Pandemia da Covid-19 impacta na vida de pessoas com diabetes

Entre as mudanças na vida desses pacientes estão o controle da doença, padrão de alimentação, atividade física e acesso a medicamentos

17:40 | Ago. 25, 2020

Por: Mirla Nobre
FORTALEZA, CE, Brasil. 24.08.2020: Guilherme Nobre, 58, motorista, relata dificuldades no seu tratamento para diabetes tipo 2 durante a pandemia. (Fotos: Deisa Garcez/Especial para O Povo) (foto: Deisa Garcez/Especial para O Povo)

A quarentena ocasionada pela pandemia do novo coronavírus provocou mudanças na vida de muitas pessoas. Decretada em 19 de março de 2020, no Ceará, o período segue ainda, neste segundo semestre do ano, como orientação de isolamento social a fim de evitar a proliferação da Covid-19. Porém, o período em casa alterou o tratamento e a rotina de pessoas com doenças crônicas, como diabetes.

O motorista Guilherme Nobre, 58, diagnosticado com diabete Tipo 1 há 19 anos, admite que o começo da pandemia levou ele a ter uma alimentação mais desregulada, o que aumentou o nível da glicemia. “Com a má alimentação, tive que passar a utilizar insulina para que o meu nível glicêmico pudesse baixar, caso contrário, eu não voltaria ao trabalho, já que faço parte grupo de risco da Covid-19. A minha esperança é que com esta nova rotina de alimentação e exercícios que adotei, eu possa baixar a diabetes e assim voltar ao trabalho”, relata o motorista.

Um mês antes da pandemia, o pós-fiscal Gleison Alves, 30, foi diagnosticado com diabete Tipo 2. Para ele, ao descobrir a doença, sua forma de alimentação mudou totalmente. “Com a pandemia, eu pude ter um tempo melhor para entender sobre a doença. Fiz pesquisas e mudei minha alimentação cortando o sal e açúcar das minhas refeições. Infelizmente, com a pandemia ainda não me sinto seguro em sair de casa para me exercitar”, afirma.

Entre abril e maio deste ano, foi realizada uma pesquisa pelo jornal científico Diabetes Research and Clinical Practice, no qual apontou que a quarentena alterou a vida de pessoas portadoras de diabetes. Entre as mudanças, destacam-se o controle da doença, o padrão de alimentação, atividade física, acesso a medicamentos e serviços de saúde.

Ao todo, 1.701 brasileiros com diabetes participaram da pesquisa realizada on-line entre 22 de abril e 4 de maio. Entre os dados estão: a redução das atividades físicas de 59,5% dos entrevistados; 59,4% observaram variação na glicemia; e 38,4% adiaram ou cancelaram suas consultas médicas. Segundo a pesquisa, o aumento dos níveis ou da variabilidade da glicemia podem levar esse grupo, caso sejam infectados, a riscos ainda mais elevados da Covid-19.

A pesquisa também investigou comportamentos alimentares e relacionados à prática de atividades físicas. Dentre os entrevistados, 29,8% revelaram aumento na ingestão de alimentos. Ao mesmo tempo, 59,5% diminuíram a frequência de atividades físicas (44,8% tiveram um declínio elevado).

Acesso a medicamentos

 

Todas as pessoas com diabetes Tipo 1 e muitas com Tipo 2 precisam de insulina para controlar a glicose no sangue, é o que informa a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). No dia 29 de março de 2019, foi publicada no Diário Oficial da União, a Portaria nº 19 de 27 de março do Ministério da Saúde (MS), que tornou público a decisão de incorporar insulina análoga prolongada para o tratamento de diabetes mellitus Tipo 1 no Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, o acesso a esse medicamento passa por um conjunto de normas burocráticas até chegar aos pacientes.

De acordo com a jornalista e coordenadora de advocacy da Associação de Diabetes Juvenil (ADJ ), Vanessa Pirolo, no final de 2018, a insulina de ação rápida foi disponibilizada para o SUS. “Essa insulina acabou fazendo parte de um componente especializado, o que dificultou o acesso a ela. Isso gerou uma burocracia enorme para conseguir o medicamento, pois a gente sabe que essa insulina só é disponível para 10% dos brasileiros com diabetes Tipo 1”, informa.

Entre as dificuldades apontadas pela ADJ Brasil, estão o preenchimento do documento de acesso ao medicamento, que demora cerca de 40 minutos e precisa ser feito por médicos especializados em endocrinologia; às consultas do SUS não ultrapassam 15 minutos, o que dificulta o preenchimento do documento; e a falta de conhecimento por alguns médico quanto ao acesso à insulina. Conforme a ADJ, foi emitido um relatório ao Ministério da Saúde (MS) para informar a dificuldade no acesso a insulina análoga de ação rápida. Até agora a ONG não obteve resposta pelo ministério.

Conforme a presidente da Associação Cearense de Diabéticos e Hipertensos (Acedh), Helena Rocha, a distribuição dos medicamentos de diabetes segue normal, e é feita pelo Governo Federal sendo distribuídas em postos de saúde e farmácias populares de forma gratuita. Segundo ela, durante a pandemia, a receita que tinha validade de três em três meses expandiu para seis em seis. “Poucas pessoas sabem da ampliação do período das receitas. Elas ficam, muitas vezes, sem receber medicação com medo de ir ao posto para não adquirir a Covid-19”, informa.