Para não cometer o mesmo erro de Bolsonaro: saiba quem foi Padre Cícero

Durante live, Bolsonaro errou a origem do líder religioso e perguntou se Padre Cícero era de Pernambuco

18:57 | Fev. 04, 2022

Por: Maria Eduarda Pessoa
Bolsonaro recebeu imagem de Padre Cícero em visita a Juazeiro do Norte, no Ceará, em 13 de agosto de 2021 (foto: Aurelio Alves)

Durante uma live na última quinta-feira, 3, o presidente Jair Bolsonaro (PL) errou a origem de Padre Cícero e foi bastante criticado nas redes sociais. A fala foi acompanhada ainda de comentário xenofóbico contra assessores, chamados de "pau de arara".

"Falaram que eu revoguei o luto de Padre Cícero. Lá do Pernambuco, é isso mesmo? Que cidade fica lá? Cheio de pau de arara aqui e não sabem em que cidade fica Padre Cícero, pô? Juazeiro do Norte, parabéns aí. Ceará, desculpa aí. Ceará", declarou o presidente em sua mais recente live.

A confusão aconteceu mesmo após o mandatário fazer referência ao sacerdote em vinda mais recente ao Estado. Em agosto de 2021, durante passagem por Juazeiro do Norte, Bolsonaro se comparou a Padre Cícero e foi associado ao patrono pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogerio Marinho.

"Nós continuamos defendendo a bandeira do Padre Cícero, sempre ao lado da família, defendendo a propriedade privada, a liberdade, Deus acima de tudo e combatendo o comunismo", afirmou o presidente.

Na ocasião, Bolsonaro chegou a receber uma imagem do patrono, entregue pelo prefeito de Juazeiro, Gledson Bezerra.

Padre Cícero Romão Batista nasceu no dia 24 de março de 1844, na cidade de Crato, mas vinculou sua história a Juazeiro do Norte, cidade que emancipou e da qual foi primeiro prefeito. Na região, se tornou líder religioso e político de destaque. 

Seu reconhecimento aconteceu após testemunhar o chamado milagre da hóstia, que teria ocorrido pela primeira vez em 1889. Segundo relatos da época, várias eucaristias administradas pelo Padre Cícero à beata Maria de Araújo teriam se transformado em sangue na boca da religiosa, durante pregações no povoado de Tabuleiro Grande, hoje Juazeiro do Norte.

Na ocasião, Cícero julgou ser o próprio sangue de Cristo. O fenômeno teria acontecido ao menos 47 vezes e chamou a atenção de fiéis por todo o Brasil, tornando o então povoado um importante ponto de peregrinação de católicos no Nordeste.

A insistência de Padre Cícero em defender os milagres fez com que a Igreja Católica o punisse. Em 1892, ele foi proibido de pregar, celebrar missas e de se confessar, e, em 1894, uma ordem vinda de Roma anunciou que os acontecidos em Juazeiro não seriam considerados milagres. A Igreja também anunciou que peregrinações para a cidade estavam proibidas.

Interditado das atividades religiosas, manteve intensa atuação política. Em 1911, conquistou a emancipação de Tabuleiro Grande, e o povoado se desligou de Crato. Depois disso, Padre Cícero foi eleito primeiro prefeito município. O nome atual da cidade (Juazeiro do Norte) só foi adotado na década de 1940.

A partir de 1912, acumulou a função com a vice-presidência do Ceará - cargo equivalente ao atual vice-governador. 

O governador - presidente do Estado na denominação da época - era Franco Rabelo. Rabelo e Padre Cícero entraram em colisão no ano seguinte. Rabelo destituiu o sacerdote da administração de Juazeiro e enviou tropas ao Cariri. Os revoltosos fiéis ao padim, contudo, saíram vitoriosos.

Com apoio do presidente da República, Hermes da Fonseca, o exército do Padre Cícero marchou até Fortaleza e destituiu Rabelo. Foi a Sedição de Juazeiro.

Em 1926, o padre foi eleito deputado federal, mas não tomou posse. Um ano antes, ocorrera a Revolução de 1930, levando Getúlio Vargas à Presidência da República, derrubando velhas oligarquias e esvaziando o poder político do padim. Ao mesmo tempo, crescia a aura de santo em vida.

Os últimos anos de padre Cícero foram marcados pela ocorrência de uma catarata que o deixou cego do olho esquerdo e com visão mínima do olho direito. O padre ainda passou por uma cirurgia para tentar recuperar sua visão, mas não obteve sucesso. Também foi abatido por nefrite e graves problemas intestinais.

O sacerdote veio a falecer no dia 20 de julho de 1934. Padre Cícero lutou por toda a vida pelo reconhecimento do milagre de Juazeiro e por sua reabilitação, mas não viveu para ver isso acontecer.

A reabilitação do “padim Ciço”, como é popularmente conhecido, só aconteceu no dia 13 de dezembro de 2015, depois de nove anos de trabalho de uma comitiva da Igreja Católica criada para estudar a vida do padre brasileiro.