TRE-CE reconhece justa causa para 14 deputados e suplentes deixarem PDT sem perderem mandato
Grupo de parlamentares ligados ao senador Cid Gomes (PSB) tenta deixar o partido sem perder o mandatoO Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) reconheceu justa causa para 14 deputados estaduais do PDT, entre titulares e suplentes, desfiliarem-se do partido sem risco de perda de mandato.
A decisão, em julgamento nesta quarta-feira, 3, é favorável ao pedido dos parlamentares, aliados ao senador Cid Gomes (PSB) e ao governador Elmano de Freitas (PT), e contra a direção pedetista, ligada ao ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, ao prefeito da Capital José Sarto e ao deputado federal André Figueiredo, presidente nacional da legenda.
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Houve unanimidade em reconhecer justa causa para desfiliação. Os sete magistrados entenderam que houve grave discriminação política pessoal contra os parlamentares. Mas houve divergência sobre os demais argumentos.
A maioria dos magistrados não considerou válidas as cartas de anuência concedidas quando Cid Gomes estava na presidência da sigla.
Houve dois votos a favor da tese de mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário, inclusive do relator. Mas a maioria, de cinco votos, foi contra este argumento.
Cabem embargos no próprio TRE-CE e recurso ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O julgamento ocorre na esteira do racha interno no PDT Ceará que se arrasta desde 2022.
Deputados estaduais e suplentes que pediram liberação para se desfiliar:
- Antônio Granja
- Bruno Pedrosa
- Guilherme Bismarck
- Guilherme Landim
- Jeová Mota
- Lia Gomes
- Marcos Sobreira
- Oriel Nunes
- Osmar Baquit
- Romeu Aldigueri
- Salmito Filho
- Sérgio Aguiar
- Tin Gomes
- Helaine Coelho
O julgamento
As defesas de ambas as partes, do deputados e do PDT Nacional, fizeram as sustentações orais. A defesa dos parlamentares reforçou argumento de três pontos: 1) a obtenção de cartas de anuência; 2) a ocorrência de "grave discriminação política" e 3) a ocorrência de "mudança substancial do programa partidário".
Já o advogado da defesa do PDT contra-argumentou ponto a ponto rechaçando as alegações de perseguição política, afirmando que deputados permanecem em posições de liderança e comissões e que não houve desvio de programa por parte do partido, pedindo que o processo seja rejeitado.
Carta de anuência
O relator do caso, Rogério Feitosa Carvalho Mota, votou contra a validade das cartas de anuência para desfiliação, concedidas quando o senador Cid Gomes, hoje no PSB, era presidente do PDT Ceará. O magistrado acompanhou o parecer do Ministério Público e fez distinção em relação ao caso do deputado Evandro Leitão, presidente da Assembleia Legislativa e que teve autorização para se desfiliar.
Mota entendeu que a anuência à saída de Evandro foi dada antes de ato do PDT nacional, em reunião de 27 de outubro. As cartas de anuência foram aprovadas em 8 de novembro. A de Evandro havia sido em 25 de agosto. Assim, o relator entendeu que a concessão das cartas de anuência aos 14 deputados foi contrária à resolução da executiva nacional e, portanto, sem validade. A maioria dos desembargadores acompanhou o entendimento do relator neste ponto.
A decisão se refere ao resultado de uma reunião realizada no dia 8 de novembro, quando o Diretório do PDT Ceará, à época liderado por Cid Gomes, aprovou “pedido em massa” de cartas de anuência de parlamentares para desfiliação do partido. No mesmo dia, o comando nacional do PDT anulou todas as anuência concedidas a deputados estaduais e federais durante encontro conduzido por Cid Gomes.
O relator reafirmou que o argumento envolvendo as cartas não teria validade para justificar a desfiliação sem perda de mandato. "Entendo, neste ponto, pela inviabilidade para fins da justificativa de desfiliação partidária das cartas de anuência outorgadas já sobre a égide da resolução da executiva nacional emitida antecedentemente à confecção dos supracitados documentos".
Grave discriminação política pessoal
Porém, o relator acatou o argumento de que houve grave discriminação política pessoal. Ele cita entre os elementos a destituição do diretório estadual, sem argumento adequado, o que teria impactado os parlamentares que pedem permissão para sair.
"Entendo que há uma discriminação coletiva, o fato de ter sido emitida uma carta de anuência e depois ter sido revogada potencializou a discriminação política. Já inicio pelo final, quebrando um pouco da ansiedade de quem espera o resultado", disse o desembargador Rogerio.
E seguiu: "Quanto à discriminação e perseguição politica pessoal embora os conceitos não sejam sinônimos, as circunstâncias relatadas configuram em uníssono ambas as violações de direitos", ressaltou.
O relator pontuou que houve demonstração de perseguição e grave discriminação através de: "destituições de lideranças partidárias e ameaça de expulsão por infidelidade partidária não comprovada, e ainda a compulsória destituição de diretórios municipais de Aracati e Tamboril, liderados por dois dos autores, sem fundamentação adequada".
