Dois estudos publicados na "Nature" identificam mutações genéticas e dezenas de genes que podem aumentar o risco de desenvolver a doença. Cientistas esperam que descobertas possibilitem avanços no tratamento.Duas equipes internacionais de pesquisadores afirmam ter descoberto mutações genéticas que influenciam fortemente a probabilidade de uma pessoa ter esquizofrenia e dezenas de genes que poderiam desempenhar um papel no desenvolvimento da doença. As descobertas foram divulgadas em dois artigos publicados na revista Nature. Um deles, considerado o maior estudo genético sobre esquizofrenia já realizado, foi conduzido pelo Consórcio de Genômica Psiquiátrica (PGC, na sigla em inglês), liderado por cientistas da Universidade de Cardiff, no Reino Unido. Eles adotaram uma abordagem muito ampla, investigando todo o genoma, ou seja, todo o material genético do organismo, para procurar variações genéticas específicas que aumentem o risco de uma pessoa desenvolver esquizofrenia. Analisando o DNA de cerca de 77 mil pessoas com esquizofrenia e cerca de 244 mil sem o distúrbio, eles descobriram quase 300 partes do genoma que poderiam ser ligadas ao risco de ter esquizofrenia. Dentro dessas regiões, eles descobriram 120 genes que poderiam influenciar o desenvolvimento da doença. O outro estudo foi conduzido pelo consorcio internacional Schema (Schizophrenia Exome Meta-Analysis), liderado por pesquisadores do Instituto Broad, do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) e da Universidade de Harvard (EUA). Os pesquisadores descobriram dez genes com mutações raras que parecem aumentar o risco de desenvolver esquizofrenia, e outros 22 genes que poderiam desempenhar um papel nesse processo. "Todos nós temos 1% de chance de desenvolver esquizofrenia", disse Benjamin Neale, coautor do Schema e membro do Consórcio de Genômica Psiquiátrica, em um comunicado à imprensa. "Mas, se você tiver uma dessas mutações, a chance passa a ser de 10%, 20%, até 50%." As mutações genéticas ajudam a traçar um mapa das origens da esquizofrenia no cérebro. Desenvolvimento de novos remédios A esquizofrenia é uma condição mental caracterizada por alucinações, períodos de psicose e um distanciamento da realidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a doença afete uma em cada 300 pessoas em todo o mundo. Só que até agora não se sabe realmente o que acontece no cérebro para desencadeá-la. Os cientistas afirmam que as novas descobertas não devem ter impacto imediato na vida de pacientes com esquizofrenia, mas podem ajudar a melhorar o tratamento com medicamentos num futuro próximo. Já existem medicamentos para a esquizofrenia, mas eles não atacam a raiz do distúrbio. As drogas em uso apenas atenuam os efeitos ou sintomas, sem tratar ou curar a doença em si. A medicação mais comum para esquizofrenia é a clorpromazina, originalmente desenvolvida como anestésico, mas depois os médicos descobriram que ela ajuda a prevenir alucinações em pacientes psiquiátricos. "Foi um achado acidental. Não veio da pesquisa psiquiátrica", diz Stephan Ripke, pesquisador do hospital universitário Charité, de Berlim, e coautor de um dos dois artigos publicados na Nature. Ripke e os demais cientistas acreditam que, além de ajudar a determinar o risco de uma pessoa ter esquizofrenia, as novas descobertas podem contribuir para o desenvolvimento de medicamentos para atacar especificamente a raiz da doença. Por que é difícil estudar a esquizofrenia A esquizofrenia geralmente começa a se manifestar em pacientes no final da adolescência, por volta dos 20 anos de idade. Pesquisadores já conseguiram estudar o aspecto ambiental da doença: eles descobriram, por exemplo, que o ambiente onde uma pessoa cresce, o uso de maconha na adolescência e a alimentação da mãe durante a gravidez podem aumentar a chance de desenvolver o distúrbio. Embora cientistas saibam que a esquizofrenia é de 60% a 80% hereditária, eles tinham pouco conhecimento sobre a genética da doença até agora. Isso se deve em parte ao fato de a esquizofrenia não poder ser diagnosticada por meio de um exame de sangue ou cerebral. Ripke aponta que o que se faz é conversar com os pacientes. "Basicamente, precisamos saber se as pessoas têm alucinações, se elas ouvem vozes", diz. Isso significa que a pesquisa sobre esquizofrenia tem que ser feita em humanos. Preocupações éticas impedem cientistas de simplesmente coletar as amostras de que precisam para facilitar análises genéticas, mas isso é possível quando pacientes se voluntariam, diz Ripke. "Nosso estudo nunca teria funcionado sem a confiança de milhares e milhares de pacientes que nos deram suas informações genéticas", diz o especialista. "Estamos muito gratos a todas as pessoas que nos confiaram seus dados." Autor: Clare Roth