Prefeitos podem acabar com multas por viseira levantada? Veja o que dizem especialistas
André Fernandes e José Sarto prometem anistia da multa. Prefeito afirmou que proposta foi motivada por "demanda da categoria"A multa relacionada a viseiras de capacete vem sendo tema de propostas de alguns candidatos à Prefeitura de Fortaleza. A proposta de abolir multas pelo uso incorreto do item é comentada pelo candidato André Fernandes (PL) em entrevistas, sabatinas e no horário eleitoral.
Nesta semana, José Sarto (PDT) divulgou nas redes sociais um vídeo em que garante a mesma coisa, caso reeleito. As promessas sobre a lei federal trazem o questionamento: é possível a gestão municipal perdoar esse tipo de multa?
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De acordo com o Conselho Nacional de Trânsito (Contran), o uso de viseira totalmente levantada ou de capacetes sem viseira e sem óculos de proteção é considerada uma infração média, sujeita a multa de R$ 130,16 e o veículo pode ser retido para regularização, além da perda de quatro pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
As regras apontam que o capacete deve conter viseira. Caso não, o piloto deve utilizar óculos de proteção. Além disso, a viseira ou os óculos devem estar posicionados a proteger os olhos do condutor, o piloto pode levantar totalmente a viseira, desde que a motocicleta esteja imobilizada. Em movimento, a viseira pode ser levantada em capacetes com queixeira, mas apenas uma pequena abertura para garantir a circulação de ar.
De acordo com Júnior Bonfim, presidente da Comissão de Direito Municipal da Ordem dos Advogados do Estado do Ceará (OAB-CE), o município não tem competência para tratar dessa questão, visto que a responsabilidade é do Contran.
“O município pode tratar das questões de estacionamento, fluxo de pedestres, matérias de interesse local. Um prefeito não pode fazer proposta sobre leis fora da esfera de competência [...] Pode até dizer, mas pode estar criando uma promessa em que há obstáculo jurídico. Ele não pode propor normas que contrariem as diretrizes gerais do Código de Trânsito Brasileiro”, afirmou.
A advogada Mariana Rocha, especialista em Direito de Trânsito, também explicou que as infrações são estabelecidas em leis e regulamentos federais.
“O prefeito de uma cidade não tem o poder legal para perdoar multas de trânsito municipais de forma indiscriminada [...] As infrações de trânsito são estabelecidas em leis e regulamentos federais e somente a União Federal detém a competência para legislar sobre o assunto. Proibir o órgão de trânsito municipal de aplicar o Código de Trânsito Brasileiro pode, inclusive, ser interpretado como um ato de improbidade administrativa”, disse.
Já Fernandes alega, em vídeo nas redes sociais, que a legislação deixa uma "brecha". "A Procuradoria Geral do Município pode expedir e determinar que não seja aplicada uma sanção até que o próprio órgão competente lesgile específico sobre isso", afirmou.
Perdão de multas: o que o prefeito pode fazer?
No entanto, Rocha afirmou que o prefeito pode conseguir a remissão do crédito tributário, a partir de uma lei municipal aprovada pela Câmara dos Vereadores.
“No máximo, o que um gestor municipal pode conseguir é a remissão do crédito tributário, mas isso tem que ser feito através de uma lei municipal aprovada pela Câmara e precisa estar dentro de alguns contextos específicos. Com a remissão, a autuação de trânsito não estaria anulada, apenas o município estaria abrindo mão do recurso da multa. As demais penalidades inerentes a infração, como os pontos na CNH, continuam sendo aplicadas”, pontuou.
Questionado sobre o funcionamento da proposta em sabatina na Rádio O POVO CBN nesta quarta-feira, 4, o prefeito José Sarto explicou que será feita a anistia das dívidas. O valor seria cobrado, conforme a legislação federal, porém iria ser ressarcido ao motociclista multado.
“Posso fazer, até porque já foi feito. A remissão de dívidas, o perdão da dívida pode ser feito pela Prefeitura. Eu já fiz isso em momentos anteriores. Sendo reeleito, que eu vou ser, vamos enviar a mensagem para a Câmara, para anistiar todas as multas e abolir a multa”, disse o prefeito.
O presidente da Comissão de Direito Municipal da OAB-CE, Júnior Bonfim, aponta que, nesse caso, a proposta seria possível, porém o gestor também deve apresentar medidas compensatórias e apresentar o impacto no município.
“É possível, pois não estaria contrariando a lei federal. [...] Se [o prefeito] vai dar esse subsídio, deve mostrar como ele vai compensar, deve apresentar medidas compensatórias da receita que esse município vai perder. Um projeto desses deve mostrar o impacto orçamentário financeiro, mostrar onde vai impactar”, considerou.
O valor da multa seria ressarcido ao motociclista, no entanto os pontos na CNH seriam mantidos, visto que a aplicação da penalidade não é de competência municipal, como ressalta a especialista.
“Com a remissão, a autuação de trânsito não estaria anulada, apenas o município estaria abrindo mão do recurso da multa. As demais penalidades inerentes a infração, como os pontos na CNH, continuam sendo aplicadas”, destacou a advogada Mariana Rocha.