Julgamento de Bolsonaro no TSE: como ministros justificam votos
Confira a expectativa sobre os votos que faltam no julgamento que pode deixar o ex-presidente inelegívelO ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nesta sexta-feira, 30 de junho (30/06) e está inelegível. A decisão foi por 5 votos a 2. A maioria foi formada com voto da ministra Cármen Lúcia.
Votaram, pela inelegibilidade: Benedito Gonçalves, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes.
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Contra a inelegibilidade de Bolsonaro votaram o ministro cearense Raul Araújo e também Nunes Marques.
Confira os argumentos dos ministros ao votar:
Benedito Gonçalves, relator
Corregedor-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Benedito Gonçalves, votou para tornar Bolsonaro inelegível pelos próximos oito anos, a contar de 2022. O magistrado disse que há evidências de que Bolsonaro cometeu crime de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação na reunião com embaixadores realizada no Palácio do Alvorada, em 18 de julho de 2022, quando o então presidente levantou, sem provas, suspeitas sobre o sistema eleitoral e a parcialidade de magistrados.
Segundo Gonçalves, a conduta do ex-presidente viola a normalidade democrática ao questionar o processo de votação e levantar questionamentos sobre a integridade de autoridades do Judiciário. "(As palavras de Bolsonaro) esgarçam a normalidade democrática e isonomia ao propor cruzada contra inexistente conspiração para fraudar eleições. A recusa de valor ao conhecimento técnico a respeito das urnas e recusa a autoridade do TSE foram usadas como ferramenta de engajamento (de eleitores), afirmou o ministro em seu voto.
O ministro pontuou que o ex-presidente cometeu "desvio de finalidade" ao usar a TV Brasil para transmitir a reunião para "reverberar falsa denúncia de fraude". Ele lembrou que, àquela altura, o deputado estadual pelo Paraná, Fernando Franceschini, teve mandato cassado pelo TSE por difundir informações falsas sobre o sistema eleitoral nas eleições de 2018.
"Não foi realizada apenas uma live, houve transmissão de evento de caráter oficial, marcado por desvio de finalidade. (A transmissão) ocorreu somente nas redes do investigado, mas em emissora pública, reverberou falsa denúncia de fraude que a essa altura já havia levado à cassação de deputado federal. O fato ocorreu a menos de 3 meses da eleição e serviu para alinhavar prática nefasta que foi levada adiante durante campanha", destacou o magistrado.
O desvio de finalidade, de acordo com o relator, não se limitou ao uso de bens e serviços públicos na reunião com embaixadores. "O que torna o evento no Palácio do Alvorada um evento aberrante foi o poder simbólico de presidente da Republica e da posição de chefe de Estado para degradar ambiente eleitoral", reforçou.
Ainda segundo o relator, os ataques de Bolsonaro levam à "banalização do golpismo" e fizeram um "apelo rude para que comunidade internacional não desse ouvidos ao TSE".
Gonçalves finalizou o voto com uma defesa enfática da Justiça Eleitoral. "O TSE se manterá firme em seu dever de transmitir informações verídicas e atuar para conter o alastramento de desinformação", afirmou. "Agressões violentas à Justiça Eleitoral confirmam a importância da instituição para salvaguarda da democracia", prosseguiu.
Gonçalves, no entanto, pediu a absolvição do general Walter Braga Netto, candidato a vice do ex-presidente nas últimas eleições.
Raul Araújo
Primeiro a votar após o relator, o ministro cearense Raul Araújo se manifestou contra a inelegibilidade do ex-presidente.
Araújo defendeu que a Justiça Eleitoral deve atuar com "intervenção mínima" e afirmou que o discurso de Bolsonaro não teve efeitos na eleição, citando dados de comparecimento recorde às urnas e abstenção dentro da média. "O conteúdo do discurso surtiu pouco efeito quanto ao suposto intento de deslegitimar as urnas, do contrário se teria verificado diminuição dos eleitores", afirmou.
