Moraes sobre 8/1: "Um dos planos era me prender e enforcar após o golpe"
As declarações de Moraes foram dadas na estreia de uma série de entrevistas e reportagens do Globo sobre os ataques golpistas realizados em 8 de janeiro de 2023O relator das investigações sobre a intentona golpista de 8 de janeiro e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, afirmou durante entrevista ao O Globo que a apuração acerca dos ataques revelou três planos contra ele, que envolviam até homicídio.
As declarações de Moraes foram dadas na estreia de uma série de entrevistas e reportagens sobre os ataques golpistas realizados em 8 de janeiro de 2023, que completam um ano na próxima segunda-feira.
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“Eram três planos. O primeiro previa que as Forças Especiais (do Exército) me prenderiam em um domingo e me levariam para Goiânia. No segundo, se livrariam do corpo no meio do caminho pra Goiânia. Aí, não seria propriamente uma prisão, mas um homicídio. E o terceiro, de uns mais exaltados, defendia que, após o golpe, eu deveria ser preso e enforcado na Praça dos Três Poderes. Para sentir o nível de agressividade e ódio dessas pessoas, que não sabem diferenciar a pessoa física da instituição”, revelou na entrevista.
De acordo com o magistrado, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), após Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ser empossado como presidente, Moraes viajou para a Europa com a família.
No dia 8 de janeiro, o filho do magistrado “mostrou imagens de pessoas invadindo o Congresso”. Na ocasião, os manifestantes bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.
“Liguei imediatamente para o ministro Flávio Dino (Justiça). Perguntei a ele como tinham entrado, porque havia ocorrido uma reunião de órgãos de segurança em que tinha ficado proibida a entrada de manifestantes na Esplanada dos Ministérios. Num determinado momento, o presidente também falou comigo. Ele e o Dino conversaram sobre a possibilidade de uma intervenção federal ou GLO (Garantia da Lei e da Ordem)”, relembrou Moraes.
Confira a íntegra da entrevista completa
Onde o senhor estava no dia 8 de janeiro?
Após a posse do presidente Lula, viajei com a minha família para a Europa e estava em Paris dia 8 de janeiro. Meu filho me mostrou imagens de pessoas invadindo o Congresso. Liguei imediatamente para o ministro Flávio Dino (Justiça). Perguntei a ele como tinham entrado, porque havia ocorrido uma reunião de órgãos de segurança em que tinha ficado proibida a entrada de manifestantes na Esplanada dos Ministérios. Num determinado momento, o presidente também falou comigo. Ele e o Dino conversaram sobre a possibilidade de intervenção federal ou GLO (Garantia da Lei e da Ordem). Quem decidiu foi o Poder Executivo, mas eu relembrei que no tempo do presidente (Michel) Temer, houve a possibilidade de intervenção só na área da segurança, e talvez isso fosse melhor.
O que o senhor fez?
O que chocava era a inação da Polícia Militar. Fui secretário de Segurança Pública em São Paulo e ministro da Justiça. Afirmo sem medo de errar: não precisaria de cem homens do Batalhão de Choque para dispersar aquilo. O que precisávamos ver era qual gravidade e a sequência. Fiquei aguardando a provocação da Polícia Federal e da Advocacia-Geral da União (AGU) para decidir (no inquérito). Achei importante três decisões: as prisões do então secretário (Anderson Torres) e do comandante geral da Polícia Militar (Fábio Augusto Vieira), para evitar efeito dominó em outros estados. Eu me certifiquei que as demais polícias militares estavam tranquilas, mas não podíamos arriscar. Ao mesmo tempo, o afastamento do governador (Ibaneis Rocha), para evitar que pudesse ocorrer algo extremista em outros estados, eventualmente outro governador apoiar movimento golpista. E a determinação de prisão em flagrante imediata de quem permanecesse em frente a quartéis pedindo golpe.
O que poderia ter acontecido?
Se tivéssemos deixado mais pessoas em frente a quartéis (no dia seguinte), poderia gerar mais violência, com mortes e distúrbios civis no país todo. Se não houvesse a demonstração clara e inequívoca de que o Supremo Tribunal Federal não iria admitir nenhum tipo de golpe, afastaria qualquer governador que aderisse e prenderia os comandantes de eventuais forças públicas que aderissem, poderíamos ter um efeito dominó que geraria caos no país.
Havia os acampamentos nos quartéis e outros episódios de violência, como a tentativa de atentado a bomba nos arredores do aeroporto de Brasília. Era possível prever o que houve?
"Foi um erro muito grande das autoridades deixar, durante o ano passado, aquelas pessoas permanecerem na frente dos quartéis. Isso é crime e agora não há mais dúvida disso. O Supremo Tribunal Federal recebeu mais de 1.200 denúncias contra quem estava acampado pedindo golpe militar, tortura e perseguição de adversários políticos.
No dia do segundo turno, também tivemos um problema grave com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), objeto de inquérito, que inclusive gerou a prisão do ex-diretor (Silvinei Vasques).Houve a greve dos caminhões tentando parar o país. A violência estava numa crescente. No dia da diplomação, 12 de dezembro de 2022, houve prisões após a (tentativa de) invasão da Polícia Federal.
Como na posse não houve nada, infelizmente as pessoas da área de segurança talvez tenham ficado mais otimistas. O grande erro doloso foi permitir a entrada (dos golpistas) na Esplanada dos Ministérios. O 8 de Janeiro foi o ápice do movimento: a tentativa final de se reverter o resultado legítimo das urnas".