Excesso no uso de telas pode prejudicar aprendizagem e desenvolvimento das crianças, dizem especialistas

Conforme a Sociedade Brasileira de Pediatria, a dependência digital pode causar problemas comportamentais e de saúde mental nas crianças

 

Com o distanciamento social decorrente da pandemia do novo coronavírus, as crianças passaram a adotar o sistema de ensino remoto, como forma de manter as atividades escolares. Por causa disso, a exposição a tela, que já era comum entre as crianças, passou a se tornar excessivo. Especialistas alertam que isso pode dificultar a retenção de conteúdo das crianças, além de contribuir para alterações no comportamento, como dependência digital, transtornos do sono, sedentarismo, problemas de saúde mental, e outros.

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Segundo o manual sobre saúde de crianças e adolescentes na era digital, publicado pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), os fatores de risco no contexto familiar são a falta de afeto, suporte e apoio por parte dos pais e responsáveis; o abandono e a falta de limites; além da negação dos comportamentos inadequados dos filhos, violência familiar, episódios frequentes de estresse tóxico, e o uso de álcool e drogas.

Conforme o documento, as mídias preenchem vácuos como o ócio, tédio e a necessidade de entretenimento. Outra vezes, preenchem o abandono afetivo deixado por pais ocupados. As consequências do uso inadequado e excessivo de dispositivos como computadores e celulares, são constatadas em relatos de acidentes, abusos de privacidade, distúrbios de aprendizado, baixo desempenho escolar, atrasos no desenvolvimento, entre outros - destaca a SBP.

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Essa situação se agrava durante a pandemia, visto que as crianças ficam ainda mais reclusas do convívio social, que é importante para o seu desenvolvimento, salienta Edgard Morya, coordenador de Pesquisas do Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra em Macaíba - Rio Grande do Norte. Ele relata que, além de problemas como irritabilidade, ansiedade e depressão, as crianças podem desenvolver dificuldade de movimento, entre outras condições que impactam o organismo, em um efeito sistêmico.

Excesso de tela durante ensino remoto pode prejudicar aprendizagem

Com mais tempo livre durante a quarentena e a reclusão do convívio social, as crianças passaram a utilizar os dispositivos eletrônicos como forma de entretenimento, mesmo após o período das aulas remotas. Ou seja, elas acabam se expondo ainda mais aos estímulos luminosos provocados pela tela, que forçam a atenção e, ao mesmo tempo, facilitam a distração, conforme Edgard Morya.

Esse é um dos problemas que o excesso do uso de tela vai provocar nas crianças, a curto prazo. “Em breve os educadores vão ter esse resultado. A retenção do conteúdo [das aulas] vai ser menor. A criança não consegue ficar por muito tempo focada em uma só coisa, com tantos estímulos luminosos se mexendo. Seu sistema nervoso está sempre mudando o foco de atenção”, esclarece o pesquisador.

A neuropsicóloga Samantha Maranhão complementa que, o tempo de concentração das crianças é mais curto, e aumenta conforme ela vai se desenvolvendo e se torna adulta. Por isso, mantê-las focadas em algumas atividades, por um certo período de tempo, é um desafio, devido a esse limite de atenção.

Segundo Samantha, mesmo os adultos têm essa concentração limitada. “A gente está lá produzindo um material, mas sente a necessidade de olhar o WhatsApp, se distrair de alguma forma. A mente precisa desse distrator para conseguir voltar com qualidade para aquilo que a gente estava fazendo”, explica.

“Se a gente pensa nesse formato de tela, que não tem o coleguinha do lado para conversar - não tem algo externo para que ela consiga se distrair e voltar - se exigir da criança manter a atenção de 1h na tela, ela não vai conseguir”, frisa a neuropsicóloga, que é também preceptora multiprofissional do Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi, Instituto Santos Dumont.

Por outro lado, Samantha acrescenta que, para crianças mais tímidas, o formato de ensino remoto pode promover a sensação de segurança, para que ela se torne mais ativa durante as aulas. “Eles podem ter a sensação de que está sozinho com o professor, diante de uma aula, e então tirar dúvidas; podem conseguir se expor, porque a interferência do colega não vai mais existir”, pondera.

Conforme a neuropsicóloga, desde que usado com responsabilidade, as ferramentas tecnológicas podem contribuir para um processo de aprendizagem mais prazeroso, com qualidade. “O desafio é esse tempo de concentração. Se eu, como professor, consigo usar recursos tecnológicos que motivem a criança, como jogos e realidade virtual, eu posso ter um maior envolvimento do alun, nesse contexto de isolamento”, destaca.

Como limitar o excesso do uso de tela?

De acordo com a neuropsicóloga Samantha Maranhão, a rotina com horários estabelecidos, que envolvam atividades com e sem o uso de telas, é uma forma de diminuir a exposição excessiva. Uma opção seria reduzir o tempo de tela no contraturno das aulas, na mesma proporção de tempo em que a criança teve acesso aos dispositivos, como computadores ou celulares. “Os pais podem oferecer brincadeiras livres, com jogos manuais. Ou incentivar os filhos a participarem das atividades de rotina domiciliar, de acordo com a faixa etária da criança”, detalha Samantha.

Além disso, quando a tela for oferecida, ela deve ser acompanhada de alternativas que promovam qualidade. Como exemplo, vídeos de músicas para que a criança possa dançar e cantar, sem oferecer toda a sua atenção para os estímulos da tela. “Os pais podem perguntar sobre uma história que a criança acabou de ouvir, ou o que ela viu, estimulando a fala dela”, complementa. “Então, é usar um pouco da criatividade, para que o uso da tela não seja tão danoso”.

Leia o manual sobre saúde de crianças e adolescentes na era digital, publicado pela Sociedade Brasileira de Pediatria

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