Campanha Março Amarelo levanta discussão sobre endometriose
Saiba mais sobre a doença que atinge muitas mulheres mas que ainda é tratada como um tabu pela ligação com fertilidade e saúde reprodutiva
10:24 | Mar. 02, 2023
O mês de março carrega consigo a campanha de conscientização da endometriose (Março Amarelo), que mesmo sendo uma doença que atinge muitas mulheres, ainda é motivo de desinformação entre a população feminina. Tratada como tabu pela ligação com fertilidade e saúde reprodutiva, é necessário acender um alerta sobre a doença.
A professora doutora Simony Lira, do Departamento de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), explica que a endometriose é uma doença ginecológica e inflamatória com a presença de tecido semelhante ao endométrio (camada mais interna do útero) fora da cavidade uterina, podendo ser identificada em órgão e estruturas da pelve.
Estima-se que de 10% a 15% das mulheres em fase reprodutiva são afetadas pela doença, sendo uma em cada dez mulheres entre 15 e 45 anos. Porém, a professora explica ainda que a prevalência pode ser maior devido ao subdiagnóstico da doença.
Endometriose: quais são os sintomas?
A endometriose pode ser uma doença silenciosa, mas também pode apresentar os sintomas conhecidos como 6 D’s, que são:
- Dor pélvica crônica, que pode durar mais de seis meses, podendo ser cíclica quando associada ao período menstrual, ou não cíclica;
- Dismenorreia, que são cólicas menstruais intensas com necessidade de medicação, idas frequentes ao pronto-socorro;
- Dispareunia, que é sentir dor durante ou depois da relação sexual, podendo ser superficial ou profunda;
- Disúria, que se caracteriza por dor ou ardor ao urinar;
- Disquezia, que é sentir dor ao evacuar;
- Dificuldade para engravidar (infertilidade);
Simony ressalta que alguns sintomas podem estar associados com dor nas costas, fadiga, distúrbios do sono e sintomas psicológicos, como ansiedade e depressão, e diz que infelizmente não há exames de rotina para o rastreamento da endometriose.
“A investigação para o diagnóstico se inicia a partir dos sintomas/queixas apresentados pelas mulheres. Geralmente as mulheres assintomáticas irão investigar após tentativas frustradas de engravidar”, pontua.
Sentir dor não é normal
O aparecimento de fortes dores são os principais motivos para que seja buscada ajuda médica, e, muitas vezes, os sinais se manifestam nas primeiras menstruações ou na iniciação sexual. A professora ressalta que não é normal sentir dor e que é preciso parar de normalizar as dores das mulheres.
“Geralmente a infertilidade vai aparecer mais tardiamente. Por isso, é importante ressaltar para as adolescentes e mulheres jovens que não aceitem a naturalização das suas queixas, a não investigação dos seus sintomas. Por isso a campanha do “Março Amarelo” é tão importante para conscientização sobre essa doença e seus sintomas”, explica.
Ressalta ainda que nem todas as mulheres acometidas com endometriose são inférteis e que isso depende de onde estejam os focos. “A endometriose é a causa de 20% a 50% da infertilidade. O tratamento médico (hormonal e/ou cirúrgico), fisioterapia e nutricional também podem ajudar as mulheres no tratamento da infertilidade.”
Endometriose ainda não tem cura, mas existe tratamento
A endometriose, infelizmente, não tem cura, mas é possível tratar a doença para que a mulher possa ter uma melhor qualidade de vida. A professora Simony Lira diz que o tratamento começa com o diagnóstico correto da doença.
“Dados da literatura mostram que as mulheres demoram cerca de quatro a dez anos entre o início dos sintomas e o diagnóstico e tratamento da doença, dependendo da região do Brasil. Infelizmente não há na literatura formas de prevenir a endometriose. Por isso o diagnóstico precoce é tão importante para evitar a progressão da doença e seus sintomas”, relata.
O tratamento precisa ser iniciado precocemente, mesmo com a investigação em andamento, pelo fato de a endometriose ser uma doença sistêmica, ou seja, que afeta vários sistemas do corpo.
Simony explica que o tratamento padrão ouro é o multiprofissional. “Do ponto de vista do tratamento clínico, a endometriose é uma doença estrogênio dependente. Logo, o bloqueio hormonal ainda é o principal tratamento clínico para evitar progressão dos focos endometriais”, complementa.
O tratamento da endometriose pode ser feito da seguinte forma:
- Por medicamentos a base de progestágenos, sendo eles a primeira linha de tratamento;
- Em alguns casos a mulher necessita passar por um procedimento cirúrgico de menor ou maior complexidade para retirar os focos de endometriose;
- Em casos de infertilidade, dor clinicamente intratável e/ou aqueles com comprometimento significativo do intestino ou trato urinário com risco de comprometimento funcional, o recomendado é o tratamento por laparoscopia.
Entre os tratamentos, a assistência fisioterapêutica especializada tem o objetivo de tratar os efeitos das dores crônicas no sistemas musculoesquelético, disfunções urinárias intestinais e sexuais.
“As disfunções no sistema musculoesquelético podem causar, piorar ou perpetuar os sintomas dolorosos. As mulheres com dor pélvica crônica adotam posturas antálgicas prolongadas visando alívio da dor, o que gera ainda sobrecarga de quadril, ligamentos e articulações pélvicas”, explica a fisioterapeuta Simony Lira.
Em 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu a endometriose como problema de saúde pública, o que foi um grande passo para a saúde de muitas mulheres no mundo.
“Os custos do tratamento da endometriose podem ser comparados a diabetes. Por isso é imprescindível melhorar o acesso aos diagnósticos, diminuindo o tempo, possibilitar mais acesso ao tratamento pelos sistemas públicos de saúde, diminuir custos com cirurgias complexas e suas consequências. Além de preservar a produtividade e a qualidade de vida de mulheres no período fértil e reprodutivo”, ressalta Simony.
A Maternidade Escola Assis Chateaubriand, da Universidade Federal do Ceará (UFC), possui ambulatórios especializados em dor pélvica crônica e endometriose, incluindo assistência multiprofissional.
As pacientes são encaminhadas por meio das Unidades Básicas de Saúde, passam por avaliação médica e da enfermagem são encaminhadas de acordo com a necessidade delas.