Legítima defesa da honra: o que é e por que o STF invalidou a tese

Conforme a decisão, a tese não poderá ser utilizada por advogados, policiais e juízes para absolver acusados de feminicídio durante julgamentos em tribunal de júri

16:01 | Ago. 02, 2023

Por: Luíza Vieira
Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal - STF (foto: Marcello Casal JrAgência Brasil)

O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, nesta terça-feria, 1°, a análise do processo que invalida a tese de legítima defesa da honra, utilizada para justificar um assassinato ou agressão caso a conduta da vítima difamasse a honra do agressor. O argumento era usado em caso de adultério, por exemplo, e usado para justificar feminicídios. 

Mais informações ao vivo:

 

Conforme a decisão, a tese não poderá ser utilizada por advogados, policiais e juízes para absolver acusados de feminicídio durante julgamentos em tribunal de júri.

O voto do ministro do STF e relator do caso, Dias Toffoli, foi seguido por unanimidade. Ele argumentou que a tese é inconstitucional, uma vez que contraria os princípios da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.

Em 2021 durante julgamento virtual, a Corte já havia decidido suspender, até o julgamento definitivo da ação, o uso da tese por advogados de réus em júri popular. Na ocasião, Toffoli votou contra o uso da justificativa, e foi seguido por André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin.

A ação foi movida pelo PDT, que sinalizou que tribunais de justiça alternam entre anular e validar vereditos de tribunais do júri em que réus por feminicídios são absolvidos com base na tese.

A presidente da Corte, Rosa Weber, justificou que a tese não é compatível com uma sociedade “democrática, livre, justa e solidária”. "Simplesmente não há espaço, no contexto de uma sociedade democrática, livre, justa e solidária, fundada no primado da dignidade da pessoa humana, para restauração dos costumes medievais e desumanos do passado", afirmou.

A ministra Cármen Lúcia também se pronunciou acerca do tema, citando as leis da época do Brasil Colônia, que autorizavam que os homens tivessem poder sob o corpo e vida da mulher. Argumentou que, ainda nos dias atuais, as mulheres continuam a ser tratadas como “coisas” e que, nesta situação, devem “se submeter ao poder e mando de alguém”.

Cármen acrescentou ainda que o assunto dialoga com a questão da dignidade humana em “uma sociedade que ainda hoje é machista, sexista, misógina e mata mulheres apenas porque elas querem ser o que elas são, mulheres donas de sua vida”.

Caso Ângela Diniz

Ao votar, a ministra Cármen Lúcia citou, indiretamente, o caso da socialite Ângela Diniz, que foi assassinada por Doca Street. À época, Doca era companheiro de Ângela, ambos teriam terminado o relacionamento pouco antes do crime.

Em dezembro de 1976, Doca matou Ângela com quatro tiros no rosto durante uma briga do casal em Búzios, no Rio de Janeiro, onde a socialite tinha uma propriedade na Praia dos Ossos. No período, Doca alegou “legítima defesa da honra”, e disse ter matado Ângela “por amor”. Chegou a ser absolvido, mas após protestos de grupos feministas, foi novamente julgado e condenado à prisão.