O ministro descartou a prática de abuso de poder político e uso abusivo dos meios de comunicação. Para ele, a reunião com embaixadores foi um "ato solene cujo protagonista foi o presidente, tendo como ouvinte embaixadores, o que justifica atuação da empresa pública". A reunião com embaixadores de julho de 2022, objeto da acusação, foi transmitida pela TV Brasil.
"Debater a qualificação da reprodução da reunião como desvio de finalidade só tem sentido se for considerada abusiva e grave a própria reunião transmitida, o que já foi afastado", afirmou.
O ministro usou parte considerável do seu voto para argumentar que a minuta do golpe não poderia ser utilizada como prova para condenar o ex-presidente. Araújo defendeu que o documento foi encontrado e anexado aos autos depois das eleições e, por isso, não é possível dizer que teve influência no pleito.
"A possibilidade de utilização de fatos anteriores, todavia, não encontra ecos nos fatos futuros, posteriores à eleição e à diplomação. Se a vinculação entre o evento abusivo e a eleição é um critério finalístico, é evidentemente possível que atos anteriores repercutam no pleito. Em uma constatação lógica, fatos e circunstâncias em fatos incontroversamente posteriores às eleições não podem ter o condão de influenciar o já ocorrido", afirmou Araújo.
"Tais atos não poderiam ser base para aferição da gravidade do ato tido como abusivo, pois os eventos posteriores são incapazes de vulnerar os bens jurídicos normalizados e a legitimidade do pleito de 2022", reforçou o ministro. Araújo citou ainda decisão do TSE no julgamento da chapa Dilma e Temer em setembro de 2018 para recusar a ampliação da demanda com a inclusão da minuta. A tese vem sendo usada pela defesa de Bolsonaro.
O argumento de Araújo foi questionado pela ministra Cármen Lúcia, que ponderou que a minuta do golpe não foi objeto do voto do relator do processo, Benedito Gonçalves. "Não me pareceu que no voto do ministro relator houvesse nenhuma referência a este documento, nem de autoria nem de responsabilidade do primeiro investigado (Bolsonaro). Eu, no meu voto, nem uso este dado", afirmou.
Gonçalves confirmou o argumento da ministra e explicou o teor do seu voto. "Não se está apurando aqui a minuta. (Meu voto) Foi um reflexo da conclusão, dos efeitos do discurso do efeito da reunião que se apura, no tocante à inverdade das urnas eletrônicas", ponderou. "Houve sim no voto do relator farta referência não só a esse achado, como a outros fatos posteriores, como caracterizadores", respondeu.
Floriano de Azevedo Marques
O ministro Floriano Azevedo Marques votou pela inelegibilidade do ex-presidente. Ele acompanhou o relator, Benedito Gonçalves, para condenar Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Ele também defendeu que o candidato a vice na chapa de Bolsonaro, Braga Netto, deve ser absolvido.
O ministro indicado à Corte no mês passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que, se o "manejo da língua não é o forte", Bolsonaro não deveria "se arvorar a discursar sobre um tema tão grave,com tão frágeis bases, diante de diplomatas estrangeiros, aviltando a pátria e constrangendo a República".
Marques destacou o caráter eleitoral do evento realizado no Palácio do Alvorada e a falta de participação do Itamaraty e da Casa Civil.
O ministro viu desvio de finalidade na conduta de Bolsonaro ao confundir as "personas" de governante e candidato e empregar o aparato presidencial em benefício próprio.
Ele lembrou que Bolsonaro já foi multado por propaganda eleitoral irregular em razão da reunião com embaixadores. Para o ministro, a condenação anterior devido ao uso de bens públicos e da comunicação oficial da EBC "é mais uma razão para que se aplique a sanção da inelegibilidade".
O ministro apresentou pontos que marcam a estratégia eleitoral do discurso na reunião com embaixadores, como o conteúdo autopromocional, as críticas ao seu adversário, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a deslegitimação dos juízes e a busca de empatia eleitoral.
