Assembleia aprova projeto que permite pulverização de agrotóxicos por drones no Ceará

Pulverização aérea de agrotóxicos é vetada no Ceará desde 2019, em decorrência de lei da qual Elmano foi coautor quando era deputado estadual. Governo apoiou liberação

A Assembleia Legislativa (Alece) aprovou, em sessão nesta quinta-feira, 19, Projeto de Lei (PL 1075/23) que permite drones realizarem a pulverização de agrotóxicos no Ceará. Foram 22 votos a favor e nove votos contrários ao texto, que libera a pulverização realizada por meio de "Aeronaves Remotamente Pilotadas - ARPs, Veículo Aéreo Não Tripulado - Vant ou Drones" no Estado.

O projeto é apoiado pelo governador Elmano de Freitas (PT), que sancionou o texto horas após a aprovação no Legislativo. A modificação já consta em edição do Diário Oficial do Estado (DOE) desta quinta-feira, 19. A matéria gerou divergências dentro e fora do Parlamento, com parlamentares e entidades civis criticando duramente o teor e o ritmo em que o trâmite ocorreu.

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A pulverização aérea de agrotóxicos era vetada no Ceará desde 2019, em decorrência da Lei Estadual Nº 16.820/19, conhecida como Lei Zé Maria do Tomé, da qual Elmano foi coautor como deputado estadual. A antiga lei foi referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a sua constitucionalidade em 2023, e conta com o apoio de representantes dos setores ambientalista, acadêmico e de movimentos sociais.

Entre os deputados que votaram contra o projeto estão membros de partidos da base do governo, enquanto entre os que votaram a favor estão membros da oposição.

Os deputados contrários à proposta são: Apollo Vicz (PSD), Emília Pessoa (PSDB), Guilherme Sampaio (PT), Jô Farias (PT), Lia Gomes (PDT), Lucinildo Frota (PDT), Martinha Brandão (Cidadania), Missias do MST (PT) e Renato Roseno (Psol), este último autor da lei que vetou a pulverização aérea desse material. O deputado De Assis Diniz (PT) se absteve. Já nomes da oposição ao governo, como Carmelo Neto (PL) e pastor Alcides Fernandes (PL) votaram a favor.

Roseno militou contra o texto desde o trâmite nas comissões, fazendo oposição e duras falas contra Elmano. Após a aprovação, o parlamentar manifestou com ênfase o descontentamento com o governador petista, falando que Elmano "rasgava sua história" por aceno político a um setor.

"Elmano você nos derrotou. Derrotou o MST, a Fetraece, a Abrasco, a UFC, a ciência... Você me derrotou. Não é assim que se trata um companheiro de caminhada. Elmano você se derrotou. Essa derrota é um retrocesso imenso em quem milita a favor da vida e da justiça social", disparou Roseno.

O deputado Felipe Mota (União Brasil), autor de um dos projetos sobre o tema e que foi apensado e tem coautoria de Osmar Baquit, Marcos Sobreira e Queiroz Filho, comemorou a aprovação. "Quando escuto críticas que governo e oposição tenham tratorado o processo, vejo que as pessoas não olham para os próprios erros, que o projeto anterior foi aprovado em poucos dias", comentou.

E seguiu: "Temos que comemorar o desenvolvimento, novas tecnologias, capacitação, um novo mercado e novo produto que gerará emprego e produção maior".

O deputado Missias Dias (PT), um dos parlamentares da base e do partido do governador que foi contra o texto, falou contra o projeto. "Pelo projeto que se tem, imagine um drone a 30 metros distante da sua casa, do campo de futebol, do quintal. Quem mora na zona rural, quem não tem terra, mora entre as grandes fazendas dos grandes proprietários e quando eles tem sua grande produção querem manter o lucro, mas não está preocupado com as comunidades próximas", destacou em tom crítico ao projeto.

A deputada Jô Farias, que participava virtualmente, se emocionou e chegou a chorar ao votar contra a matéria. Ela endossou as falas do correligionário Missias Dias, contra o projeto dos drones.

Como votaram os deputados

SIM (22)

  1. Agenor Neto (MDB)
  2. Alcides Fernandes (PL)
  3. Almir Bié (PP)
  4. Alysson Aguiar (PCdoB)
  5. Carmelo Neto (PL)
  6. Cláudio Pinho (PDT)
  7. Danniel Oliveira (MDB)
  8. David Durand (Republicanos)
  9. Felipe Mota (União Brasil)
  10. Firmo Camurça (União Brasil)
  11. Guilherme Bismarck (PDT)
  12. João Jaime (PP)
  13. Julio César Filho (PT)
  14. Leonardo Pinheiro (PP)
  15. Lucilvio Girão (PSD)
  16. Marcos Sobreira (PDT)
  17. Nizo Costa (PT)
  18. Osmar Baquit (PDT)
  19. Queiroz Filho (PDT)
  20. Romeu Aldigueri (PDT)
  21. Sargento Reginauro (União Brasil)
  22. Sérgio Aguiar (PDT)

NÃO (9)

  1. Apollo Vicz (PSD)
  2. Emília Pessoa (PSDB)
  3. Guilherme Sampaio (PT)
  4. Jô Farias (PT)
  5. Lia Gomes (PDT)
  6. Lucinildo Frota (PDT)
  7. Martinha Brandão (Cidadania)
  8. Missias do MST (PT)
  9. Renato Roseno (Psol)

ABSTENÇÃO (1)

  1. De Assis Diniz (PT) 

Entenda

Um projeto que permite que drones realizem a pulverização de agrotóxicos no Ceará tem gerado debates — e embates —, na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), inclusive dentro da base do governador Elmano de Freitas (PT). Proposições sobre o tema foram apensadas e tramitam nas comissões do Legislativo.

Nesta terça-feira, 17, a proposta passou a tramitar em regime de urgência. Quando faltam dez dias para o fim do período legislativo, o trâmite em urgência não depende de votação — basta a solicitação de três deputados estaduais.

A votação na Comissão de Meio Ambiente foi adiada por pedido de vistas (mais tempo para análise) do deputado estadual Renato Roseno (Psol), autor da lei em vigor que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará.

No início deste mês, Elmano disse a representantes do setor agropecuário que a Assembleia articula para aprovar a liberação do uso de drones, com essa finalidade, ainda neste ano. O projeto já foi aprovado em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e tramita em outros colegiados temáticos antes de ser encaminhado ao Plenário.

A pulverização aérea de agrotóxicos é vetada no Ceará desde 2019, em decorrência da Lei Estadual Nº 16.820/19, conhecida como Lei Zé Maria do Tomé, da qual Elmano foi coautor como deputado estadual. A lei foi referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a sua constitucionalidade em 2023, e conta com o apoio dos setores ambientalista, acadêmico e de movimentos sociais.

Durante eventos neste mês, Elmano tem defendido o apoio à pulverização aérea de agrotóxicos via drones. De acordo com o chefe do Executivo “o que nós proibimos e continuará proibida é a pulverização aérea por avião”. Durante uma agenda de gestão, o agora governador disse ao O POVO que, na época da votação da lei, não existia a tecnologia de utilização de drone.

"Isso não existia à época. O que existia era a pulverização aérea por avião. O que a Assembleia está discutindo é que você possa ter uma flexibilização ao longo de uma nova tecnologia", argumentou o petista, acrescentando que a discussão atualmente gira em torno de "substituir um homem que aplica veneno para uma máquina aplicar veneno".

Divergências

O deputado estadual Renato Roseno (Psol), autor da lei que veda a pulverização aérea de agrotóxicos em território cearense, tem cobrado o governador publicamente sobre a mudança de posição. Roseno trata a liberação como “inadmissível” e tem afirmado que Elmano “cedeu à pressão do agronegócio”.

Nesta terça-feira, 17, o deputado informou que os projetos que liberam os drones passaram a tramitar em regime de urgência na Casa e disse ter pedido vistas na Comissão de Meio Ambiente. "Como estão em regime de urgência, amanhã eles vem para Plenário", informou ao O POVO.

"O apoio do governo ao infame projeto que autoriza o uso de drones na pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará revela uma inflexão política em que o governador Elmano resolve abraçar os interesses do agronegócio e dar as costas aos movimentos sociais, à ciência e ao ambientalismo. É um retrocesso absurdo sob todos os pontos de vista", disparou.

Em discurso recente na tribuna, Roseno lembrou que os drones agrícolas não são pequenas peças, como os comumente vistos e utilizados para registros fotográficos.

“São drones que hoje carregam 60, 100, 200 litros. Hoje já se comercializam drones de 600 litros e, no Brasil, estão sendo desenvolvidos drones de 900 litros de calda tóxica. A legislação brasileira é extremamente frágil contra isso, porque ela permite que drones cheguem a 20 metros de áreas residenciais, permite que um piloto possa fazer um curso por Ensino à Distância”, alertou.

O deputado Missias Dias (PT), que tem trajetória ligada ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e preside a comissão de Agropecuária, é um dos parlamentares da base que vai na contramão do projeto e, consequentemente, do que defendeu Elmano.

“Não se trata apenas de um drone, se trata de colocar veneno nos territórios da zona rural. Automaticamente esse veneno, de forma escalonada, vai atingir casas, pessoas, o solo, a biodiversidade, a água. Estamos tratando de um tema complicado que diz respeito à saúde pública”, destacou o parlamentar do mesmo partido do governador.

E seguiu: “(...) É o veneno que realmente mata se não tivermos cuidado e zelo. Se me perguntarem, sou contra a pulverização aérea. Sou contra todo tipo de veneno jogado na natureza, temos que buscar outras alternativas e trabalhar numa transição agroecológica”.

Entre os defensores da aprovação do texto e liberação do uso de drones para a prática está o deputado Felipe Mota (União Brasil), de partido que faz oposição ao governo do PT.

Mota é autor de um dos projetos que prevê a liberação. Após a aprovação na CCJ ele comemorou e disse que a matéria deve chegar ao Plenário em "tempo recorde" para ser apreciada por seus pares.

“Uma notícia boa para os produtores rurais, para quem ama a agricultura de verdade; aprovamos o projeto dos drones na CCJ, um passo muito importante. Agora passará pelas outras comissões e em tempo recorde chegará ao Plenário 13 de maio”, celebrou.

Pressão externa

O Fórum Cearense Pela Vida no Semiárido foi uma das entidades que se manifestou contra a tramitação de projetos que liberam o uso de drones para pulverização dos materiais. A entidade manifestou “profundo repúdio à proposta de liberação da pulverização aérea de agrotóxicos por drones” e cobrou uma transição agroecológica.

“Enquanto se nota a agilidade para a tentativa de aprovação de propostas como essa, segue paralisada a iniciativa de aprovação de uma Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica no Ceará, que vem sendo pautada por agricultores familiares e pelas mais diversas organizações sociais em nosso Estado”.

Representantes da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Ceará (Fetraece) e outras entidades estiveram na Assembleia Legislativa, na semana passada, onde conversaram com parlamentares do PT e de outras siglas sobre o tema.

A entidade publicou registro dos encontros nas redes sociais e pediu "tempo para debate, realização de audiência pública, apresentação de argumentos, estudos e notas técnicas que demonstram os impactos ambientais e de saúde pública causados pela pulverização aérea de veneno".

Os representantes se reuniram com os deputados Missias do MST (PT), De Assis Diniz (PT), Jô Farias (PT), Jeová Mota (PDT) e Lucinildo Frota (PDT). Uma nova mobilização de entidades está prevista para ocorrer na Alece, nesta quarta-feira, 18.

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