Área de litígio: estudo do Ceará aponta que Piauí avançou sobre 50 km da Serra da Ibiapaba
PGE afirma que território seria do Ceará, mas não há interesse na reivindicação desse território por parte do Estado. Procuradoria defende ainda que o território reivindicado pelo Piauí é "claramente cearense"Estudo divulgado nesta sexta-feira, 5, pela Procuradoria Geral do Estado do Ceará (PGE-CE), revelou que cerca de 50 quilômetros, em linha reta, do Estado do Piauí deveriam, em tese, pertencer ao Ceará e que a área reivindicada pelo Estado piauiense é “claramente cearense”. Apesar dos resultados, não há interesse na reivindicação desse território por parte do Ceará.
Segundo a pesquisa, a fronteira demarcada entre os estados é definida, no limite oeste, pelo sopé — parte de um relevo mais próximo do plano —, da Serra da Ibiapaba. Essa inclinação adentra, em linha reta, 40 km a 50 km no interior do Piauí e não o contrário, conforme alega o estado. A área territorial total estimada é de 3.460 km².
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“Nossa conclusão é que tudo que é elevado faz parte da Serra da Ibiapaba. Isso tem um limite oeste que é do Piauí e um leste que é no Ceará. Esse limite ocidental adentra 40 km a 50 km no interior do Piauí, ao contrário do que o Piauí tá dizendo, ele avançou nas terras cearenses”, diz Vanda Claudino Sales, uma das autoras do estudo.
Presente na divulgação, o procurador Rafael Machado de Moraes afirmou que não é do intuito do Ceará brigar por esse território em questão. A realização da pesquisa seria apenas para transparência e esclarecimento da população, que estaria “com medo”.
"O Estado do Ceará tem, como algo extremamente importante em sua defesa, o pertencimento. Nós não iremos postular o território do Estado do Piauí, porque nós entendemos que essa região do Estado do Piauí que está ocupada, e que pelos documentos da nota técnica, pertenciaram ao Estado do Ceará, estão sendo ocupados por piauienses. Nós não iriamos, diferentemente do que fez o Estado do Piauí, postular esse território", ressaltou ao O POVO.
O procurador ressaltou ainda que a estratégia de divulgar estudos, tanto os que já foram publicados como os que ainda estão em desenvolvimento, é para manter transparência e ajudar na comunicação com a população. "A Procuradoria entende que não há uma politização desse processo, mas precisamos trabalhar com absoluta transparência, as pessoas que habitam e se sentem cearenses estão aflitas, estão inseguras com relação a resolução desse litígio", ressaltou.
"O nosso papel", seguiu," é mobilizar essa população para que essa população seja ouvida. O que nós estamos discutindo não é um direito propriamente do Estado do Ceará, é o direito dessas pessoas. Elas tem que compreender a causa e se mobilizar, porque, na verdade, o que está sendo discutido não é terra, é pertencimento".
Na esteira do processo, a previsão é que no próximo mês, em maio, o Exército apresente estudo e as partes possam, ao analisar o documento, se posicionar. Conforme o procurador, não há indicativos que haja atrasos da parte dos militares.
Estudo geomorfológico
Para a estivativa do território, foram considerados mapeamento geológico-geomorfológico, imagens de satélites, fotografias aéreas, mapas históricos, trabalho de campo, além de um levantamento bibliográfico de toda produção científica já feita nesse assunto.
"Desde o período em que o Império do Brasil era composto pelos Estados do Brasil e do Maranhão, as raízes (lado ocidental) da Serra da Ibiapaba já serviam como a divisa entre o Ceará e o Piauí, situando-se esta serra em território cearense", consta o estudo.
O estudo é de autoria da professora titular visitante da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e professora aposentada da Universidade Federal do Ceará (UFC), Vanda de Claudino Sales; do professor adjunto da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e Analista de Recursos Hídricos da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (COGERH), João Sílvio Dantas de Morais; e do analista de políticas públicas do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) e membro do Grupo de Trabalho Multidisciplinar do litígio CE-PI, Cleyber Nascimento de Medeiros.
O professor João Sílvio Dantas de Morais aproveitou o espaço para rebater informações divulgadas pela Procuradoria Geral do Piauí. Em reportagem do portal Cidade Verde, Marcos Pereira da Silva, coordenador de estudos cartográficos da Secretaria de Planejamento do Piauí (Seplan-PI) e também assessor técnico do Grupo de Estudo (GT), diss que o Ceará foi além em terras do Piaupi, Rio Grande do Norte e Paraíba.
