Com 2 meses de férias por ano, juízes federais cobram folga extra de 3 meses
Juízes estaduais e desembargadores já recebem as "férias-prêmio", concedido a cada cinco anos. Benefício pode ser vendido
13:21 | Jul. 19, 2023
A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) acionou a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, para pedir "julgamento imediato" da ação que pode garantir a magistrados de todo o País a chamada licença-prêmio: três meses de férias já concedidos a juízes e desembargadores dos tribunais estaduais a cada cinco anos, com a possibilidade de "venda" do período — ocasião em que eles embolsam os subsídios correspondentes.
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Em busca da licença-prêmio, os magistrados federais já têm direito — a exemplo dos colegas estaduais — a dois meses de férias por ano, conforme previsão da Lei Orgânica da Magistratura, em vigor desde 1979 (Governo do general João Figueiredo).
Caso não usufruam do descanso, os magistrados estaduais podem 'vender' o período para seus respectivos tribunais, o que acaba estourando em muito o teto do funcionalismo. Nos últimos seis anos os tribunais gastaram ao menos R$ 3,5 bilhões com a "compra" de férias de juízes e desembargadores estaduais.
As férias duplas dos magistrados, garantidas há 44 anos pelo regime de exceção, já foram questionadas publicamente pelo ministro Gilmar Mendes, do STF. Em maio, ele bradou 'acabem com as férias de dois meses', após o que considerou uma tentativa de magistrados de retardarem o julgamento sobre o modelo de condução de processos pelo 'juiz de garantias'.
Agora, os juízes federais recorrem à Corte máxima para que ela decida com urgência sobre a possibilidade de também receberem as férias-prêmio - seguindo a rotina de privilégios dos estaduais.
A toga federal alega que o tema é de 'extrema importância para a magistratura nacional'. Os magistrados federais pleiteiam o benefício alegando que também promotores de Justiça e procuradores do Ministério Público recebem a 'licença-prêmio'.
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Eles pedem que o Supremo declare a 'simetria integral' entre a magistratura nacional e o MP. Argumentam que essa banda da toga e do Ministério Público 'não pode estar sujeita a regime mais favorável do que as demais carreiras do serviço público'.
O presidente da Associação dos Juízes Federais, Nelson Alves, afirmou que o pronunciamento do Supremo sobre o tema vai 'reconhecer a efetiva posição da magistratura dentro do cenário remuneratório do serviço público'.
"A Constituição Federal estipula que o teto constitucional toma por base o Poder Judiciário (STF). Além disso, a Constituição também estipula que deve haver simetria entre Magistratura e MP, conforme o CNJ já decidiu desde 2011. Assim, os juízes federais aguardam o reconhecimento dessa situação também pelo STF, devendo ser a magistratura o paradigma remuneratório dentro das carreiras jurídicas", frisa Nelson Alves.
O pedido para que o tema retorne à pauta do Supremo foi encampado pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). A entidade sustenta que o tema já esteve liberado para julgamento várias vezes.
O caso foi retirado da lista de discussão da Corte máxima cinco vezes. As manifestações da Ajufe e da Anamatra aportaram no Supremo às vésperas do recesso judiciário, nos dias 26 e 27 de julho últimos.
Desde o dia 1º a Corte opera em regime de plantão - só para decisões urgentes. Neste período, quem responde pelo STF é a presidente, Rosa Weber. Mesmo com a pausa, alguns ministros do STF seguem trabalhando, entre eles o relator da ação que inquieta a magistratura federal, ministro Alexandre de Moraes. Nem ele, nem Rosa, até o momento, se manifestaram sobre as solicitações dos juízes federais e trabalhistas.
Os pedidos foram protocolados no bojo de uma ação que tramita no STF desde julho de 2017. Em outubro do mesmo ano, o Supremo reconheceu a repercussão geral do tema - ou seja, a decisão da Corte máxima vai valer para todos os magistrados do País.
Um mês depois, em novembro de 2017, Alexandre de Moraes decretou a suspensão de todas as 'demandas pendentes' que tratem das férias-prêmio no País. Tal medida é tomada em todos os processos que a Corte reconheça a repercussão-geral.
Em 2018, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge, antecessora de Augusto Aras na chefia do Ministério Público Federal, deu parecer alinhado aos interesses dos magistrados - e também sem bater de frente com o privilégio que já é garantido ao MP.
Na época, Dodge argumentou que o caso não tratava de 'aumento de vencimentos', mas de 'isonomia' e da aproximação entre os 'regimes jurídicos' das carreiras da magistratura e do MP.
"Inegável a simetria entre os regimes do Ministério Público e da Magistratura deve se estender também, em reverência à lógica constitucional, ao plano das vantagens funcionais atribuídas às referidas carreiras", ressaltou a procuradora.
A polêmica sobre as 'férias-prêmio' de juízes parte de um caso específico, o de um desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região, em Alagoas. Em 2016 ele entrou com uma Reclamação na Corte máxima alegando 'adquirido direito' às férias-prêmio relativas a 2011, quando completou cinco anos naquela Corte regional.
No entanto, ainda de acordo com o desembargador, o tribunal 'nega reconhecer' o benefício. O magistrado sustenta que seu direito ao prêmio de três meses de férias está ligado a uma decisão do Conselho Nacional de Justiça que, em 2011, reconheceu a simetria entre as carreiras do MP e do Judiciário.
O benefício que o juiz visa obter é previsto no Estatuto do Ministério Público da União, para as carreiras do órgão. Na Lei Orgânica da Magistratura, em vigor desde 1979, não há menção ao penduricalho.
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Juízes também querem garantir adicional por tempo de serviço e reclamam de "castas" na magistratura
Dias antes de acionar o STF em busca da retomada do julgamento sobre a licença-prêmio, a Associação de Juízes Federais acionou a Corte máxima para garantir o pagamento de quase R$ 1 bilhão em penduricalhos aos magistrados. A entidade questiona uma decisão do TCU que barrou os repasses retroativos do Adicional por Tempo de Serviço (ATS).
Além da movimentação no STF, os juízes preparam mobilização nacional contra o que chamam de 'ausência de unicidade' da magistratura. Eles dizem que juízes e desembargadores estaduais têm 'vantagens bem superiores' e argumentam que a situação cria 'castas' na classe. Pregam que todos devem ter 'idêntica remuneração, porquanto prestam o mesmo serviço à população'.
O juiz federal Nelson Alves - presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe) - aponta que o pedido para decisão sobre a 'licença-prêmio' é um dos pilares da mobilização da categoria, junto do 'respeito à independência dos juízes, a declaração de inconstitucionalidade da PEC dos precatórios, e a efetiva aplicação do princípio da unicidade da magistratura nacional'.
Nelson Alves ressalta que seus pares querem que 'não haja diferenças remuneratórias entre as magistraturas estaduais e a da União'.