Método Therasuit tem eficácia no tratamento de distúrbios motores para crianças e adultos
Tratamento fisioterápico intensivo utiliza sistema de polias e cordas para auxiliar pacientes na melhora da coordenação motora e, apesar dos altos custos, pode ser coberto por planos de saúde via liminar judicialCriado em 2002, em Michigan, nos Estados Unidos, pelo casal Izabela e Richard Koscielny, pais de uma criança com paralisia cerebral, o método Therasuit se disseminou pelo mundo em cerca de duas décadas de existência. Atualmente, além de ter auxiliado no tratamento da filha do casal, Kaya, tem sido esperança para milhares de outras crianças e adultos com distúrbios neurológicos e motores. Com o tratamento, a evolução no decorrer do tempo é evidente. Pacientes que sequer conseguiam levantar da cama ficam de pé e conseguem executar ações cotidianas, como segurar objetos. A melhoria na qualidade de vida é indiscutível.
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"O José Otávio, que já tinha um cognitivo bom, melhorou consideravelmente. Ele passou a levar a colher para a boca, ele não come só, mas já consegue fazer o movimento. Consegue pegar um lápis, já consegue usar um tablet. Começou a ficar sentado. Já tem uma certa postura para ficar em pé. O tratamento não faz milagre, não é da noite para o dia. Mas o que eu posso afirmar é que depois do Therasuit houve uma mudança radical no desenvolvimento motor e no amadurecimento da criança", detalha Rejane Campos, 48, mãe de José Otávio.
O garoto de 8 anos tem paralisia cerebral, distúrbio congênito que atinge membros inferiores e superiores, ocasionado pelo nascimento prematuro, segundo a mãe. Ainda no sexto mês de gestação, José Otávio veio ao mundo. No terceiro mês de vida, foram diagnosticados os primeiros sinais de paralisia. A mobilidade reduzida sempre foi um desafio para o menino e a família, sobretudo, os altos custos de equipamentos e tratamentos médicos. Entretanto, a resiliência e o enfrentamento também sempre estiveram presente nesta trajetória. Em 2019, José Otávio foi auxiliado por campanha de financiamento coletivo para substituir a cadeira feita com canos de PVC por um andador pacer, estimado em R$ 16 mil.
A busca por um método de fisioterapia alternativo ocorreu há pouco mais de dois anos, quando José Otávio passou a sentir dores extenuantes devido a uma subluxação no quadril, processo de deslocamento de osso do fêmur em direção à bacia. De acordo com Rejane, a situação poderia se tornar crítica, a ponto do garoto precisar fazer uma cirurgia de risco e, segundo a mãe, “extremamente invasiva” para corrigir o problema.
"Eu fiquei apavorada. Foi quando eu fui atrás do tratamento, que através dos estímulos e do desenvolvimento muscular empurra o osso para o lugar correto. Então, agora, saiu o diagnóstico que o José Otávio não precisa mais da cirurgia. Ele melhorou tanto que, graças a Deus, o osso voltou pro canto", conta Rejane. O resultado veio depois de tratamento intenso, que inclui quatro módulos por ano e sessões de 1h30min de fisioterapia nos intervalos entre módulos. Apesar do objetivo cumprido, o tratamento Therasuit é contínuo. Agora, a meta de José Otávio é outra, e tão nobre quanto a última: começar a andar.
"O José é uma criança que tem um potencial maravilhoso, ele tem crescido muito com a gente. Quando ele chegou, tinha quarenta graus de luxação de quadril e com todo esse trabalho, em dois anos, conseguimos tirar ele da necessidade de fazer uma cirurgia óssea para corrigir isso. Hoje ele está com um alinhamento muito legal, melhorou muito e já consegue ficar em pé, bem posturado", afirma Raquel de Lima Souza Albuquerque, fisioterapeuta de José Otávio.
Carinhosamente chamada de “tia Quel” durante as consultas, ela e o terapeuta ocupacional André Souza de Pontes, introduzem técnicas da Medicina chinesa, como Acupuntura, Moxabustão, Ventosaterapia e Shiatsu juntamente ao Therasuit. A relação de José com os fisioterapeutas são um dos trunfos do processo. Rejane descreve que a Clínica Fithos, em Fortaleza, passou a ser um “Castelo Encantado” para o filho, que ama tanto as consultas que chora nos dias sem sessão.
Como funciona o Therasuit
O Therasuit é utilizado para todo e qualquer tipo de distúrbio motor, em crianças e adultos, conforme a fisioterapeuta Meire Marcy, proprietária da clínica Studio Infantil de Fisioterapia, também na Capital, especializada neste método. O tratamento é realizado a partir de módulos, que são feitos de três a quatro vezes por ano. Em cada módulo, o paciente é acompanhado diariamente, por quatro semanas, durante 20 dias, com média de três horas por sessão.
A execução consiste no uso de equipamentos específicos, patenteados pelos criadores do Therasuit: a Unidade de Exercício Universal (UEU), uma espécie de gaiola que inclui um sistema de cordas elásticas com pesos; o Spider, conjunto dinâmico de elásticos que reduzem a ação gravitacional; e o Suit, órtese dinâmica que funciona de modo semelhante a um exoesqueleto.
As ferramentas contribuem para que o profissional de Fisioterapia segmente e isole os grupos musculares do paciente durante o exercício, a fim de facilitar movimentações e estabelecer padrão postural mais próximo do regular, além de melhorar a coordenação das extremidades. As sessões promovem aquecimento, alongamento e fortalecimento dos músculos; inibição de movimentos e reflexos patológicos; e estímulo da movimentação voluntária.
