Militares da ativa terão de se aposentar para disputar eleição
18:43 | Abr. 06, 2023
Quase três meses depois dos atos golpistas de 8 de janeiro, o governo tem pronta a minuta de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que proíbe militares da ativa de assumir cargos no Executivo e de disputar eleições. A proposta será apresentada por um congressista aliado de centro e contraria a estratégia levada a cabo por uma ala do PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pede o fim das operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
A minuta, obtida pelo Estadão, determina a transferência para a reserva, demissão ou licença ex officio do militar que registrar candidatura. Licença ex officio equivale a uma aposentadoria imediata (reforma, na linguagem da caserna), mesmo sem o tempo de serviço, com vencimento proporcional ao período trabalhado. Hoje, a Constituição permite que militares com mais de dez anos de serviço retornem às atividades se forem candidatos e perderem as eleições.
A proposta também cria uma regra de afastamento para quem ocupar cargo de ministro. O texto prevê mais um parágrafo no artigo 87 da Constituição, segundo o qual os titulares da Esplanada devem ser maiores de 21 anos e estar no exercício dos direitos políticos. O dispositivo incluído destaca que, "para tomar posse no cargo de ministro de Estado, o militar deve ser transferido para reserva".
Após a invasão do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, Lula iniciou um processo que chamou de "despolitização" das Forças Armadas. Até o comandante do Exército foi trocado. Quando Lula assumiu o Planalto, havia 6.157 oficiais em cargos comissionados. Jair Bolsonaro foi o presidente que mais nomeou militares no primeiro escalão, mesmo na comparação com governos da ditadura.
Se tudo ocorrer como o roteiro previsto pelo Planalto, integrantes das Forças que quiserem disputar eleições serão obrigados a deixar a caserna. "Para ser elegível, no ato do registro da candidatura, o militar das Forças Armadas deve efetivar a transferência para a reserva ou a demissão ou licença ex officio caso não preencha os requisitos para a reserva", diz trecho da minuta que altera o artigo 14 da Constituição (parágrafo 8-A).
O texto foi preparado pelo Ministério da Defesa, após consultas aos comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, e encaminhado à Secretaria de Relações Institucionais da Presidência. "Houve grande aceitação. Está tudo pacificado", disse ao Estadão o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro.
O presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Joseli Camelo, afirmou ser importante restringir a participação de militares na política. "Lugar de militar é no quartel", argumentou.
Os fardados não aceitam, porém, mudar o artigo 142 da Constituição, como querem deputados do PT. O artigo trata do papel das Forças Armadas, mas é distorcido por bolsonaristas como justificativa para a defesa de intervenção militar.
"Somos contra o fim da Garantia da Lei e da Ordem porque seria uma medida muito drástica", declarou o presidente do STM. "O que precisamos é investir em segurança. GLO não é para usar a torto e a direito e não está na Constituição que temos de manter os Poderes sob nossa tutela. As Forças Armadas não têm poder moderador."
Antigolpe
Mesmo assim, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), vice-líder do governo, coleta assinaturas para uma PEC que muda o artigo 142 e retira o trecho sobre a GLO. Batizada de "PEC antigolpe" por petistas, a proposta tem apoio do deputado Alencar Santana (PT-SP) e do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Rui Falcão (PT-SP).
Para que uma PEC seja apresentada é necessário o aval de no mínimo 171 deputados ou 27 senadores. Até o momento, porém, o projeto não obteve as assinaturas necessárias.
Lula avisou à cúpula do PT que não quer outro confronto com militares. Nos bastidores, ministros dizem que a ideia é tirar a polêmica da GLO de cena e focar no texto feito sob medida para proibir militares da ativa de ocupar cargo no Executivo e disputar eleições.
Zarattini disse que a proposta para a qual coleta assinaturas não é do governo. Na sua avaliação, este é o melhor momento para resolver o problema do artigo 142. "Houve tentativa de golpe e a extrema direita está mais fraca."
O Planalto ainda não escolheu quem vai apresentar a nova PEC, provavelmente em maio, mas evita um nome do PT para que o texto não fique carimbado como sendo de esquerda, o que dificultaria sua tramitação. Um dos cotados para apadrinhar a PEC é o deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA). "Acho importante ter a separação entre Estado e governo. Se alguém do Exército quiser participar da política, é justo que se afaste", disse Alencar Filho. "Caso um militar erre, não depreciará o nome do Exército."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.