"Tivesse o primeiro investigado (Bolsonaro) se comportado de acordo com os cânones já assentados pela Justiça Eleitoral, deveria ter se abstido, desde sempre, de adentrar no debate sobre o processo eleitoral, sua apresentação como candidato e os resultados esperados para o pleito".
Marques discordou do ministro Raul Araújo, que votou contra a inelegibilidade por não ver gravidade na conduta de Bolsonaro. Ao contrário de Araújo, o ministro destacou que a configuração do ato abusivo deve considerar sua potencialidade, e não as consequências. "Se a Justiça Eleitoral agiu bem, agiu rápido, e coibiu efeitos da tentativa, não é disso que estamos falando", afirmou.
Para ele, a gravidade se dá em razão do "aviltamento da República à luz da comunidade internacional" por parte de um chefe de Estado que "deve se pautar pela soberania e defesa intransigente dos valores nacionais".
Marques também defendeu a inclusão da minuta do golpe no rol de provas da ação, mas ponderou que o foco do julgamento é a reunião com embaixadores. "Nós estamos analisando o evento como tal, e não o que aconteceu depois", disse.
André Ramos Tavares
O ministro deu o terceiro voto pela inelegibilidade do ex-presidente. Tavares acompanhou o relator do caso, Benedito Gonçalves, para condenar Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Ele também defendeu que o candidato a vice na chapa de Bolsonaro, o general Walter Braga Netto, seja absolvido.
Tavares destacou o "inequívoco caráter eleitoral" do evento e disse que Bolsonaro usou o encontro para propagar "invenções, distorções severas da realidade, dos fatos e dos dados empíricos" sobre a condução do processo eleitoral.
"O foco do discurso são ataques comprovadamente infundados e falsos contra urna eletrônica, contra o processo e Justiça Eleitoral. (Há) Inequívoca falsidade perpetrada neste ato comunicacional, (...) chegando a se caracterizar, no final, uma narrativa delirante com efeitos nefastos na democracia, no processo eleitoral, na crença popular em conspirações acerca do sistema de apuração dos votos", defendeu o ministro.
Tavares argumentou que a reunião não é um fato isolado, mas mostra uma "verdadeira concatenação estratégica ao longo do tempo com finalidades eleitoreiras". O ministro disse ainda que é "grave que estado de desordem informacional se instale na sociedade". "É ainda mais grave se (desordem vier de) discurso do presidente da República", ressaltou. Ele defendeu ainda que o contexto dos ataques ao sistema eleitoral feitos por Bolsonaro na reunião não pode ser "ignorado ou desprezado" na análise do caso pela Justiça Eleitoral.
Cármen Lúcia
A ministra Cármen Lúcia seguiu o relator, Benedito Gonçalves, a favor da condenação por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, formando a maioria da Corte contra o ex-presidente
Ela destacou que o que está em análise no julgamento "não é um filme, o que está em apreciação é a cena", em referência à reunião de Bolsonaro com embaixadores realizada no Palácio do Alvorada em julho de 2022. "É aquilo que aconteceu e sobre o qual não se converte nos autos", acrescentou.
Segundo ela, a Constituição brasileira estabelece que a normalidade e a legitimidade das eleições devem ser protegidas em relação ao abuso de cargo e função pública, além dos meios de comunicação.
Kassio Nunes Marques
O ministro avaliou que a atuação do então presidente na reunião com embaixadores não teve como objetivo obter vantagens no pleito, tampouco fazer parte de uma tentativa concreta de desacreditar o resultado das eleições. Para Nunes Marques, ainda que se considere a reunião como ato ilícito, não pareceu a ele capaz de alterar o resultado nem a normalidade das eleições, mas apenas a gravidade das circunstâncias que caracterizou o mandato do ex-presidente.
"Não identifico gravidade necessária para condenar Bolsonaro", declarou o ministro.