"O Ceará foi empurrando essa linha até o sopé da serra, que les dizem ser o limite entre os estados. Só que tanto o convênio arbitral de 1920 como o decreto imperial de 1880 falam que a linha primeira é o topo da serra. Se formos mapear a linha cumeeira, são mais de 6 mil km²", disse o coordenador.
O professor da UECE questionou os dados e avaliou como uma interpretação errada tanto do decreto imperial como do que seria a divisão entre os os estados. Conforme o estudo cearense, em termos de área territorial, há a estimativa de 3,4 mil km² de área do sopé ociental da Serra da Ibiapaba que hoje possuem ocupação do Piauí.
Entenda a disputa entre Ceará e Piauí pela área de litígio
Ceará e Piauí travam uma disputa secular que passa por perícia do Exército e será resolvida no Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da ação cível originária (ACO) 1.831. Tentativas de conciliação fracassaram. Ao todo, são mais de 300 anos de impasse.
Em jogo estão partes de 13 municípios do Ceará. Apopulação desses territórios que podem se tornar piauienses é estimada em 25 mil pessoas. O município mais atingido pode ser Poranga, que tem 66,3% da área atual questionada pelo Piauí. O risco é de perder dois terços do atual território poranguense.
Segundo pesquisa realizada pelo Estado do Ceará, há quatro distritos municipais e 136 localidades na área de distrito. De equipamentos públicos, são 48 escolas das redes municipais e estadual e 14 unidades de saúde estaduais e municipais. Existem ainda 589,3 km de estradas. E são 15 os locais de votação instalados pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE).
A área abrange ainda três unidades de conservação, duas estaduais e uma federal. Estão ali localizados 18 sítios arqueológicos. Existem quatro terras indígenas, cinco assentamentos rurais e quilombolas.
Confira as matérias da série de reportagens do O POVO sobre a área de litígio entre Ceará e Piauí
- Por que a disputa existe e o que está em jogo: entenda por que o Piauí considera ter direito a parte do Ceará. Como a disputa começou, há cerca de 300 anos. As histórias que o povo90 de cada estado conta. Os argumentos apresentados. Os municúipios afetados. As mudanças que já ocorreram mostradas em mapas. As consequências de uma possível mudança
- O que pensa a população da área em disputa: O POVO mostra como os moradores da área de litígio acompanham a disputa. O assunto está presente nas rodas de conversa e ninguém deixa de ter opinião. Muitos a favor de ficar do lado cearense, mas há também os que têm mais vínculo com o Piauí
- A casa dividida: a curiosa história da casa construída bem na divisa e que fica parte no Ceará, parte no Piauí. Uma espécie de ícone da disputa entre estados
- Pesquisa ouviu a opinião da população local: números divulgados pelo Grupo de Trabalho organizado pelo Governo do Ceará aponta que 87,5% dos entrevistados escolheriam pertencer ao Ceará; veja os números
- Impacto eleitoral do litígio Ceará-Piauí: área reivindicada pelos piauienses possui 15 locais de votação do Estado do Ceará
- O mapa mudou: como era o Ceará antes de trocar Crateús por parte do litoral do Piauí. Essa permuta territorial no fim do século XIX, por decreto do então imperador dom Pedro II, é o motivo da disputa com Piauí que deve ser decidida agora
- Patrimônios em disputa: área de litígio entre Ceará e Piauí inclui 3 unidades de conservação, 4 terras indígenas e 18 sítios arqueológicos
- Equipamentos públicos: Ceará tem 136 localidades, com 48 escolas e 14 unidades de saúde em área de litígio com Piauí
- Argumento no STF: Ceará apontará sentimento de "pertencimento" da população como um dos fatores na disputa jurídica contra o Piauí
- Moradores da área em disputa: comunidade quilombola está na área de litígio entre Ceará e Piauí
- Piauienses em pleno Ceará: a história de uma colônia do Piauí que se instalou no território de um município cearense
- Município mais afetado: Poranga pode perder até 66% do território para o Piauí
- Território mais disputado ainda: municípios cearenses de Carnaubal e Guaraciaba do Norte e o Estado do Piauí
- Diário de bordo: dia a dia, os bastidores de como foi a viagem do O POVO pela área em disputa entre Ceará e Piauí
Com informações da repórter Júlia Duarte
Atualizada às 16 horas
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