Como denunciar casos de violência sexual contra crianças e adolescentes

Caso de menina de dez anos estuprada pelo tio transpareceu lacunas dos direitos de crianças e adolescentes, apesar de garantidos por lei. Denúncia deve ser totalmente sigilosa e com o intuito mínimo de reviver a situação para a vítima

Diante da repercussão do caso da menina de dez anos que foi estuprada pelo tio e teve seus dados divulgados ilegalmente, dúvidas sobre os direitos desse público entram em um debate já desgastado pela fragmentação dos canais de denúncia e falhas na revindicação desses direitos garantidos. De acordo com os últimos dados do Ministério da Saúde em 2017, através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sisan), a violência sexual entre crianças e adolescentes foi a terceira mais notificada entre pessoas com 10 a 19 anos. O público de 0 a 19 anos é tido como o mais vulnerável às violências, concentrando 41% do total de casos registrados pelo órgão.

Mas o que seria a violência sexual contra esse público? A Lei Nº 13.431 define o ato como "qualquer conduta que constranja a criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso - inclusive a exposição do corpo em foto ou vídeo por meio eletrônico ou não". No Artigo 4, há a divisão entre:

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- abuso sexual - entendido como toda ação em que se utiliza da criança para fins sexuais ou para estimulação sexual do agente ou do terceiro;
- exploração sexual comercial - o uso da criança ou do adolescente em atividade sexual em troca de remuneração ou qualquer outra forma de compensação;
- e o tráfico de pessoas, entendido como o tráfego da criança ou do adolescente com o fim de exploração sexual.

Essas violências são incidentes entre pessoas conhecidas da vítima, como parentes e vizinhos, além das situações de abuso de poder que também podem ser vistas entre professores, por exemplo. Esses públicos estão em posição privilegiada e tem o intuito de proteger a criança - o que não acontece nesses casos, conforme explica Lídia Rodrigues, da Comissão de Enfrentamento a Violência Sexual do Fórum DCA.

Algumas portas de entrada podem ajudar a identificar as situações, como hospitais, escolas e a comunidade em geral de convívio da criança. Entretanto, fatores como a pandemia no caso de escolas, que continuam com atividades presenciais suspensas, e as relações de poder do autor do crime entre a vítima corroboram para o silenciamento dos casos. "Essa situação do convívio e da relação de parentesco, familiaridade e afeto é uma das dificuldades da denúncia. Tanto que quando acontece no âmbito intrafamiliar, as famílias tendem a proteger o autor, fazendo acordos domésticos para lidar com a situação", destaca.

Os levantamentos do Sinan mostram que há uma prevalência absoluta de meninas vitimadas  - representando o percentual de 85,3% das notificações de violência contra pessoas de 0 a 19 anos acumuladas pela pasta entre 2013 e 2017. Apesar do grande percentual feminino, meninos também sofrem a violência e abarcacam cerca dos 14% restante. O perfil do agressor, por sua vez, é masculino.

A cultura machista presente na sociedade impede que as vítimas consigam superar e denunciar devido a um sentimento de culpa e por uma questão de afetar particularmente a dignidade dela, expõe a coordenadora dos atendimentos no Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Marina Araújo.

"Socialmente o modo em que se cria a masculinidade desses adolescentes influenciam o modo de se relacionar. Então quando criamos crianças que se transformam em adultos homens agressivos, essa questão de gênero foi culturalmente permeada para ser permitida. Ao mesmo tempo em que a questão de gênero atinge as meninas, para os homens eles se sentem encorajados a violentar", explica.

Como a denúncia deve ser feita?

O Cedeca inaugurou um rápido guia para orientar crianças, adolescentes e responsáveis sobre o crime de violência sexual. A cartilha está disponível no site e deve ser lançada hoje, 25, nas redes sociais do Centro. Caso aconteça desconfiança de violência sexual contra uma criança ou um adolescente de seu convívio, a porta principal de entrada deve ser o Conselho Tutelar. O órgão é responsável pela atuação de medidas de proteção para a própria vítima, prioridade na situação, e de responsabilização do autor.

Como a vítima precisa passar por algumas categorias de atendimento, há uma rede de suporte disponível, dentre elas a de segurança pública: a policial. Lídia explica que esse é o que a sociedade mais conhece, mas destaca sobre o atendimento é limitado devido à demora de instauração de inquéritos - que precisam de provas. "Muitas vezes quando as denúncias chegam aos órgãos responsáveis, se tratam de denúncias crônicas, violências que estão acontecendo a algum tempo. Então quando a criança ou o adolescente vai fazer o exame de delito, o laudo vai ser inconclusivo", informa.

Desse modo, a denúncia na delegacia deve ser apenas o segundo passo. Preferencialmente a vítima deve ir acompanhada com alguém maior de 18 anos e de sua confiança. Lá é registrada a notícia crime que inicia a investigação. Na ausência de alguém de maioridade, o Ministério Público (MPCE) deve tocar o caso. Apesar de a denúncia por parte da criança sozinha ser permitida, ainda há desfalques no atendimento particular a ela. "O que acontece é que os órgãos ainda não estão prontos para uma escuta especializada dessas crianças. É preciso ter profissionais que consigam fazer essa denúncia", diz Lídia.

