Por que a Netflix investirá bilhões na Coreia do Sul?

País asiático se tornou uma potência do entretenimento, com séries e filmes aclamados mundialmente, como "Parasita" e "Round 6"
Autor DW Tipo Notícia

A Coreia do Sul se tornou uma superpotência do entretenimento – não somente por “Round 6”, a série mais assistida da história da Netflix, mas também por outros sucessos internacionais como “Todos nós estamos mortos”, “Uma advogada extraordinária” e “A lição”. Em 2019, “Parasita” se tornou o primeiro longa de um idioma que não fosse o inglês a ganhar o Oscar de Melhor Filme. E isso é apenas uma fração do novo sucesso internacional do país ao lado do fenômeno mundial K-Pop e de outros gêneros da arte e entretenimento.

"Comida coreana, maquiagem, jogos, vlogs, conteúdo queer, música e dramas coreanos são super procurados no mundo internacional", pontua David Tizzard, professor assistente de educação na Universidade Feminina de Seul e colunista de assuntos sociais num jornal diário sul-coreano.

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"O prefixo K traz consigo capital social. Um símbolo de modernidade, riqueza, elegância e associações moderadas, mas badaladas. Essa é uma transformação maravilhosa para um país que já foi associado com pobreza e tecidos baratos", completa.

Investimento bilionário da Netflix

No mês passado, a Netflix anunciou que investirá 2,5 bilhões de dólares na produção de conteúdo na Coreia do Sul nos próximos quatro anos, consolidando o já imponente portfólio sul-coreano de filmes, séries, reality shows, jogos e música. O investimento adicional foi confirmado durante uma reunião entre o presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeol, e o CEO da Netflix, Ted Sarandos, em Washington. Altos executivos de muitas das maiores empresas do país asiático acompanharam o presidente em sua viagem aos Estados Unidos.

"O investimento se tornará uma oportunidade enorme, não somente para a indústria do entretenimento e criadores de programas, mas também para a Netflix", destacou o presidente. Já Sarandos ressaltou que o investimento "fortalecerá a nossa longa parceria com a Coreia do Sul". "Fomos capazes de tomar essa decisão porque confiamos muito na indústria de entretenimento sul-coreana, e continuaremos a produzir grandes histórias", afirmou.

Tizzard observa que bandas, séries e filmes da Coreia do Sul compartilham uma série de fatores de identificação comuns que os tornam atraentes para o público internacional. Talvez o primeiro e mais importante atrativo, tanto para consumidores quanto para investidores e parceiros, é a alta qualidade e os valores de produção.

Há ainda o fato de que a indústria foi revolucionada pela tecnologia, aponta Tizzard, tornando o conteúdo, que no passado era copiado ilegalmente em CDs, mais acessível. Em plataformas, como a Netfilx, consumidores internacionais podem encontrar facilmente produções sul-coreanas, pois "elas são apresentadas aos usuários automaticamente, mesmo sem serem buscadas", acrescenta o especialista.

Mais de 60% dos 231 milhões de assinantes da Netflix em 190 países já assistiram a produções sul-coreanas pelo menos uma vez. Um último fator seria a mudança dos valores globais, segundo o especialista. "Nós vivemos num mundo no qual a identidade se tornou mais importante. As pessoas não querem mais produções lideradas por brancos, apresentando apenas os valores americanos. Elas querem etnias diferentes, valores, representações, interseccionalidade e assim por diante.
À medida que o Ocidente se move nessa direção, a Coreia do Sul chega no momento perfeito para oferecer isso".

Nesses tempos de mudança, as produções sul-coreanas têm uma vantagem vital, segundo Tizzard. "Elas são diferentes o suficiente para serem exóticas, mas semelhante o suficiente para serem entendidas. Se fosse mais semelhante, o público ficaria entediado e se tornaria pastiche. Se fosse mais diferente, o público não entenderia e não se envolveria", explica.

Para Kwon Jung-min, especialista em cultura popular do Leste Asiático na Universidade de Portland, nos EUA, o apoio financeiro da Netflix pode abrir novas portas para o setor criativo sul-coreano. "A Netflix é conhecida por apoiar a liberdade de expressão e criatividade dos criadores, que não são sempre respeitadas na atmosfera conservadora da Coreia do Sul".

"Por exemplo, a Netflix aceita a criação de conteúdo focado em minorias, como programas queer, narrativas dirigidas por mulheres, ou programas mais orientados para o gênero, como Todos nós estamos mortos, que não recebeu muita atenção de investidores locais", explica a especialista.

Kwon destaca, porém, que a posse dos direitos intelectuais da Netflix é alvo de controvérsia. Segundo ela, o monopólio do serviço de streaming no mercado sul-coreano está ameaçado os serviços locais, como Watcha, TVING e Wavve. Sob o presidente Yoon, a indústria do entretenimento cresceu e se tornou uma parte fundamental da economia nacional e uma fonte crítica de receita externa, além der ser uma maneira de projetar o soft power da Coreia do Sul. "Isso é o que chamamos de coreanização. Com mais pessoas ao redor do mundo tendo uma visão mais positiva Coreia do Sul, Seul ganha um papel internacional mais forte", avalia Tizzard. "A Coreia do Sul está influenciando o mundo – sutilmente".

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