"Evidencia-se um ambiente hostil e discriminação política insustentável para a permanência dos autores na agremiação, fundamentando hipótese de justa causa para desfiliação sem perda de mandato", concluiu.
O entendimento deste ponto foi o único unânime entre os representantes da corte cearense.
Mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário
O relator acatou também o argumento de que houve mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário do PDT. Ele considera que a situação não se confunde com divergências internas.
O magistrado citou o rompimento político desde as eleições de 2022. Ele cita a indicação de Raimundo Gomes de Matos, filiado ao PL, para dirigir a Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), na gestão Sarto na Prefeitura de Fortaleza. Gomes de Matos havia sido em 2022 candidato a vice-governador na chapa de Capitão Wagner (União Brasil), principal opositor do grupo governista. Além de pertencer ao PL, partido de Jair Bolsonaro.
O relator citou na fundamentação que, se a legenda reviu as posições, não seria legítimo forçar os membros do partido a permanecerem. Ele reconheceu que o argumento é, até certo ponto, discutível e deixou-se aberto à complementação da decisão para chegar-se ao melhor caminho. "Entendo, a priori, que houve o desvirtuamento do programa partidário", pontuou.
No entanto, uma discussão no final, a partir do voto divergente do desembargador Daniel Carvalho, expôs novos pontos deste ponto específico, rechaçando que houve mudança substancial ou desvirtuamento do programa partidário. "Neste aspecto acompanho a divergência no sentido de entender que não houve mudança substancial", disse Daniel. A maioria dos desembargadores optou pela divergência do relator nesta questão.
Votos
Segundo a votar, Francisco Gladyson Pontes não considerou ter havido mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário, mas acatou quanto à grave discriminação política pessoal.
Mesmo entendimento teve Glêdison Marques Fernandes, terceiro a votar.
Quarto a votar, Francisco Érico Carvalho Silveira acompanhou o relator na íntegra, ao entender que houve grave discriminação política pessoal e mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário. Embora considerando que as cartas de anuência não foram válidas, ele ressaltou que o tratamento dado a elas e a forma de anulação reforça a tese de grave discriminação.
Quinto a votar, Daniel Carvalho Carneiro considerou válidas as cartas de anuência, por entender que a anulação pela executiva nacional não cumpriu requisitos estabelecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com direito a contraditório e ampla defesa. "Não foi o que houve aqui. Com, base na resolução, simplesmente se anulou", disse o magistrado.
Ele acatou ainda o argumento de grave discriminação política pessoal, mas não considerou ter havido mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário. Carneiro entendeu que, embora haja antiga aliança entre PT e PDT, não há mudança em relação a essa legislatura, pois PT e PDT já estavam em lados diferentes.
O magistrado considera que a proximidade com o União Brasil poderia configurar o desvirtuamento, mas entende não haver provas nos autos. "A simples nomeação para um cargo municipal entendo que não signifique aliança formal".
Sexto a votar, Luciano Nunes Maia Freire teve entendimento de que houve grave discriminação política pessoal, mas não acatou a tese de mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário. "O que vislumbro é uma gravíssima crise, divulgada pela imprensa e pelas redes sociais, interna partidária".
Ao encerrar a votação, o presidente do TRE-CE, Raimundo Nonato Silva Santos, votou pelo entendimento de que houve grave discriminação política pessoal, mas seguiu os que consideraram não ter havido mudança substancial e desvirtuamento do programa partidário.
Parecer do MPE
Na última segunda-feira, 1°, o Ministério Público Eleitoral (MPE), emitiu posição contrária ao pedido dos parlamentares pedetistas. O parecer foi anexado no processo que foi julgado nesta quarta-feira, 3, pelo TRE-CE.
Assinado pela procuradora regional eleitoral substituta Marina Romero de Vasconcelos, o texto analisa as alegações dos deputados, ligados ao senador Cid Gomes (PSB), para deixar o partido, segundo eles, por estarem sofrendo "perseguição e situação de desprestígio dentro do PDT”, o que teria, inclusive, impedido suas “livres atuações".
A procuradora avalia que as cartas de anuência, votadas enquanto Cid era presidente do PDT-CE, foram anuladas pela direção nacional, o que não aconteceu na desfiliação do deputado Evandro Leitão (PT). Em caso semelhante, o presidente da Assembleia Legislativa (Alece), recebeu carta de anuência, pediu desfiliação do PDT, ganhou a causa no TRE-CE e se filiou ao PT, onde hoje tenta se viabilizar candidato a prefeito.
"Isso porque, naquela ação, entendeu-se que não estava demonstrado que a carta de anuência não estava mais válida ou eficaz, seja por decisão da Justiça Comum, seja por processo de revogação partidária interna do ato, e, assim, a mesma pode (e deve) ser considerada pela Justiça Eleitoral. Aqui, toma-se o mesmo posicionamento, embora o resultado seja diverso e contrário ao pedido dos autores, considerando que as cartas de anuência apresentadas neste processo foram anuladas internamente", diz a procuradora.
Atualizada às 14 horas
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