Caso Abin: PF apura se agência produziu dossiê sobre adversários de Bolsonaro

A investigação se dá por meio da Operação Última Milha, que apura a suspeita de uso indevido do software de espionagem FirstMile por servidores durante o governo Bolsonaro

15:00 | Nov. 03, 2023

Por: Luíza Vieira
PF deflagrou operação contra pessoas ligadas ao grupo terrorista Hezbollah (foto: Divulgação/Polícia Federal)

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) está na mira de investigação da Polícia Federal, que apura se a agência elaborou documentos com informações de adversários políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), durante a gestão dele.

A investigação se dá por meio da Operação Última Milha, que apura a suspeita de uso indevido do software de espionagem FirstMile por servidores durante o governo Bolsonaro. A PF analisa se a Abin produziu dossiês com base nos dados obtidos pelo software em combinação com outros equipamentos da agência.

Dois servidores da Abin informaram ao portal UOL que tiveram conhecimento da elaboração dos relatório, cujos alvos eram membros do PT e do PCdoB. Um dos documentos que foram produzidos na gestão de Alexandre Ramagem na Abin, tinha como foco um dos atuais ministros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O portal também teve acesso a dois desses documentos. Um deles possui quatro páginas, enquanto o segundo possui cinco.

Ambos não estão timbrados. Conforme os agentes da Abin, isso seria proposital, uma vez que foram elaborados sem justificativa, com desvio de finalidade e em meio a outros solicitados legalmente pela Casa Civil do governo Bolsonaro durante a gestão do general Braga Netto.

O ministro em questão é inicialmente qualificado com os dados pessoais, como CPF e data de nascimento.

Além disso, o dossiê consta se o alvo tem dívida ativa com a União, traz um resumo dos processos na Justiça Eleitoral, no Tribunal de Contas da União (TCU) e no Supremo Tribunal Federal (STF), bem como uma análise sobre doações de campanha e escândalos com a imprensa.

Os agentes da Abin relataram ainda que, esse primeiro documento seria elaborado com ferramentas internas para o rastreio em fontes abertas, que seria mais sutil, e posteriormente, repassado ao Palácio do Planalto.

A PF investiga uma possível combinação de equipamentos na Abin para a produção dos dossiês utilizando tanto dados abertos, como as informações coletadas por meio do FirstMile, por exemplo.
De acordo com a Polícia Federal, o software israelense, comercializado pela empresa Cognyte, foi usado sem autorização da Justiça para espionar integrantes do Judiciário, jornalistas e adversários de Bolsonaro entre 2019 e 2021.

Em nota, Alexandre Ramagem informou que promoveu apuração interna para sanar as irregularidades.

"Essas ferramentas eram de uso e gestão exclusiva do departamento de operações. Nossas correições é que demonstraram e impuseram, inclusive com corregedoria, aprimoramento de controle para não haver irregularidades. Fizemos controle de conformidade com servidores da CGU [Controladoria-Geral da União], exoneramos o chefe do departamento e encaminhamos a análise do contrato e procedimentos à corregedoria", afirmou o ex-diretor da Abin.

O Software israelense

A PF identificou que o sistema teria sido utilizado contra a imprensa, políticos e adversários de Bolsonaro. Conforme a investigação, a suspeita é que servidores da Abin teriam usado o software de geolocalização para invadir “reiterada vezes” a rede de telefonia para acessar os dados de localização dos alvos.

Uma ação administrativa disciplinar chegou a ser aberta internamente para investigar o comportamento desses dois servidores. De acordo com a PF, ambos os investigados e agora presos teriam “utilizado o conhecimento sobre o uso indevido do sistema como meio de coerção indireta para evitar a demissão”.

A Agência aderiu ao software de monitoramento de localização de celulares em 2018, no fim da gestão de Michel Temer, por R$ 5,7 milhões e sem licitação.

O equipamento, intitulado FirstMile, permite o rastreamento dos dados de GPS de qualquer pessoa pelos dados transferidos de seu celular para torres de telecomunicação.

O software permite realizar consultas de até 10 mil celulares a cada 12 meses. Era possível, ainda, criar alertas em tempo real, para informar quando um dos alvos se movia para outras regiões. Para iniciar o rastreio, bastava digitar o número de celular da pessoa.

O programa cria um histórico de deslocamentos e permite a criação de "alertas em tempo real" da movimentação de alvos em diferentes endereços.

O software foi comprado por R$ 5,7 milhões da israelense Cognyte, com dispensa de licitação, no final do governo Michel Temer (MDB). A ferramenta foi usada pelo governo Bolsonaro até meados de 2021.

A Abin

Implantada no ano de 1999, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tem por objetivo principal fornecer análises estratégicas e dados de interesse nacional. O setor é vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

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