Veja a cronologia do plano de golpe que teve Bolsonaro como peça central
A Polícia Federal (PF) indiciou 37 pessoas por suposto envolvimento na trama golpista. O plano incluía a execução de Lula e Alckmin. A cronologia aborda os fatos ocorridos entre julho de 2022 e janeiro de 2023
15:53 | Nov. 27, 2024
A Polícia Federal (PF) indiciou na quinta-feira, 21, um total de 37 pessoas por tentativa de golpe de Estado. Dentre os nomes, se destacam o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ex-integrantes do seu governo, como o ex-ministro da Defesa Braga Netto, e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid.
“Os fatos investigados nesta fase da investigação configuram, em tese, os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, Golpe de Estado e organização criminosa”, segundo a PF.
A PF prendeu quatro militares e um agente da PF, na terça, 19 - dois dias antes da conclusão do inquérito - por suspeita de participação da elaboração do esquema chamado “Punhal Verde e Amarelo”, para assassinar o presidente Lula (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, no dia 15 de dezembro de 2022.
Na ocasião, foram presos cinco suspeitos de cooperar no planejamento de golpe de Estado. Os militares são da elite do Exército, chamados de “kids pretos”. Veja a lista:
- o general de brigada Mario Fernandes
- o tenente-coronel Helio Ferreira Lima
- o major Rodrigo Bezerra Azevedo
- o major Rafael Martins de Oliveira
Além dele, foi preso o policial federal Wladimir Matos Soares.
A investigação da PF "apurou a existência de uma organização criminosa que atuou de forma coordenada, em 2022, na tentativa de manutenção do então presidente da República [Jair Bolsonaro] no poder".
Confira abaixo a cronologia dos fatos que marcaram a tentativa de golpe de Estado no Brasil planejada pelos indiciados:
5 de julho de 2022
Neste dia, de acordo com a PF, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) convocou uma reunião com os ministros em que fora discutidos planos para uma tentativa de golpe de Estado. O encontro é comprovado por um vídeo da reunião achado no notebook de Mauro Cid.
“Se a gente reagir depois das eleições vai ter um caos no Brasil”, disse Bolsonaro durante a reunião. O ministro-chefe de Segurança Institucional, general Heleno, afirmou que “se tiver que virar a mesa, é antes das eleições”.
A reunião contava com a presença dos ministros Anderson Torres (Justiça) e Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), do ex-chefe da Casa Civil Braga Netto e do chefe-substituto da Secretaria-Geral da Presidência, Mário Fernandes. Por conseguinte, todos eles foram indiciados no inquérito da PF por envolvimento na trama golpista.
18 de julho de 2022
Em reunião com os embaixadores de vários países, Bolsonaro acusou de fraude - sem provas - o sistema eleitoral brasileiro.
“O grupo investigado criou, desenvolveu e disseminou a narrativa falsa da existência de vulnerabilidade e fraude no sistema eletrônico de votação do país, que teria como artífices ministros da Suprema Corte brasileira e do Tribunal Superior Eleitoral, com o objetivo de prejudicar o então presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO”, segundo a investigação.
Para a PF, “os ataques às urnas eletrônicas não se iniciaram após o segundo turno das eleições presidenciais de 2022”, pois, “o grupo ora investigado, desde o ano de 2019, já propagava essa ideia”.
Embora as alegações de fraudes nas urnas eletrônicas fossem desmentidas pela Justiça Eleitoral, Bolsonaro usou a estrutura do governo, especificamente o Palácio da Alvorada para apresentar as acusações contra o sistema eleitoral para os embaixadores.
“O objetivo era sedimentar na população a falsa realidade de fraude eleitoral para posteriormente a narrativa atingir” seus “objetivos”, afirma o relatório da Polícia Federal.
30 de outubro de 2022
Luiz Inácio Lula da Silva vence as eleições presidenciais no Brasil. Com 50,90% (60,3 milhões de votos), derrota Jair Messias Bolsonaro, no segundo turno, que obteve 49,10% (58,2 milhões de votos).
1° de novembro
Manifestantes bolsonaristas iniciam o acampamento em frente ao quartel-general da força em Brasília e em diversos quartéis do Exército pelo País, após o resultado do pleito de 2022.
Há registros do general Mário Fernandes, chefe-substituto da Secretaria-Geral da Presidência, presente no acampamento da Capital federal. Ele tirou fotos de si mesmo durante as visitas ao local ao longo dos dias seguintes de novembro.
9 de novembro de 2022
Mário Fernandes fez, nesse dia, o documento intitulado "Planejamento - Punhal Verde Amarelo" em um computador no Palácio do Planalto.
No mesmo dia, ele imprimiu o texto no Planalto, que de acordo com a PF, o documento descreve “a elaboração de um detalhado planejamento que seria voltado ao sequestro ou homicídio” do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, Lula e Geraldo Alckmin.
