Professora Catherine Furtado reflete sobre sua relação com o maracatu

Catherine Furtado, doutora em Educação e professora do curso de Música da Universidade Federal do Ceará (UFC), conheceu o maracatu há 15 anos

10:05 | Fev. 26, 2022

Por: O Povo
Catherine Furtado é doutora em Educação Brasileira, professora do curso de Música da Universidade Federal do Ceará (UFC), etnomusicóloga, baterista e percussionista (foto: Rômulo Santos/Arquivo Pessoal)

Catherine Furtado é doutora em Educação, professora do curso de Música da Universidade Federal do Ceará (UFC), percussionista, baterista e pesquisadora em etnomusicologia. Em texto, ela escreve sobre sua trajetória como brincante de maracatu e como sua relação com o Carnaval influenciou em sua vida:

Quando penso nos meus 15 anos de trajetória como batuqueira, professora, pesquisadora e carnavalesca, eu sinto que o trecho dessa loa me banha de alegria e com a força dos tambores. “O Batuque Meu” é uma loa de autoria de Descartes Gadelha e Bênson Queiroz, feita para o maracatu Rancho Alegre no carnaval dos anos 1960. Eu a conheci na interpretação da cantora Inês Mapurunga em seu livro-musical “Maracatus, Afoxés, coroações, rezas e outros batuques” (2016) e em suas apresentações em palco. Foi assim a sensação quando comecei a batucar nos grupos de maracatus da cidade de Fortaleza.

Fui apresentada pelo nosso estimado griot (difusor de tradições) Descartes Gadelha em uma oportunidade de irmos juntos ao Maracatu Solar. A riqueza das cores, dos diversos tambores e da entrega artística das pessoas foi um embalo de encantamentos. Maravilhada pelos sons, entre graves e agudos dos diversos tambores, eu acredito que foi daí que os maracatus passaram a tocar todos os dias dentro de mim, de noite e de dia.

Nos ensaios carnavalescos, eu entendi que não tocava apenas um instrumento musical, mas que, na verdade, aquele instrumento musical, o Tambor, reverberava toda a cena musical, dramática, histórica e cultural da nossa sociedade brasileira. E, sim, somos resistentes e criatives! Além disso, a música percussiva possibilita de forma direta, lúdica e vibrante uma conexão profunda com nossa ancestralidade. Então, de forma geral, foi nesse traçado que caminhei nas encruzilhadas dos tambores carnavalescos.

Nessa possibilidade, a inspiração, a partir dessa ambiência cultural trazida diretamente pelo tambor, pelo carnaval e pelo maracatu, me possibilitou cultivar a percussão nos espaços acadêmicos como, em especial, no curso de Música da UFC, local onde atuo como professora de percussão, e no projeto de extensão Grupo de Música Percussiva Acadêmicos da Casa Caiada da UFC, onde atuo na regência artística. É nessa realidade que os Saberes Percussivos saem das minhas pesquisas como, por exemplo, na minha tese de doutorado sobre “Os saberes percussivos nas escolas públicas da cidade de Fortaleza”, e ganham prática em ressoar o abraço da academia e da comunidade, que é algo tão necessário à nossa educação musical.

Com isso, o ensino e a aprendizagem através das trocas da oralidade, corporalidade, improviso e a presença de mestres e maestras da cultura no espaço educativo ganham a construção de um fazer artístico criativo e com influências diretas da nossa cultura afro, afro-brasileira, nordestina e indígena. E isso é o que nos mostra a escola do nosso maracatu, que, de forma rica e contínua, nos atravessa todos os anos com seus diversos temas dos desfiles, batucadas em sua diversidade de ritmos e andamentos, características plurais e singulares da nossa musicalidade do maracatu cearense.

Explorar essa diversidade em pesquisa e como brincante é priorizar uma atitude compromissada na relação ciência e a arte como uma necessidade séria e fundamental para o desenvolvimento crítico, intelectual e artístico de todo ser humano, por isso, a música percussiva e todo seu contexto afro-brasileiro é ato artístico, científico e social para nossas bases educativas.

Sabemos que ainda estamos em período da pandemia e isso nos coloca em cuidados obrigatórios para não realizarmos aglomerações características de um momento carnavalesco, mas isso não nos impede de manter a reverberação de uma obra artística pulsante e com Asè dentro de nossas memórias e sustento na ciência que as vacinas salvam e que esse período passará.

É perceber que, com isso, o toque de um tambor é articulado com os sonhos, desafios e criações de uma comunidade. E que, nessa construção, é preciso, sim, apoio financeiro e reconhecimento dessa grande obra que é uma escola carnavalesca e que nos traz nos seus mais diversos espaços físicos, como nas ruas e nas avenidas, o abrilhantamento da nossa cultura.

Catherine Furtado, doutora em Educação e professora do curso de Música da Universidade Federal do Ceará (UFC)

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