Game "It Takes Two" aposta em narrativa de comédia romântica
Mesmo imperfeito, "It Takes Two" é uma comédia romântica imperdível de se assistir e jogar
"It Takes Two" é intencionalmente limitado, originado da mente criativa de um designer de games polêmico e centrado em uma premissa muito mais apropriada para o cinema do que para os videogames. Ainda assim, quase como se a mágica do enredo tomasse forma no mundo real, o título é incrível. É de longe o melhor jogo cooperativo dos últimos anos e uma aventura que só não é mais obrigatória que a presença de outra pessoa para poder aproveitá-la.
Com cerca de 15 horas de jogo, "It Takes Two" é um game cooperativo de plataforma em terceira pessoa, repleto de experiências interativas para dois jogadores, que usa o humor para contar uma história fantástica e, ao mesmo tempo, humana e interessante. Segundo seu criador, o designer e cineasta Josef Fares, é uma comédia romântica em formato de videogame - algo genuinamente novo em meio a uma indústria saturada de títulos similares e que pouco se arriscam a trazer enredos diferentes.
É + que streaming. É arte, cultura e história.
São quase 30 minijogos diferentes que levarão os jogadores a realizarem tarefas em conjunto, similar ao que pode ser visto no brilhante "Portal 2", um dos melhores games cooperativos de todos os tempos. Porém, "It Takes Two" eleva o grau de variedade para além dos minijogos, trazendo também cenários, personagens e momentos distintos e icônicos.
Leia também | Streaming gratuito lança conteúdos exclusivos para crianças
Há cenas que claramente deram muito trabalho para serem feitas, mas que duram apenas o tempo necessário para o enredo continuar e lhe levar para outro local. O resultado é um constante estado de surpresa e diversão.
Infelizmente, nem sempre “novo” significa “melhor”. A tentativa de encaixar uma comédia romântica em um videogame é louvável, mas talvez difícil demais para ser bem realizada.
Cody e May são um casal à beira do divórcio que se veem encolhidos e transformados, pela imaginação de sua filha, em bonecos. Para voltarem ao normal, contam com a ajuda do Dr. Hakim, um livro sobre conflitos matrimoniais que ganha vida e guia o casal em busca do retorno à normalidade.
Leia também | BBB 1: canal Viva exibe primeira edição do reality show em maio
Há um “quê” de bizarro e infantil que permeia toda a narrativa e, às vezes, atrapalha, seja nos momentos intencionalmente cômicos, seja nos mais sérios. Similar a "Alice no País das Maravilhas", o surrealismo serve de cenário para discussões humanas e momentos impactantes, mas que, por vezes, falham em transmitir a mensagem por uma falta de consistência.
Em termos de jogabilidade, ele exibe uma tela dividida a todo momento (exceto em sequências cinematográficas), em que os jogadores assumem um lado e podem explorar livremente cada belíssimo ambiente presente. Ao encontrarem obstáculos, estes geralmente dependem da cooperação para serem superados.

Diferente de títulos anteriores do mesmo estúdio (Hazelight) o controle dos personagens em "It Takes Two" recebeu tanto carinho quanto os cenários e os quebra-cabeças em cada um deles. Cada personagem traz um conjunto simples de movimentos, mas que podem ser usados conjuntamente para realizar ações distintas.
Leia também | Projeto usa inteligência artificial para lançar canções "nunca feitas"
Cody e May têm também habilidades específicas e que dão aos jogadores a chance de jogar cada fase de duas maneiras diferentes, trocando os personagens controláveis em cada vez. O problema aqui é que, por se tratar de um jogo de plataforma e ação, há uma curva de aprendizado relativamente íngreme para players pouco experientes.
A situação piora um pouco nas lutas contra chefes, que exigem cooperação sob pressão para derrotar alguns dos inimigos. Com paciência, mesmo alguém pouco habituado aos comandos tradicionais consegue aprendê-los e executá-los com tranquilidade.
Cada centímetro do mundo criado em "It Takes Two" merece ser explorado, com minijogos escondidos que podem passar despercebidos pelos jogadores em todos os lugares. O cenário em si é fantástico e familiar ao mesmo tempo. Isto porque o game quase que por inteiro se passa dentro da casa dos protagonistas, que parece gigante a partir de suas perspectivas encolhidas e revela um ambiente inteiramente novo, alusivo ao filme clássico “Querida, Encolhi as Crianças”.
Leia também | Os 100 anos de Maria Clara Machado, nome maior do teatro infantil
Cada espaço no jogo guarda uma ferramenta única para ser usado por Cody e May. Em uma das fases mais interessantes, ambos recebem a metade de um ímã e precisam usar o poder de atração e repulsão de cada metade para se moverem pelo mapa e realizarem quebra-cabeças específicos para a nova mecânica.
É interessante destacar que, em algumas partes, o game chega a se moldar para tirar melhor proveito dos novos equipamentos. Em uma determinada seção, a perspectiva assume um caráter isométrico, e o título se torna algo mais próximo de "Diablo" ou "Torchlight", o que só aumenta o senso de novidade e de descoberta da aventura.

O ponto crítico de "It Takes Two" se encontra em seu roteiro que, às vezes, falha na promessa de momentos engraçados e tocantes. Entretanto, é deste mesmo roteiro que elogios podem ser feitos, especialmente na retratação do casal protagonista. Cody é um pai dono do lar, enquanto May - a mãe - é uma engenheira profissional e aparente provedora da casa.
Leia também | Projeto oferece mais de 286 oportunidades de formação para artistas cearenses
Ademais, algumas cenas e momentos trazem questionamentos interessantes e pouco explorados no meio gamer. Metáforas sobre desunião, ciúmes e aceitação são trazidas durante a jogatina de maneira bastante agradável na maior parte do tempo.
Outro foco de elogios aqui presente está na captura de movimentos e na atuação dos atores que representam Cody e May. Ambos refletem em seu jeito de andar e agir suas próprias personalidades. Cody é desligado e desastrado, sua versão encolhida é feita de argila e maleável. Já May - que é mais séria e pragmática - vira uma boneca de madeira e tem movimentos mais precisos e estáticos.

As armas e equipamentos encontrados pelo jogo também refletem a diferença entre os dois personagens. Enquanto Cody faz uso de um cajado mágico que solta gelo, May branda uma espada em chamas contra seus inimigos. Enquanto Cody usa um lançador de gel de churrasco, May atira pequenas espoletas que fazem o gel explodir.
Leia também | Games: Expectativas e novidades para o mês de abril
"It Takes Two" é um prato cheio e que serve duas pessoas tranquilamente no quesito diversão. Tem seus problemas, especialmente em falhar na tentativa de ser uma comédia romântica interativa, mas sem dúvida apresenta mais qualidades do que defeitos. Em um mercado cheio com poucos títulos cooperativos, o jogo parte a coroa ao meio e reina soberano como o melhor co-op de 2021 até agora.
"It Takes Two" está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S, e PC.
Davi Rocha é produtor de conteúdo do canal Bacontástico
Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente