Por um lado, lucros bilionários com a venda de vacinas; por outro, milhões de pessoas sem acesso à imunização contra covid-19. As farmacêuticas estão ficando mais ricas com a pandemia? DW checou os fatos.Alegação: A indústria farmacêutica está obtendo lucros recordes Numerosas alegações estão circulando nas redes sociais sob a hashtag #Pfizergate de que a pandemia de covid-19 se tornou uma mina de ouro para a indústria farmacêutica. O chefe da Associação Mundial de Médicos, Frank-Ulrich Montgomery, criticou recentemente os "lucros indecentes dos fabricantes de vacinas", em entrevista à emissora alemã SWR. Verificação pela DW: impreciso É certo que as vendas da BioNTech e da Pfizer aumentaram acentuadamente. O faturamento da alemã BioNTech, com sede em Mainz, saltou de menos de 500 milhões de euros em 2020 para mais de 17 bilhões de euros em 2021. O valor da ação da empresa de biotecnologia subiu de 11 euros, em outubro de 2019, para 153 euros (dado de 4 de fevereiro de 2022). De acordo com os balanços da própria empresa, a americana Pfizer aumentou suas vendas nos três primeiros trimestres de 2021 em 91% em comparação com o mesmo período do ano anterior. A previsão de vendas para todo o ano de 2021 é de 82 bilhões de dólares , dos quais 36 bilhões de dólares são contabilizados apenas pela vacina Comirnaty, contra covid-19, desenvolvida em conjunto com a BioNTech. Até agora, os carros-chefes da Pfizer eram medicamentos contra câncer de mama, epilepsia e coágulos de sangue, entre outros. À sombra da BioNTech e da Pfizer, o grupo suíço Roche, fabricante de testes para detectar a covid, também lucrou particularmente com a pandemia. O faturamento da segunda maior empresa farmacêutica do mundo aumentou 9%, para cerca de 59 bilhões de euros em 2021. Desse faturamento, 28% veio do segmento de diagnósticos, que inclui testes de covid-19. No entanto, também é verdade que a indústria farmacêutica já vem se expandindo continuamente há 20 anos. Segundo o portal alemão Statista, as vendas mundiais de medicamentos aumentaram de 390 bilhões de dólares americanos para 1,27 trilhão de dólares americanos no período de 2001 a 2020. A maior empresa farmacêutica do mundo, Johnson&Johnson, que também desenvolveu uma vacina contra o novo coronavírus, e a AbbVie, que está em quinto lugar, mostram que os medicamentos para câncer, doenças imunológicas e diabetes continuam dando mais lucro que a pandemia de covid-19. A empresa de consultoria Ernst&Young considera, portanto, um fenômeno temporário o aumento das vendas de empresas farmacêuticas individuais devido à pandemia. "Em 2021, as vendas das cinco vacinas mais importantes atingiram 57 bilhões de dólares, a projeção para 2026 é de 15 bilhões de dólares", explicou o analista Alexander Nuyken em entrevista à DW. Em comparação, o faturamento dos cinco medicamentos mais importantes contra o câncer alcançou pouco menos de 40 bilhões de dólares em 2021, de acordo com a Ernst&Young. Para 2026, as previsões da empresa de consultoria são de 68 bilhões de dólares. Alegação: A compra pública de vacinas traz grandes lucros aos fabricantes Máscaras, doses de vacinas, testes rápidos: diante das encomendas em massa de empresas farmacêuticas, os críticos acusam os governos dos países industrializados de proporcionarem lucros exorbitantes à indústria, usando dinheiro público. "É um modelo de negócios louco", reclama no Twitter Aaron Siri, da firma de advocacia nova-iorquina Siri & Glimstad. "O governo americano dá a Pfizer e Moderna bilhões, concede a elas imunidade por danos ou se não funcionam, e apregoa de graça os seus produtos." Verificação pela DW: correto O fato é que a pandemia está custando muito dinheiro ao contribuinte. Houve e continua havendo encomendas em massa a empresas farmacêuticas, especialmente aos fabricantes de vacinas. Só na Alemanha, por exemplo, 554 milhões de doses de vacinas no valor de 4 bilhões de euros foram encomendadas pelo governo federal até 16 de dezembro de 2021. Segundo o Departamento Federal de Seguro Social (BAS, na sigla em alemão), 7,58 bilhões de euros foram gastos em testes de covid-19, e 17 bilhões de euros em hospitais (dados de 17 de janeiro de 2022). Além disso, a Alemanha investiu cerca de 1,5 bilhão de dólares no desenvolvimento de vacinas contra a pandemia, o que beneficiou principalmente empresas privadas, segundo um estudo do Centro de Saúde Global do Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais, em Genebra. A título de comparação, do outro lado dos aproximadamente 30 bilhões de euros em fundos públicos para a aquisição de vacinas, diagnósticos e pesquisa, estão cerca de 170 bilhões de euros em subsídios federais, com que, segundo o Relatório Econômico Anual 2022, o governo alemão tem apoiado empresas, autônomos e assalariados desde o início da pandemia. O BAS acrescenta que, até 1º de fevereiro de 2022, os hospitais também receberam 17 bilhões de euros para aquisição de leitos de tratamento intensivo e compensar prejuízos financeiros. Alegação: Empresas farmacêuticas se recusam a liberar patentes Sob o hashtag #VaccineApartheid, o acesso desigual às vacinas contra covid é um tema recorrente nas mídias sociais. A organização não governamental britânica Global Justice Now calcula que os lucros com as vendas da vacina Comirnaty da Pfizer em 2021 foram mais de sete vezes superiores ao que todos os governos dos países de baixa renda gastam no setor da saúde. Junto com a OMS, muitas organizações de ajuda estão, portanto, exigindo aliberação de patentes para as vacinas anticoronavírus. Verificação pela DW: impreciso Até agora, essa exigência só foi implementada por algumas poucas empresas. A Pfizer e a BioNTech não estão entre elas e se limitam a doar doses de vacina. A empresa sueco-britânica AstraZeneca, por outro lado, vende sua vacina Vaxzevria a preço de custo e também acordou o licenciamento voluntário e a transferência gratuita de tecnologia com muitos países em desenvolvimento. A americana Moderna não liberou a patente de sua vacina Spikevax, mas se absteve de cobrar taxas por ela durante a pandemia. A sequência de sua vacina mRNA, por exemplo, é a base do candidato a vacina do centro sul-africano de pesquisa e fabricação Afrigen Biologics, na Cidade do Cabo. Para os novos medicamentos contra covid-19 Molnupiravir e Paxlovid, por outro lado, os fabricantes Merck e Pfizer não cobram taxas de licença em alguns países. Existe um acordo nesse sentido com o Grupo de Patentes de Medicamentos das Nações Unidas, que negocia acordos de licenciamento e transferência gratuita de tecnologia com empresas farmacêuticas. Autor: Astrid Prange