Lei sobre maconha medicinal é aprovada no Rio de Janeiro

Governador do RJ não sancionou projeto que passou por unanimidade na Alerj; órgão derrubou veto em sessão nesta terça-feira, 2

21:35 | Jun. 03, 2020

Por: Bemfica de Oliva
Brasil atualmente tem 19 produtos à base de derivados da maconha autorizados pela Anvisa para comercialização em farmácias no País, sob prescrição médica. Óleo fitoterápico é extraído da Cannabis sativa no período da floração (foto: Agência Brasil)

A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) derrubou, na noite dessa terça-feira, 2, o veto do governador Wilson Witzel (PSC) ao projeto de lei que regulamenta uso e pesquisa de cannabis medicinal no Estado. O projeto, de autoria do deputado Carlos Minc (PSB), havia sido aprovado por unanimidade no parlamento, mas recusado por Witzel. O ato do governador foi revertido por 41 votos a favor, 15 contrários e seis abstenções.

A regulamentação de substâncias controladas, como é o caso da maconha e derivados, é de responsabilidade da Agência Nacional de Vigiância Sanitária (Anvisa) e definida por leis federais. No entanto, os estados possuem autonomia para definir sobre questões de saúde e pesquisa.

Pela falta de leis específicas, é raro estabelecer estudos sobre tratamentos a base de cannabis no Brasil: até o momento, apenas uma associação de pacientes, na Paraíba, tinha permissão para cultivo no país, conseguida por decisão judicial. Com a aprovação, agora é possível no Rio de Janeiro que estas associações e também pesquisadores investiguem o uso da planta e seus derivados no tratamento de uma série de doenças.

Segundo a socióloga Monique Prado, assessora parlamentar do deputado Carlos Minc, uma das possibilidades é que se possa construir um banco de "cepas" para pesquisa. Estas são variações da cannabis com quantidades diversas de cada um dos princípios ativos presentes, e a formação da base de plantas permitiria estudar quais tipos são mais adequados ao tratamento de cada doença.

De acordo com a nova lei, as associações de pacientes têm autonomia para "acolher e apoiar, médica e juridicamente, os pacientes" que dependem da planta e derivados no seu tratamento. Para Monique, um dos diferenciais é a possibilidade de fortalecimento das associações, pois o alto custo dos medicamentos industrializados a base de cannabis é um proibitivo para muitas famílias. Em 2019 a Anvisa aprovou resolução com procedimentos para importação, produção nacional e comercialização de medicamentos derivados da cannabis, mas arquivou a normatização para cultivo com fins medicinais e de pesquisa. Com a legislação aprovada, esta situação muda parcialmente no Rio de Janeiro.

A socióloga é otimista também em relação ao aumento do acesso à informação sobre as propriedades medicinais da maconha. Ela espera que a lei "ajude a diminuir o preconceito em relação a planta, garantindo mais legitimidade e segurança aos pesquisadores". Segundo ela, também existe a importância pelo fato de que o texto incentiva a produção e disseminação de informações sobre os usos medicinais da cannabis, suas possibilidades e riscos.

O texto abre também margem para indivíduos realizarem o plantio caseiro, desde que com finalidades terapêuticas ou de pesquisa. O cultivo individual, por sua vez, esbarra nas limitações legais e burocráticas, com apenas 78 permissões tendo sido concedidas pela Justiça em todo o Brasil - sendo seis no Ceará.

Nacionalmente, existe uma associação de advogados especializados em auxiliar na disputa judicial pelo cultivo caseiro, a Rede de Advogados pela Reforma da Política de Drogas (Rede Reforma), que tem trabalhado em diversos casos que demandam a permissão de cultivo. Outra questão apontada por Monique é a possibilidade destas autorizações crescerem no País, com a lei sendo utilizada em argumentações judiciais de advogados, e juízes tendo maior disposição em conceder as decisões favoráveis aos pacientes.

Não se trata, no entanto, de legalização plena para o cultivo e uso, mesmo dentro do estado. As autorizações para uso medicinal da cannabis ainda dependem de se enquadrar nas situações regulamentadas pela Anvisa, ou de decisões judiciais em casos específicos. É necessário ainda ter prescrição médica para o uso da planta.