Apesar disso, o ministro pontuou que "não há dúvidas que a prática discursiva" de Bolsonaro, durante o encontro com embaixadores, se orientou para "difundir suspeitas graves e infundadas acerca da atuação do Tribunal Superior Eleitoral e sistema de votação". Para ele, a reunião mostrou "nítida" finalidade eleitoral, tanto no discurso do então presidente quanto no perfil do evento.
Ao votar contra a inelegibilidade do ex-presidente, Nunes Marques repetiu o argumento do ministro Raul Araújo, que até então havia sido o único magistrado a votar contra a inelegibilidade, sobre comparecimento às urnas. Segundo ele, houve a percepção de que a segurança do sistema eletrônico de votação subiu.
"Não encontro, em suma, ainda que considere valoração qualitativa feita pelo relator, desequilíbrio da disputa", afirmou. Segundo ele, após a derrota nas eleições, Bolsonaro não manifestou reconhecimento explícito do resultado, mas também não questionou a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. "Não há nada mais implícito para aceitação do resultado eleitoral do que início da transição", emendou.
Apesar da discordância, no início do voto, Nunes Marques elogiou a profundidade do voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, e cumprimentou Araújo pela divergência.
O ministro também votou pela absolvição do então candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro nas eleições de 2022, o ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto (PL). Segundo ele, não há único fato que vincule Braga Netto aos fatos em apuração.
Alexandre de Moraes
O presidente do TSE salientou que o julgamento não trata de liberdade de expressão, ao citar episódios em que a Corte e a sociedade civil foram alvos de desinformação. Segundo ele, não houve, por parte da Corte, atitude de conspirar contra sua então reeleição. Durante o voto, Moraes pontuou que Bolsonaro atacou a lisura do processo eleitoral "que o elege há 40 anos".
"Isso não é exercício de liberdade de expressão, isso é conduta vedada", disse Alexandre de Moraes. "Ao fazer isso, utilizando-se do cargo de presidente da República, do dinheiro público, da estrutura do Palácio da Alvorada, da TV pública, é abuso de poder", comentou o magistrado.
Segundo ele, a reunião seguiu um "modus operandi", que já havia sido praticado em diversos episódios, de bombardear eleitores com desinformação.
"Não há necessidade de avaliar fatos anteriores ou posteriores, há necessidade de avaliar reunião", pontuou o presidente do TSE.
Na fala, o magistrado citou episódios em que o TSE sofreu ataques e foi alvo de desinformação "para angariar mais votos, mais eleitores".
Moraes acusou de mentira por parte de Bolsonaro a alegação de que houve acesso a urnas e ao código fonte por um hacker. "Todos sabemos que as urnas são offline, tudo querendo insinuar fraude", disse.
Entenda o Julgamento
Foi a quarta e última sessão de julgamento. Bolsonaro foi condenado por abuso de poder político ao promover reunião com embaixadores, em 18 de julho do ano passado, no Palácio da Alvorada, para atacar o sistema eletrônico de votação. A legalidade do encontro foi questionada pelo PDT, partido de Ciro Gomes.
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Ação movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) ano passado acusa o ex-presidente de abuso de poder político e dos meios de comunicação em reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, em julho de 2022.
Também foi alvo do processo Walter Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa com Jair.
A defesa de Bolsonaro reiterou preliminares que já foram rejeitadas pelo TSE, como questões processuais apontando a incompetência da Justiça Eleitoral para processar o caso e a discordância na inclusão da “minuta do golpe” no processo.
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A acusação contra Bolsonaro
O TSE julgou se Bolsonaro usou indevidamente o cargo e a estrutura administrativa da Presidência da República para fazer campanha na reunião com embaixadores estrangeiros no Palácio do Alvorada, em julho de 2022, e inflamar seus apoiadores contra a Justiça Eleitoral. O discurso aos diplomatas foi transmitido ao vivo nas redes sociais e na TV Brasil.
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