Ministro exclui militares e nomeia novos membros da Comissão da Anistia, com presença cearense

Entre os excluídos está o general Rocha Paiva, que escreveu o prefácio do livro do coronel Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-CODI, órgão de repressão da ditadura

Nesta terça-feira, 17, foram anunciados os nomes dos novos integrantes da Comissão de Anistia, agora vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Entre os 14 oficializados no Diário Oficial (DOU), está o cearense Mário Albuquerque, perseguido político pela ditadura militar e ex-presidente da Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou, comitê com as mesmas atribuições para casos no Ceará.

A portaria assinada pelo ministro Silvio Almeida propõe uma reformulação da comissão, já que foram excluídos do colegiado os militares nomeados no governo de Jair Bolsonaro (PL). Entre os novos nomes estão integrantes com “experiência técnica, em especial no tratamento do tema da reparação integral, memória e verdade”, conforme informações divulgadas em nota pelo ministério.

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Os outros dois nomes remanescentes serão definidos pelo Ministério da Defesa e pelos próprios anistiados. A participação na Comissão é considerada prestação de serviço público relevante, não sendo remunerada.

Entre os integrantes no governo de Bolsonaro, estava o general Rocha Paiva, que escreveu o prefácio do livro do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Ex-chefe do DOI-CODI, órgão de repressão da ditadura, Ustra foi reconhecido pela Justiça como torturador em 2008.

No texto, Rocha Paiva elogia o coronel, dizendo que ele tem virtudes como "coragem moral e física, patriotismo e é um exemplo de chefe militar". Bolsonaro também defendia o torturador, a quem chamava de “herói”.

Também foram retirados da comissão, o coronel do Exército Vital Lima Santos, o coronel da Aeronáutica Tarcisio Gabriel Dalcin e o coronel Dionei Tonet, ex-comandante-geral da Polícia Militar de Santa Catarina. 

Ocupava o posto de presidente João Henrique Nascimento de Freitas, advogado e ex-assessor parlamentar do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O advogado foi nomeado, nos últimos atos de Bolsonaro, assessor-chefe da Assessoria Especial do Presidente da República.

Novos nomes

O órgão agora será presidido pela advogada e professora da Universidade de Brasília (UnB) Enéa de Stutz e Almeida, que coordena o grupo de Justiça e Transição na universidade. Entre os novos integrantes, há dois presos políticos da ditadura: Rita Sipahi e Mário Albuquerque.

Rita foi presa junto com Dilma Rousseff, durante a ditadura. Ela foi presa em 1971 e passou 11 meses no Presídio Tiradentes, em São Paulo, onde ficou detida com a ex-presidente na chamada “torre das donzelas”.

Mário integrou a Frente Popular de Libertação e ficou detido quatro anos e meio em Pernambuco e outros quatro anos e meio no Ceará. Ambos já tinham exercido cargos na Comissão Nacional: Mário, de 2010 a 2018, e Rita, entre 2009 a 2019, quando deixou o órgão alegando não concordar com interferências da gestão de Jair Bolsonaro.

“Será um processo de reconstrução da comissão que tem sido destruída. Tem um peso simbólico para fazer a reparação política, moral e econômica para aqueles que foram perseguidos pela Ditadura Militar. Começaram (o governo anterior) um trabalho de desmonte muito grande com o patrimônio moral”, aponta Mário.

A comissão ainda está em processo de organização, sem data para se reunir neste primeiro momento. No entanto, o conselheiro projeta a ideia de avaliar os processos que foram indeferidos nos últimos quatro anos e dar celeridade nos que ainda esperam resolução, segundo ele, em torno de 70 mil.

“É um processo que já devia ter sido encerrado há mais de 40 anos e ainda estamos lidando para fazer justiça para essas pessoas. Eu tenho visto um quadro maior de consolidação da democracia, que passou por sérios golpes. É uma forma de reparar injustiças históricas”, ressaltou.

Criada pela Lei nº 10.559/2002, a Comissão de Anistia é agora um órgão de assessoramento direto e imediato do ministro de Estado dos Direitos Humanos e da Cidadania. Antes, o grupo já foi vinculado ao Ministério da Justiça e, posteriormente, ao Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, subordinado na gestão de Bolsonaro, a Damares Alves.

O membro da comissão avalia que a mudança para um ministério específico também tem carga simbólica para "intensificar" os trabalhos. No entanto, ele explica que a principal mudança foi a unificação da comissão, que antes ficava à critério de cada ministério.

Reconstrução 

Criada em 2002 pelo governo Fernando Henrique Cardoso, a comissão analisa pedidos de reparação de perseguidos políticos pelo Estado, entre os anos de 1946 e 1988. Até 2017, a Comissão de Anistia mantinha o conceito de reparação integral.

A maioria dos pedidos foram rejeitados entre 2019 a 2022. Do total de 4.285 processos julgados, 4.081 foram indeferidos, em torno de 95% dos casos apreciados, conforme informado pela pasta. Entre eles, o da ex-presidente Dilma Rousseff.

"Com a missão de reverter a interferência política propagada desde 2019 – no sentido de paralisar os trabalhos do grupo por meio da omissão do Estado brasileiro –, em 2023, o Poder Executivo reitera o compromisso de que os trabalhos a serem realizados pela Comissão de Anistia contarão com transparência e respeito à democracia brasileira", afirmou o ministério por nota.
 

Veja lista de nomeados para a Comissão da Anistia

Eneá de Stutz e Almeida, na condição de presidente;

Márcia Elayne Berbich Moraes;

Ana Maria Lima de Oliveira;

Rita Maria Miranda Sipahi;

Vanda Davi Fernandes de Oliveira;

Prudente José Silveira Mello;

José Carlos Moreira da Silva Filho;

Virginius José Lianza da Franca;

Manoel Severino Moraes de Almeida;

Roberta Camineiro Baggio;

Marina da Silva Steinbruch;

Egmar José de Oliveira;

Cristiano Otávio Paixão Araújo Pinto; e

Mario de Miranda Albuquerque.

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