Fernandes teria levado o texto ao Palácio da Alvorada, casa presidencial do então presidente Bolsonaro, após imprimir o documento no Planalto. A visita de Mario Fernandes ao Palácio da Alvorada é confirmada pelo registro do prédio feito no dia.
11 de novembro de 2022
Rafael Martins, tenente-coronel das Forças Especiais do Exército, e Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, conversam sobre as manifestações bolsonaristas em Brasília.
Mauro Cid respondeu positivamente ao ser questionado por Rafael Martins sobre onde as manifestações deveriam ocorrer e se as Forças Armadas garantiriam a permanência dos manifestantes no local.
Cid ainda pediu que Rafael estimasse os custos - com hospedagem e alimentação inclusos - para levar mais pessoas para participarem da manifestação na Capital Federal.
12 de novembro
De acordo com a PF, os membros do grupo se reuniram para discutir o esquema de golpe de Estado na casa do ex-chefe da Casa Civil, Braga Netto. Em seguida, iniciaram o monitoramento do ministro do STF Alexandre de Moraes. Para a PF, o objetivo do encontro era apresentar e aprovar o plano.
Há registros de um grupo no WhatsApp, em que os integrantes combinam de ir à residência de Braga Netto. Além do ex-chefe da Casa Civil, a reunião contou com a presença de Mauro Cid, o major Rafael Martins de Oliveira e o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima.
“As condutas identificadas pela investigação demonstram que esse núcleo de atuação se utilizou de elevado nível de conhecimento técnico-militar para planejar, coordenar e executar ações ilícitas, as quais envolviam, inclusive, o monitoramento do Ministro ALEXANDRE DE MORAES”, afirma a investigação.
Entre os dias 21 e 23 de novembro
Integrantes do grupo do Exército vão a locais estratégicos definidos pelo plano, como a zona em que está situado o apartamento de Alexandre de Moraes.
28 de novembro
O coronel Bernardo Romão Corrêa Netto convoca reunião com militares das Forças Especiais e envia minuta de uma carta para pressionar o general Marco Antônio Freire Gomes, então comandante do Exército brasileiro.
6 de dezembro de 2022
A investigação da PF detectou “a presença concomitante dos militares Rafael de Oliveira e Mauro Cid na região do Palácio do Planalto em horário compatível com a presença do então presidente da República Jair Bolsonaro por aproximadamente 30 minutos, no local”.
Nesse mesmo dia e horário em que os três - Bolsonaro, Cid e Rafael - estiveram juntos na sede do governo, Mario Fernandes teria impresso o planejamento da operação “Punhal verde e amarelo”.
7 de dezembro
Bolsonaro apresentou ao comandante do Exército, general Freire Gomes uma minuta de decreto que constava as hipóteses de instaurar “Estado de defesa ou de sítio” e começar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). De acordo com depoimentos, Freire chegou a ameaçar Bolsonaro se seguisse com o plano de golpe adiante.
A realização do monitoramento de Alexandre de Moraes é confirmada por mensagens trocadas - no mesmo dia - entre Mauro Cid e Marcelo Câmara, então assessor da Presidência.
8 de dezembro de 2022
Neste dia, Mario Fernandes conta a Mauro Cid que conversou pessoalmente com Bolsonaro no Palácio da Alvorada e que ele teria dito: “qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro”. Registros do Palácio apontam que Fernandes esteve no prédio por pelo menos 40 minutos.
Além disso, o então presidente teria afirmado que a data de cerimônia de diplomação de Lula (12 de dezembro) - em que são dados os documentos que habilitam os eleitos a tomar posse no dia 1° de janeiro - não os limitaria.
Nas mensagens, Fernandes lamenta a Cid as "tantas oportunidades" perdidas e que haveria em breve alteração no comando das Forças Armadas.
Os investigados usavam um grupo chamado “Copa 2022” pelo aplicativo criptografado - que destrói mensagens - Signal . A Polícia Federal afirma que os números telefônicos usados pelos militares no grupo foram ativos nesse dia.
Na tentativa de impedir a identificação verdadeira dos usuários da plataforma, os prefixos telefônicos eram cadastrados com os dados de pessoas sem envolvimento no plano, segundo a PF.
Eles também usavam codinomes no grupo, para "não revelar as suas verdadeiras identidades", tais como: Alemanha, Áustria, Japão e Gana.
9 de dezembro de 2022
O general cearense Estevam Theophilo, na época à frente do Comando de Operações Terrestres (Coter), disse à PF que se reuniu com Bolsonaro neste dia no Palácio do Planalto para discutir o plano de golpe de Estado.
Segundo mensagens do celular de Mauro Cid, Theophilo teria aderido ao esquema golpista. Ele seria o responsável por acionar os “kids pretos” - militares das Forças Especiais - para garantia da execução do esquema, caso fosse decidido.
Nesta data, falas como "se Deus quiser, tudo dará certo no momento oportuno" e "nada está perdido", são proferidas por Bolsonaro aos seus apoiadores durante o seu primeiro discurso desde a derrota nas eleições.