Meire reforça a importância da disciplina para o tratamento alcançar os resultados esperados e compara a rotina dos pacientes ao dia a dia de “um atleta se preparando para uma competição". Apesar da paralisia cerebral não ter cura, o tratamento contínuo por Therasuit assegura uma melhora de qualidade de vida, assim, possibilitando que pacientes possam exercer atividades cotidianas com maior precisão.
"Nós tivemos um paciente que chegou aqui com 9 anos. Ele tinha mielomeningocele (deformidade congênita na medula espinhal de um bebê, devido ao mal desenvolvimento dentro do útero). Ele nunca tinha ficado em pé. Quando ele veio, eu disse 'Eu vou te botar em pé' e ele perguntou como e balançou a cabeça dizendo que não acreditava. Quando colocamos ele em pé, ele ficou se segurando nas cordas. Eu disse: 'Pode soltar a mão'. Ele levantou as mãos para cima, os dois braços, e falou: "Uhu! Nunca pensei que iria conseguir". Foi uma das maiores alegrias da minha vida”, conta Meire, emocionada.
Benefícios
- Reeducação e restaurações de funções do sistema nervoso
- Melhora da amplitude de movimentos
- Fortalecimento e maior resistência dos músculos
- Melhora na alimentação dos pacientes
- Melhora de funções do sistema circulatório
- Influência positiva no campo cognitivo
- Aumento do equilíbrio e da coordenação motora
- Melhora da densidade óssea
Indicações e contraindicações
O tratamento é indicado para pacientes a partir de dois anos e meio de idade, com paralisia cerebral, síndrome de Down, acidente vascular encefálico, traumatismo crânioencefálico, lesões medulares, síndromes genéticas, atrasos de desenvolvimento e outros comprometimentos relacionados ao prejuízo do desenvolvimento motor.
O Therasuit não é indicado a pacientes com convulsões frequentes; diabéticos; pacientes com pressão arterial elevada; problemas cardíacos; osteoporose; escolioses superiores a 45º (sujeito à liberação de ortopedista); e distrofia muscular progressiva.
Custo do tratamento e como ter acesso
A clínica de Meire Marcy recebe uma média de 13 a 15 pacientes por mês, de diversos estados do Brasil. Entretanto, a fisioterapeuta relata que ainda há resistência em novas adesões por conta dos altos valores do tratamento, acima de tudo, por não ser coberto por nenhum plano de saúde, nem pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Therasuit custa um valor estimado de R$ 13 mil a R$ 18 mil por módulo, ou seja, por mês, em clínicas especializadas no Brasil. O material patenteado dos Estados Unidos e as poucas clínicas habilitadas encarecem as sessões.
Todavia, a defensora pública e supervisora do Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa), Karinne Matos, esclarece que o acesso ao tratamento pode ser obtido por meio de liminar judicial, obrigando o plano de saúde a cobrir todos os custos. Karinne estima um intervalo de até uma semana para a obtenção da liminar, por meio da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE), de modo a conceder o início imediato da cobertura do plano de saúde, ainda no processo de entrada na ação judicial.
“Em 2016, a Defensoria havia feito um Termo de Cooperação, relacionado aos tratamentos Therasuit e Bobath, para pacientes com deficiências neurológicas. Em 2018, teve início uma Ação Civil-Pública, que abrangeu um público maior, fator que diminuiu os pedidos de entrada de novas ações no ano seguinte. A partir de 2020, apesar do baixo número, ocorreram reclamações de clientes devido à Unimed não cumprir mais o acordo. A expectativa é de que, até o fim do ano, o Núcleo atenda casos reprimidos pela alteração no fluxo das atividades, devido ao coronavírus”, explica a defensora.
Em nota à reportagem, a Unimed se posicionou sobre o caso: “A Unimed Fortaleza esclarece que cumpre todas as normativas legais e regulatórias, ofertando aos clientes todos os serviços e procedimentos em saúde previstos no Rol da Agência Nacional de Saúde - ANS. A Resolução Normativa nº 428/2017 da ANS define, no seu anexo I, o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde que devem ser ofertados pelas operadoras de planos de saúde. O referido normativo está em vigor desde 02/01/2018 e se aplica aos planos privados de assistência à saúde comercializados a partir de 02/01/1999 e aos planos antigos adaptados (planos adquiridos antes de 02/01/1999, mas que foram ajustados aos regimentos legais. Dessa forma, os procedimentos de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, aplicados pelo método “TheraSuit”, não estão inclusos no rol de procedimentos da ANS, pois utilizam órteses elásticas externas não relacionadas aos métodos cirúrgicos e, por isso são excluídos das coberturas obrigatórias pelas normas vigentes. Entretanto, para estes casos, a Unimed Fortaleza oferece aos seus clientes, além dos métodos convencionais, os métodos Bobath, ABA e Integração Sensorial, conforme indicação médica.”
De acordo com Karinne Matos, a resolução da ANS é exemplificativa, e não justifica as recusas emitidas pela Unimed, pelo fato de que os serviços e procedimentos em saúde previstos pela ANS em Resolução Normativa são “o mínimo que o plano deve ofertar”. A defensora explica o passo a passo para obter autorização do plano de saúde, via liminar.
1. Responsável clínico emite laudo médico recomendando o tratamento.
2. Caso o plano de saúde negue, entrar com processo junto à Defensoria Pública (DP) ou com advogado particular.
3. Análise de hipossuficiência e vulnerabilidade do solicitante por parte da DP.
4. DP faz pedido de liminar.
5. Plano de saúde se manifesta na Justiça.