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O terceiro passo é procurar assistência primária em saúde e em seguida o apoio psicossocial. Programas como o Rede Aquarela realizam o atendimento cruzado com Centros de Apoio Psicossocial (Caps) e com outras instituições sociais, como as universidades públicas e privadas com equipes e profissionais. Os acompanhamentos podem ser feitos de forma simultânea.

É importante destacar que durante todo o processo de denúncia até o amparo, o sigilo da vítima e da pessoa que denuncia o crime é garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e pelo Artigo 5º da Lei Nº 13.431, conhecida como Lei da Escuta. A criança ou o adolescente será resguardado de qualquer contato, ainda que visual, com o suposto autor ou acusado, ou com outra pessoa que represente ameaça, coação ou constrangimento. O depoimento especial, sempre que possível, deverá ser realizado uma única vez.

Veja onde denunciar casos de violência sexual contra crianças e adolescentes em Fortaleza:

PASSO UM: CONSELHO TUTELAR (confira as abrangências de bairros aqui)

Conselho Tutelar I - rua Guilherme Rocha, 1070, Centro

Telefones: (85) 3433.1416/98970.5986
E-mail: conselhotutelarum@yahoo.com.br

Conselho Tutelar II - rua da Paz, 302, Mucuripe

Telefones: (85) 3259.2612 / 98899.6677
E-mail: ct2fortaleza@gmail.com ou conselhotutelar2@fortaleza.ce.gov.br

Conselho Tutelar III - rua Silveira Filho, 935, João XXIII

Telefones: (85) 3131.1950 / 98890.9943
E-mail: conselhotutelarIII@hotmail.com ou conselhotutelar3@fortaleza.ce.gov.br

Conselho Tutelar IV - rua Padre Ambrosio Machado, 625, Parreão

Tel: (85) 98970.4905 / 3292.4955
E-mail: conselhotutelar4@fortaleza.ce.gov.br ou conselhotutelar4@hotmail.com

Conselho Tutelar V - avenida Alanis Maria Laurindo (antiga Avenida B), s/n, Conjunto Ceará –1ª etapa

Telefones: 3452.2483 / 98970.5478
E-mail: conselhotutelar_serv@yahoo.com.br ou conselhotutelar5@fortaleza.ce.gov.br

Conselho Tutelar VI - rua Pedro Dantas, 334, Dias Macedo

Telefones: (85) 3295.5794 / 98970.5835
E-mail: conselhotutelarseis@yahoo.com.br ou conselhotutelar6@fortaleza.ce.gov.br

Conselho Tutelar VII - rua João Tomé, 261, Monte Castelo

Telefones: (85) 3274.6211 / 98868.9780
Email: conselhotutelarsete@hotmail.com

Conselho Tutelar VIII - avenida Alberto Craveiro, 1500, Boa Vista

Telefones: (85) 3433.1423 / 98706.6121
Email: conselhotutelar8@fortaleza.ce.gov.br

Plantão do Conselho Tutelar em Fortaleza - rua Guilherme Rocha, 1503, Jacarecanga

Telefone: (85) 3238.1828 / 98970.5479
Email: plantaodoconselho@fortaleza.ce.gov.br


PASSO DOIS: DENUNCIAR A VIOLÊNCIA

Fortaleza
Delegacia de Combate à Exploração de Crianças e Adolescentes (DCECA)

Endereço: rua Soares Bulção, s/n – São Gerardo, Fortaleza – CE

Telefone: (85) 3101-2044 ou 3433-9568

Email: dceca@policiacivil.ce.gov.br

Onde não há uma unidade especializada de atendimento a esse tipo de violência, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) informou ao O POVO que a população pode comparecer às delegacias municipais, metropolitanas e regionais para registrar os crimes.

Disque 100

Telefone: 100 (discagem gratuita, de qualquer terminal telefônico fixo ou móvel).

PASSO TRÊS: PROCURAR UMA UNIDADE DE SAÚDE

Hospital Distrital Gonzaga Mota de Messejana

Endereço: avenida Washington Soares, 7700 - Messejana
Telefone: 3105-1590

PASSO QUATRO: BUSCAR APOIO PSICOSSOCIAL E JURÍDICO

Programa Rede Aquarela

Endereço: rua João Tomé, nº 261 - Bairro Monte Castelo
Telefone: (85) 32381682 ou 34331421

Ministério Público
Núcleo de Atendimento às Vítimas de Violência (Nuavv)

Endereço: avenida Cel. José Philomeno Gomes, nº 222 - Luciano Cavalcante
Telefone: (85) 3218-7631 / (85) 98563-4067

Defensoria Pública
Núcleo de Atendimento da Defensoria Pública da Infância e Juventude – (Nadij)

Endereço: rua Auristela Maia Farias, 1112 - Eng. Luciano Cavalcante
Telefone:
(85) 99220-4953 (WhatsApp das 8h às 14h) e (85) 98895-5716 (WhatsApp das 14h às 16h40)

Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca)

Endereço: rua Deputado João Lopes, 83, Centro
Telefone:
(85) 3252-4202 / (85) 997680032

Confira a cartilha:

Clique aqui para baixar o PDF.

 

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