De acordo com o relatório da PF, “no discurso, o então presidente da República sinalizou aos manifestantes que, juntamente com as Forças Armadas, iria tomar uma atitude para reverter o resultado das eleições presidenciais, para atender o ‘apelo popular’.
Entre os dias 9 e 13 de dezembro de 2022
A Polícia Federal registrou trocas de mensagens entre Mario Fernandes e os manifestantes acampados em frente aos quartéis do Exército.
As conversas incluíam pedidos de orientação à Mario Fernandes. Para a PF, as mensagens indicam que “Fernandes era o ponto focal do governo de Jair Bolsonaro com os manifestantes golpistas"
10 de dezembro de 2022
Marcelo Câmara e Mauro Cid continuam trocando mensagens que indicam o prosseguimento do monitoramento de Alexandre de Moraes.
12 de dezembro de 2022
Apoiadores radicais do então presidente Jair Bolsonaro tentam invadir o prédio da Polícia Federal após o cumprimento do mandado de prisão temporária contra o bolsonarista indígena José Acácio Tserere Xavante.
Na ocasião, os bolsonaristas bloquearam vias e incendiaram carros e ônibus em Brasília, no mesmo dia da cerimônia de diplomação de Lula e Alckmin.
13 de dezembro de 2022
O agente da PF Wladimir Matos Soares troca mensagens com o capitão do Exército e assessor da Presidência, Sergio Cordeiro, acerca da segurança de Lula.
A PF registrou o deslocamento dos celulares que compunham o grupo “Copa 2022”. Um dos quais passou por locais de “interesse da ação”, que incluía “a residência funcional do ministro Alexandre de Moraes”.
“Os investigados se deslocaram da cidade de Goiânia/GO, sede do BAC, para Brasília/DF, em pelo menos dois veículos, sendo um, do próprio RAFAEL DE OLIVEIRA, e outro, uma viatura oficial do Batalhão de Ações e Comandos”, afirma a investigação.
14 de dezembro de 2022
“Vamos oferecer a cabeça dele (Freire Gomes) aos leões”, afirmou o capitão reformado do Exército Ailton Gonçalves sugerindo “continuar a pressionar o general Freire Gomes, caso insistisse em não aderir o golpe de Estado”, comunica a investigação.
Segundo as apurações, após o comandante do Exército Freire Gomes não ter aderido ao esquema golpista, Braga Netto responde em concordância com Ailton Gonçalves e “dá a ordem: oferece a cabeça dele. Cagão".
15 de dezembro de 2022 - o Dia D
Segundo a PF, “militares Forças Especiais executaram uma ação clandestina no dia 15 de dezembro de 2022, para prender/executar o ministro Alexandre de Moraes” em Brasília, durante a Operação Copa 2022.
Cerca de seis pessoas que planejavam a morte do ministro do STF Alexandre de Moraes se situam em diversos pontos da Capital Federal.
Na noite deste dia, sob o codinome “Japão”, o major do Exército Rafael de Oliveira informou ao grupo online que está em posição. Em seguida, o codinome “Áustria" também comunica o mesmo.
De acordo com a investigação, o possível líder do grupo, de codinome “Alemanha”, envia uma notícia que indica que uma sessão judicial do Supremo Tribunal Federal havia sido encerrada mais cedo.
Logo o codinome “Áustria” pergunta: “Vai cancelar o jogo?”. O codinome “Alemanha” responde: "Abortar... Áustria volta para o local de desembarque... estamos aqui ainda...".
No dia seguinte, 16 de dezembro, seria criado o “Gabinete Institucional de Gestão da Crise”, que seria comandado pelos generais Augusto Heleno e Braga Netto.
O objetivo do “gabinete de crise” era “restabelecer a legalidade e estabilidade institucional”, “realizar segurança e participar da coordenação e fiscalização de nova eleição” e “neutralizar a capacidade de controle por parte do STF até regulamentação de decisões judiciais”.
Na mesma data, Braga Netto elogia o comandante da Marinha Almir Garnier por aderir ao golpe de Estado e orienta o capitão Ailton Gonçalves contra o comandante da aeronáutica, brigadeiro Baptista Júnior, a quem também criticou por ser contrário ao esquema golpista.
30 de dezembro de 2022
Bolsonaro sai do Brasil rumo à Flórida. Desse modo, o ex-presidente deixou implícito que não participaria da cerimônia de posse de Lula e não passaria a faixa presidencial ao petista.
1° de janeiro de 2023
Luiz Inácio Lula da Silva toma posse como novo presidente do Brasil.
8 de janeiro de 2023
Apoiadores radicais de Bolsonaro invadem e depredam as sedes dos Três Poderes em Brasília. Os golpistas vandalizaram tudo o que encontraram pela frente: vidros, móveis, obras de arte, objetos históricos. Além disso, invadiram gabinetes de políticos, rasgaram documentos e roubaram armas.