Roteiro de golpe em três passos; entenda documentos encontrados pela PF no celular de Mauro Cid
Um dos documentos mais contundentes encontrados pela Polícia Federal no celular do tenente-coronel Mauro Cid mostra um passo a passo para o ex-presidente Jair Bolsonaro acionar as Forças Armadas e promover uma intervenção militar contra supostos desvios do Poder Judiciário, especialmente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), acusado de violar a moralidade institucional.
"A legalidade nem sempre é suficiente: por vezes a norma jurídica ou a decisão judicial são legais, mas ilegítimas por se revelarem injustas na prática", diz um trecho do rascunho apócrifo de decreto.
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Os arquivos fazem parte de um relatório de 66 páginas enviado pela Diretoria de Inteligência da Polícia Federal ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os peritos analisaram mensagens de WhatsApp, áudios, documentos e backups.
A minuta de decreto cita exemplos do que seria uma desvirtuação do TSE e do STF. Um deles é a decisão do ministro Alexandre de Moraes que negou um pedido da campanha de Bolsonaro para investigar supostas irregularidades na propaganda eleitoral em rádios do Norte e do Nordeste. Na época, Moraes afirmou que as acusações do ex-presidente foram extremamente genéricas e sem qualquer comprovação e que Bolsonaro tentou tumultuar o segundo turno.
O rascunho reproduz ainda questionamentos de militares sobre o sistema de votação. O texto afirma que o TSE teria limitado a transparência do processo eleitoral e impedido acesso ao código-fonte das urnas, o que não é verdade. Também classifica como arbitrária a multa de R$ 22,9 milhões imposta ao PL, partido de Bolsonaro, pelo pedido para anular parte dos votos do segundo turno. A condenação foi por "litigância de má-fé" - quando a Justiça é acionada de forma irresponsável ou mal intencionada.
Os argumentos são usados para fundamentar a declaração de estado de sítio e de Garanta da Lei e da Ordem (GLO). O objetivo, afirma o documento, seria assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito no Brasil, jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas, em referência à frase que virou quase um bordão de Bolsonaro ao longo do governo.
A PF também encontrou outros arquivos armazenados por Mauro Cid sobre as bases possíveis para uma GLO e para a garantia dos poderes constitucionais. Entre eles, uma sugestão de roteiro, em três passos, para as Forças Armadas agirem como Poder Moderador.
O pontapé golpista seria um requerimento de Bolsonaro aos comandantes das Forças Armadas. "O documento deve conter a descrição detalhada dos atos praticados pelo Poder Judiciário que acarretam desarmonia entre os Poderes ou mesmo violação das prerrogativas constitucionais do Poder Executivo", detalha o roteiro.
O segundo passo seria a análise do requerimento pelos comandantes militares. O documento afirma que a atuação abusiva do Judiciário estaria comprovada e dá como certo a intervenção das Forças Armadas.
O passo três seria o início das operações, com a nomeação de um interventor para coordenar as medidas de restabelecimento da ordem constitucional. Uma das primeiras providências seria anular atos do Poder Judiciário e afastar ministros do STF e do TSE, que também seriam investigados.
O documento menciona expressamente que os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, que na época integravam o TSE, deveriam ser afastados preventivamente e substituídos por Kassio Nunes Marques, André Mendonça e Dias Toffoli.
"Sendo reconhecida a atuação em desacordo com a Constituição da Corte Eleitoral, deverá o interventor fixar prazo para a realização de novas eleições, que serão coordenadas pelo TSE em sua nova composição, haja vista o afastamento preventivo dos ministros a quem foi imputada conduta violadora da Constituição", conclui o roteiro.
COM A PALAVRA, A DEFESA DO EX-PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
"O presidente Bolsonaro jamais participou de qualquer conversa sobre um suposto golpe de Estado.
Registramos, ainda, que o ajudante de ordens, pela func¸a~o exercida, recebia todas as demandas - pedidos de agendamento, recados etc - que deveriam chegar ao presidente da Repu´blica. O celular dele, portanto, por diversas ocasio~es se transformou numa simples caixa de corresponde^ncia que registrava as mais diversas lamentac¸o~es."
Paulo Amador da Cunha Bueno, Daniel Bettamio Tesser e Fa´bio Wajngarten, advogados do ex-presidente
COM A PALAVRA, A DEFESA DE MAURO CID
"Por respeito ao Supremo Tribunal Federal, todas as manifestações defensivas serão feitas apenas nos autos do processo."
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