Titãs comemoram 40 anos de banda com lançamento de "Olho Furta-Cor"

Com 14 canções, o disco apresenta um "olhar diverso" sobre diferentes aspectos a partir de parceria com Rita Lee e referências aos tempos políticos atuais vividos no Brasil

“É muito bacana constatar que a nossa química ainda funciona, que ainda temos um grande barato de fazer música. Para nós, é a melhor maneira de comemorar o fato de a banda ter 40 anos, ter uma história e ainda ser relevante - pelo menos para nós mesmos. Sentimos muito prazer no que fazemos”. As palavras do cantor e compositor Sérgio Britto em entrevista ao Vida&Arte revelam o “combustível” por trás da continuidade dos Titãs depois de 40 anos na estrada.

Como o artista aponta, fazer trabalhos novos é uma das motivações que guiam o grupo de rock em um caminho musical atravessado por obras de impacto para a música brasileira, a exemplo dos discos “Cabeça Dinossauro” (1986), “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” (1987) e "Õ Blésq Blom" (1989).

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Nesta sexta-feira, 2, um novo passo foi adicionado à discografia titânica: chegou às plataformas digitais o álbum “Olho Furta-Cor”, primeiro de inéditas desde “Doze Flores Amarelas - A Ópera Rock” (2018). Com 14 canções, o disco apresenta um “olhar diverso” sobre diferentes aspectos a partir de parceria com Rita Lee, referências aos tempos políticos atuais vividos no Brasil, reflexões sobre autoconhecimento e acenos para letra com viés mais romântico.

“Nesse ‘Olho Furta-Cor’ é como se tivéssemos um olhar multicolorido, essa cor que contém todas as cores, como se estivéssemos observando com um olhar diverso para o Brasil e para o mundo. Acho que comentamos muitos fatos que têm acontecido ultimamente, como esse isolamento da pandemia, o momento político difícil, essa polarização no Brasil e no mundo. Acho que todos esses temas estão presentes no disco e outros mais leves”, explica Sérgio Britto.

O primeiro resultado dessa tentativa de olhares mais diversos na produção aparece logo na faixa de abertura. Em “Apocalipse Só”, a banda antecede o riff de guitarra com a inserção de cantos indígenas nos primeiros segundos. Em seguida, o coral de crianças do Instituto Anelo anuncia: “O céu/ Espelho do chão/ Fumaça/ Engole avião/ O chão/ Reflexo do céu/ Silêncio/ Se cobre de breu”.

Associando diferentes vozes brasileiras, há o lamento conjunto pelo “apocalipse”. “A música fala de devastação, de desolamento em relação ao que tem acontecido com a Amazônia”, comenta o vocalista. Ele acrescenta: “Nós achamos que poderia ficar interessante o canto das crianças para contrastar um pouco com essa sensação de fim de mundo que a letra passa. Ao ser cantado por crianças, acho que dá um ar de esperança de possível renovação para as coisas”.

O espírito de necessidade de renovação segue na segunda faixa, com o single “Caos”, “presente” de Rita Lee, Roberto de Carvalho e Beto Lee. Na guitarra, Tony Belotto, e no baixo, Branco Mello, dão mais força às mensagens. O sentimento de contestação é transmitido pelo rock e pela letra com alma anarquista - como no verso “Hay gobierno soy contra!”.

Mergulhar dentro de si

Em “Olho Furta-Cor”, há espaço também para falar sobre os desafios do autoconhecimento ao longo da adolescência - intensificados durante a pandemia. Isso acontece na música “Papai e Mamãe”. “Ela fala um pouco desse mergulho para dentro de si mesmo, para você descobrir a sua maneira de ser e crescer, que é um assunto eterno da adolescência”, aponta Sérgio, que também dedica a canção à sua filha.

“O mais curioso é que, quando eu comecei a fazer essa música, comecei com um tom paternal, falando ‘Venha ver o mundo, saia’, mas depois vi que isso era um equívoco. Eu não ia conseguir fazer uma canção que tocasse as pessoas que estão nessa situação, então inverti um pouco e passei a fazer do ponto de vista dessa pessoa que está isolada e mergulhando dentro de si mesma”, enfatiza.

Como fez no Acústico MTV de 1997 com a música “Go Back”, Sérgio Britto canta em espanhol em “Olho Furta-Cor” na faixa “Por Galletas”. A canção surgiu após o vocalista se deparar com notícias de casos de soldados da ONU que abusaram sexualmente de crianças no Haiti em 2018.

“Eu fiquei muito chocado com isso, e essa música leva a uma reflexão: até que ponto chega a barbárie no mundo em que vivemos, quando até quem está ali para ajudar pode, na verdade, fazer um mal maior? Então, achei um assunto interessante isso de colocar em xeque essa questão do que é o bem e do que é o mal”, comenta.

Em meio ao confronto contra a maldade humana, a canção “Preciso falar”, de Tony Belotto, chega para espalhar o amor romântico - que, nesse caso, é vivido entre dois homens. “Demorei pra perceber / Demorei pra entender / Eu sou homem, você também/ Eu te quero, o que e que tem?/ Eu sou homem, você também/ Eu te quero, te quero bem”, declara a faixa.

Passado, presente e futuro

O amor retratado em "Preciso falar" é mais um tema que recebe o “olhar diverso” da banda em seu novo álbum. Na visão de Sérgio Britto, é mais um elemento inédito para o grupo - o que pode apontar também para o futuro que pode ser explorado pelos Titãs.

Nessa relação entre passado, presente e futuro em meio aos 40 anos da banda, o vocalista fala sobre quanto dos Titãs de quatro décadas atrás está no álbum e quanto do que o grupo pode vir a ser também pode ser encontrado no disco.

“Esse encantamento com o que você está fazendo permanece intacto, aquele lá do comecinho, quando éramos adolescentes, está presente neste trabalho. Fizemos com muito entusiasmo, não sei se por causa das circunstâncias de estarmos retomando nessa pandemia, mas ele teve uma importância muito grande para nós do ponto de vista de interação e prazer em fazer música. Em relação ao futuro, nós sempre colocamos sementes de coisas que podemos vir a fazer”, relata.

Leia também | Confira mais histórias e opiniões sobre música na coluna Discografia, com Marcos Sampaio

“Olho-Furta Cor”

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