Covid: médico cearense denuncia presidente do CFM por pesquisa de opinião sobre vacinação de crianças

O CFM divulgou nota de esclarecimento sobre a pesquisa da entidade sobre percepção dos médicos acerca da obrigatoriedade da vacinação de crianças contra a Covid-19

18:10 | Jan. 16, 2024

Por: Ana Rute Ramires
VACINA Pentavalente e DTP são as principais formas de prevenir a doença (foto: FERNANDA BARROS)

Um médico cearense apresentou denúncia contra o presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), José Iran da Silva Gallo, por pesquisa da entidade sobre a opinião dos médicos acerca da vacina contra a Covid-19 em crianças. O infectologista Roberto da Justa, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), aponta "erros de natureza ética e quebra de sigilo de dados, além de risco à saúde pública".

No site da entidade, a pesquisa é apresentada com o objetivo de "conhecer a percepção dos médicos brasileiros sobre a obrigatoriedade da vacinação contra Covid-19 em crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses". Questionário também foi enviado para os profissionais membros do CFM por e-mail.

Denúncia foi feita junto ao Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF), onde o presidente do CFM tem registro. 

Roberto da Justa argumenta que não há menção a aprovação de protocolo em Comitê de Ética em Pesquisa nem solicitação de preenchimento de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Segundo ele, também não há "esclarecimento detalhado sobre a natureza da pesquisa, justificativa, metodologia, plano amostral, critérios de inclusão ou exclusão".

Conforme o médico infectologista, qualquer pessoa pode responder à "pesquisa" utilizando somente o número de CRM e do CPF de um médico. 

"Eu realizei o preenchimento até o final e constatei que o código de validação é gerado na própria plataforma, quando deveria ser enviado por e-mail", relata. 

"Denunciei o presidente do CFM, responsável legal pela "pesquisa", por infração a um princípio fundamental e a dois artigos do Código de Ética Médica (CEM)". 

Ele cita o Princípio Fundamental XXIV do CEM: "Sempre que participar de pesquisas envolvendo seres humanos ou qualquer animal, o médico respeitará as normas éticas nacionais, bem como protegerá a vulnerabilidade dos sujeitos da pesquisa".

O Art. 100 diz que "é vedado ao médico deixar de obter aprovação de protocolo para a realização de pesquisa em seres humanos, de acordo com a legislação vigente".

Já o Art. 103 veda "ao médico realizar pesquisa em uma comunidade sem antes informá-la e esclarecê-la sobre a natureza da investigação e deixar de atender ao objetivo de proteção à saúde pública, respeitadas as características locais e a legislação pertinente".

"Além da denúncia, solicitei ao Conselho Regional (do Distrito Federal) que envide esforços para que a pesquisa seja interrompida. Que a denúncia seja encaminhada ao Ministério Público Federal. Também pedi para acionarem a Anvisa, pois se trata de um assunto relacionado à saúde pública. Esses órgãos também precisam ser mobilizados", afirma o médico cearense. 

Resposta do Conselho Federal de Medicina 

Em nota, o Conselho Federal de Medicina afirma quem "em nenhum momento, o CFM contesta a eficácia ou a decisão do Ministério da Saúde de disponibilizar a vacina contra a Covid-19 para a população infantil".

"A pesquisa visa unicamente conhecer a percepção do médico brasileiro sobre a obrigação imposta aos pais", explica.

De acordo com a autarquia médica, "a decisão decorre de inúmeros pleitos encaminhados à autarquia buscando conhecer o posicionamento do CFM sobre esse tema". Isso porque "a vacina disponibilizada pelo fabricante condiciona sua venda à prescrição médica".

"Sempre existe lá a observação de se procurar um médico. Está presente nas bulas de todos os medicamentos", refuta Roberto da Justa. 

"Não é baseado em conteúdo de bula que se definem políticas públicas, não é baseado em enquete. São determinadas baseadas em evidências científicas. Isso desvia o foco das atenções, que é aumentar a cobertura vacinal das crianças", salienta o profissional cearense.

"O CFM ressalta à população e aos médicos que empenha total apoio às ações empreendidas para ampliar a cobertura de vacinas que ajudam na prevenção e combate doenças, como poliomielite, sarampo, meningite, rubeola e tuberculose, disponibilizadas dentro do Programa Nacional de Imunizações (PNI), considerado o maior do mundo em sua modalidade", afirma o órgão.

O CFM explica ainda que "os dados registrados permitem a geração de um único código de validação. Ressalte-se que apenas o primeiro envio de respostas será computado como voto".

"As informações oferecidas serão tratadas sob os critérios de sigilo e anonimato, nos termos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), e os resultados da pesquisa subsidiarão o CFM no desenvolvimento de ações relacionadas ao tema", informa.

Em nota, o CRM-DF afirmou "que todas as denúncias feitas à autarquia são investigadas por meio de sindicâncias, no entanto, o procedimento ocorre em sigilo processual".

Leia nota na íntegra

NOTA AOS BRASILEIROS

CFM esclarece pontos do levantamento sobre a percepção do médico acerca da obrigatoriedade da vacina de covid-19 em crianças

Com respeito à realização de pesquisa junto aos mais de 560 mil médicos brasileiros para conhecer a percepção dos profissionais acerca da obrigatoriedade de aplicação da vacina contra covid-19 em crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses, o Conselho Federal de Medicina (CFM) esclarece os seguintes pontos:

1) Em nenhum momento, o CFM contesta a eficácia ou a decisão do Ministério da Saúde de disponibilizar a vacina contra a covid-19 para a população infantil;

2) A pesquisa visa unicamente conhecer a percepção do médico brasileiro sobre a obrigação imposta aos pais para que as crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses sejam vacinadas, independentemente de prescrição médica da vacina contra COVID-19;

3) A decisão decorre de inúmeros pleitos encaminhados à autarquia buscando conhecer o posicionamento do CFM sobre esse tema, pois a bula da vacina disponibilizada pelo fabricante condiciona sua venda à prescrição médica;

4) Assim, o CFM decidiu ampliar o debate, dando direito a cada médico brasileiro de se manifestar, conhecendo a visão da maioria da classe;

5) Os médicos têm opiniões com base em conhecimento técnico-científico, são profissionais, pesquisadores e estudiosos em diversas áreas da ciência médica e por isso mesmo, são capacitados a se manifestarem sobre a obrigatoriedade da vacina contra COVID-19 em crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses;

6) Abordagens semelhantes foram usadas pelo CFM em outros temas, como telemedicina e publicidade médica, entre outros, oferecendo subsídios à autarquia e aos tomadores de decisão;

7) Além desse instrumento, o CFM informa que solicitou posicionamentos técnicos às suas Câmaras Técnicas de Pediatria, de Infectologia e de Bioética sobre a obrigatoriedade;

8) O CFM respeita o direito de outras entidades médicas se posicionarem sobre a realização da pesquisa, entendendo que essas manifestações enriquecem o debate ético e científico, desde que não atendam a interesses pessoais, políticos, ideológicos ou financeiros.

Finalmente, o CFM ressalta à população e aos médicos que empenha total apoio às ações empreendidas para ampliar a cobertura de vacinas que ajudam na prevenção e combate a doenças, como poliomielite, sarampo, meningite, rubéola e tuberculose, disponibilizadas dentro do Programa Nacional de Imunizações (PNI), considerado o maior do mundo em sua modalidade.

Brasília, 12 de janeiro de 2024.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA