PF apreendeu texto de "discurso pós-golpe" no escritório de Bolsonaro na sede do PL

A apreensão do documento foi em fevereiro, durante as investigações do plano de golpe de estado após a derrota em 2022

15:50 | Nov. 29, 2024

Por: Wilnan Custódio
EX-PRESIDENTE e outras 36 pessoas foram indiciadas pela PF (foto: TÉRCIO TEIXEIRA / AFP)

Foi apreendido na sala do ex-presidente Jair Bolsonaro na sede do PL, em Brasília, um documento que foi classificado pelos investigadores como "discurso pós-golpe". O texto de quatro páginas elenca “justificativas” para convocação das Forças Armadas.

O discurso é finalizado com um trecho que declara Estado de Sítio e Operação de Garantia da Lei e da Ordem, que era uma das possibilidades mais populares entre textos desinformativos que inflamavam os apoiadores de Bolsonaro.

"Com base em disposições expressas da Constituição Federal de 1988, declaro Estado de Sítio e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem", diz o fim do texto, além de anular o resultado das eleições e trocar os magistrados integrantes do Tribunal Superior Eleitoral.

Os investigadores da Polícia Federal (PF) consideraram o escrito como sendo um esboço de discurso. De acordo com o relatório apresentado pela PF, o documento “parece se tratar de ensaio para discurso preparado para eventual subversão do Estado Democrático de Direito”.

Ainda segundo as investigações, o material seria lido após a ruptura democrática. O texto também alega abusos cometidos pelo Supremo Tribunal Federal com motivo para o cancelamento do pleito eleitoral perdido por Bolsonaro.

O texto contém cinco pontos considerados para “justificar” a quebra democrática do país, entre eles desinformação:

  • Segundo o documento, Alexandre de Moraes, então presidente do TSE, teria amizade com o vice presidente eleito Geraldo Alckmin.
  • Ainda no texto, há decisões que são chamadas de ilegítimas ao restringir prerrogativas de parlamentares e profissionais de imprensa. O então presidente reclamava de decisões judiciais contra blogueiros que pediam golpe da internet.
  • O TSE não investiga acusação do partido de Bolsonaro (PL) de rádios não veicularem propaganda eleitoral do candidato. As acusações, entretanto, foram refutadas pelo por especialistas, explicando que o erro veio do próprio partido que não passou as propagandas para as rádio.
  • O Ministério da Defesa não ter acesso ao código-fonte das urnas (dados foram abertos um ano antes da eleição, e peritos militares não encontraram falhas).
  • Revisão do “trânsito em julgado”. (Mesmo sem menção a Lula no texto).


“Moralidade”

O material apreendido citava trechos da Constituição e teses jurídicas na tentativa de dar legalidade ao golpe de Estado. O texto ainda falava em “princípio da moralidade”, argumentando também que agentes públicos devem agir de acordo com a lei.

O princípio é citado no começo do texto, e na interpretação de quem escreveu, permite contestar as decisões do judiciário caso essa ocorra com o intuito autoritário. Decisões da Suprema Corte são constantemente atacadas por Bolsonaro e seus seguidores.

De acordo com o documento, esse princípio se aplicaria até mesmo às eleições. A PF apreendeu um parecer jurídico que também estava na sala de Bolsonaro na sede do PL.

O texto expressa posições de Ives Gandra, jurista conhecido por posições consideradas lenientes com os arroubos autoritários que envolvem Bolsonaro e militares golpistas. Segundo ele, militares podem atuar em casos de subversão à lei e ao Estado democrático de Direito, o que é incompatível com o princípio da democracia liberal sob o qual vive o Brasil. O STF já rejeitou essa tese.

Segundo o jurista, um interventor deveria ser nomeado, e sob ele ficarem subordinados o Exército, a Marinha, a Aeronáutica, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal.

Troca de magistrados do TSE

Ainda segundo o documento, três ministros do TSE deveriam ser trocados por outros ministros. O texto indicava a troca de Alexandre Moraes, o então presidente da Corte, Edson Fachin, e Ricardo Lewandowski.

Os magistrados deveriam ser substituídos por Nunes Marques, André Mendonça (ambos indicados por Bolsonaro ao STF), e Dias Toffoli. Segundo informações publicadas pelo portal Uol, os três ministros se encontraram com Bolsonaro entre julho e dezembro de 2022.

Mesmo sem provar a tese de Bolsonaro e seus aliados é de que a eleição foi desigual por causa de decisões da Justiça Eleitoral.