, 26, às 20 horas; e sábado, 27, às 15 (com acessibilidade) e 20 horas
  • Onde: Teatro RioMar Fortaleza (rua Des. Lauro Nogueira, 1500 - Papicu)
  • Quanto: a partir de R$25, disponíveis no site Uhuu 
  • Classificação: 14 anos (Acesso de menores somente acompanhados dos pais ou maior responsável)
  • Mais informações: @teatroriomarfortaleza

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