Ex-detentas contam a vida atrás das grades no filme "Flores do Cárcere"

Após circulação em festivais, documentário "Flores do Cárcere" estreia digitalmente neste Dia Internacional da Mulher. Filme apresenta histórias de dor e superação de ex-detentas

00:30 | Mar. 08, 2021

Por: Ana Flávia Marques
Filme Flores do Cárcere, sobre as ex-detentas da cadeia de Santos (SP), ganha lançamento digital no Dia Internacional da Mulher (foto: Divulgação)

"Flores do Cárcere", filme sobre ex-detentas da Cadeia Pública de Santos (SP), estreia digitalmente hoje, 8 de março, data em que é celebrado o Dia Internacional da Mulher. O documentário conta a história de seis mulheres egressas, abordando desde os motivos que as levaram à prisão até como reconstruíram suas vidas após deixar a cadeia. A obra será lançada primeiramente na plataforma NOW e, a partir do dia 18, estará disponível em serviços como Vivo, iTunes, Google Play, YouTube Filmes e Looke.

Com direção de Bárbara Cunha e Paulo Caldas, o filme é inspirado no livro homônimo escrito por Flávia Ribeiro de Castro, que realizou um trabalho social na cadeia de Santos em 2005. A obra contém depoimentos e arquivos gravados ainda em 2005, durante o trabalho de Flávia. Após 12 anos, as ex-detentas Ana Pérola, Charlene, Dani, Mel, Rosa e Xakila retornaram à prisão para gravar o documentário. No período de gravações, a cadeia estava desativada para reforma.

Enquanto caminham pelos espaços do cárcere, elas relembram da época vivida no local. Entre memórias, relatam que mais de vinte mulheres dividiam uma cela com seis camas. "Não acredito que fiquei dois anos e seis meses aqui dentro. Como que eu pude viver num quadradinho desse, tão pequeno, num lugar escuro, cheio de mágoas" relembra Xakila. Eram 250 detentas numa prisão com capacidade de 60. "Eu quero ir embora, está muito cheio, uma dormindo em cima da outra, eu quero ir embora. Essa cadeia tá lotada" implora uma das presas nas gravações feitas em 2005. "Eu só queria que tratasse as meninas com mais dignidade. Que reeducação é essa? Comida estragada, nada pra fazer. Então eu passo a palavra pras autoridades: isso que é reeducar?" questiona uma outra detenta. "Reeducar é dar trabalho, dar estudo e dar condições psicológicas para a pessoa se tornar um ser humano melhor" completa. 

Silvia, que era chefe de carceragem, também é entrevistada no documentário e relata os motivos pelos quais as mulheres eram presas. Ela cita casos de furto porque o filho estava passando fome e de mulheres envolvidas no tráfico por conta do marido. Xakila confirma a fala de Silvia. "A maioria por causa de homem, porque foi levar droga do marido", afirma ela. Nas gravações, Dani relata que se envolveu no crime através do primeiro namorado, que traficava drogas. "Eu comecei a ser muito submissa a ele, eu sempre fiz tudo que ele queria. Eu nunca me impus com ele" conta. "Eu sabia o que estava fazendo, mas a motivação pela qual eu estava fazendo era simplesmente aquela menina boba, apaixonada, querendo ajudar o namorado". Ao serem pegos pela polícia, o namorado de Dani afirmou que ela era a responsável pela droga.

Segundo os diretores, lançar o filme no Dia da Mulher possibilita dar importância e espaço a essas mulheres para falar suas experiências. "Nós achamos que era uma data para falar das condições de todas as mulheres, não apenas das condições de privilégios", afirma Bárbara Cunha. "Propomos no filme que, ao invés de estigmatizar e desumanizar essas mulheres, olhemos para suas trajetórias, nos responsabilizando por desigualdades históricas", comenta o diretor Paulo Caldas.

O filme foi exibido em 2019 na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e no Festival do Rio. Em 2020, passou pelo Festival de Cinema Brasileiro de Paris, Los Angeles Brazilian Film Festival e FESTin Lisboa, onde recebeu menção honrosa.