Volta de Dirceu à cena pública tem aval de Lula e apreensão de alas do PT

Nos últimos dias, o ex-ministro fez várias articulações nos bastidores

De volta à cena política, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu quer participar de campanhas municipais estratégicas para o PT e acha que o partido precisa "repensar o seu papel" para enfrentar a "força da direita". O movimento para reabilitar Dirceu tem aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas provoca apreensão em alas do PT.

Nos últimos dias, o ex-ministro fez várias articulações nos bastidores. Almoçou com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e conversou com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

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Dirceu está preocupado com os embates entre o Congresso e o Palácio do Planalto e com o crescimento da oposição. Em entrevistas, anunciou que vai trabalhar para que o PT fique "pelo menos 12 anos no governo".

O rol dos interlocutores políticos de Dirceu também inclui o ex-presidente José Sarney e o senador Renan Calheiros (AL), ambos do MDB.

Estão na lista, ainda, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), o governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), e o ex-chanceler Aloysio Nunes (PSDB).

Justiça

Desde que foi condenado e preso três vezes, no rastro dos processos do mensalão e da Lava Jato, Dirceu está inelegível. No mês passado, porém, a defesa do ex-ministro, comandada pelo advogado Roberto Podval, entrou com petição no Supremo Tribunal Federal (STF) para anular todas as suas condenações na Lava Jato. O caso está com o ministro Gilmar Mendes.

A defesa pede que o magistrado estenda para Dirceu os efeitos da decisão que beneficiou Lula, após virem à tona, na Operação Spoofing, mensagens entre procuradores, como Deltan Dallagnol, e o ex-juiz Sérgio Moro, hoje senador pelo União Brasil.

Moro enfrenta ação para cassar o seu mandato e, se a Justiça Eleitoral julgar que ele praticou abuso de poder econômico, pode ficar inelegível.

Diante dessa reviravolta e do desgaste da Lava Jato, Dirceu está confiante numa vitória jurídica. Se o STF acatar os argumentos de sua defesa, o ex-poderoso chefe da Casa Civil estará apto a disputar as eleições de 2026.

Uma de suas ideias é retornar à Câmara, de onde foi defenestrado em 2005, acusado de ser o mentor do mensalão.

Movimentação

O ex-ministro disse que pretende ajudar o governo e o PT, mas na retaguarda. "Neste ano, participarei da campanha como cidadão e militante nas cidades que o diretório regional definir como prioritárias", afirmou.

Na prática, porém, tem auxiliado na montagem de alianças. O ex-presidente do PT foi um dos que conversaram com Marta Suplicy antes de ela aceitar o convite de Lula para retornar ao partido e ser vice na chapa de Guilherme Boulos (PSOL) na disputa pela Prefeitura de São Paulo.

Dirceu avalia que ganhar São Paulo é fundamental na luta contra o fortalecimento do Centrão e do bolsonarismo.

Nas eleições municipais de 2020, o PT foi um fiasco nas urnas: em todo o Estado, o partido conquistou apenas quatro prefeituras. Além disso, não venceu em nenhuma capital do País.

No ato de filiação de Marta, na sexta-feira, Lula cobrou a cúpula petista pelos resultados daquele ano.

O ex-ministro concorda e começou a liderar o coro dos que pedem mudanças no PT. Ele ainda prega um segundo mandato para Lula, mas, questionado sobre os próprios planos, desconversa.

"Decisão sobre meu futuro político só no segundo semestre de 2025, após consulta à direção do PT e ao Lula, e dependendo da situação política e da conjuntura", disse Dirceu ao Estadão. "Não necessariamente serei candidato."

O apoio do ex-titular da Casa Civil à política econômica de Haddad, após resolução do PT assinalar que "o Brasil precisa se libertar do austericídio fiscal", escancarou o confronto entre ele e a presidente da sigla, Gleisi Hoffmann. "É quase uma covardia nós não darmos apoio total (a Haddad) para aprovar todas as medidas que ele queria", alfinetou Dirceu em um podcast do PT baiano.

"A palavra do Zé Dirceu é importante para apoiar a política econômica do Haddad", avaliou Aloysio Nunes, que hoje preside a São Paulo Negócios, agência vinculada à Prefeitura. "Ele tem autoridade para isso."

Saia-justa

A estratégia de Dirceu provoca desconforto em aliados de Gleisi. A portas fechadas, alegam que o ex-ministro põe o PT em saia-justa, como às vésperas do primeiro turno da eleição de 2018, quando, em entrevista ao El País, afirmou: "É uma questão de tempo para a gente tomar o poder". À época, Haddad era candidato ao Planalto e teve de contornar a situação.

No diagnóstico de Dirceu, "a direita está ganhando a disputa política" e o PT precisa reagir. "As mudanças no mundo e no Brasil exigem que façamos frente à força da direita. Depois de anos de repressão política e jurídica, é necessário o PT repensar o seu papel", argumentou ele, ao destacar a importância da próxima disputa para a presidência do partido, em 2025.

A quem pergunta se fala frequentemente com Lula, Dirceu responde, enigmático: "O presidente sabe o que eu penso e eu sei o que ele pensa". Mas o que isso quer dizer? "Quando ele quer me procurar, sabe onde estou." E conclui: "Eu saí do governo, mas o governo não sai de mim."

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