Assembleia articula CPI para investigar associações de PMs, após reportagem do O POVO

Pedido protocolado em fevereiro do ano passado voltou à pauta após matéria revelar quebra de sigilo de entidades ligadas a policiais militares no Ceará

18:41 | Ago. 10, 2021

Por: Carlos Mazza e Cláudio Ribeiro
POLICIAIS no 18º Batalhão durante movimento de 2020 (foto: FCO FONTENELE)

A Assembleia Legislativa articula a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o financiamento de associações de policiais militares no Estado. A intenção foi tornada pública nesta terça-feira, 10, pelo deputado federal Capitão Wagner (Pros) e confirmada por lideranças do Legislativo.

A proposta, que tramita na Casa desde o ano passado, voltou à pauta após reportagem do O POVO desta segunda-feira, 9, revelar que a Justiça determinou a quebra de sigilos fiscal e bancário de pessoas físicas e jurídicas em apuração sobre o motim de 2020.

A proposição de CPI avaliada foi protocolada ainda em fevereiro do ano passado por Romeu Aldigueri (PDT), com assinaturas de 31 deputados. No pedido, o parlamentar afirma que associações ligadas a policiais e bombeiros militares teriam agido como "sindicatos" durante a paralisação de 2020, o que desrespeitaria a legislação militar em vigor.

Desde então, a proposta estava parada na Presidência da Casa, aguardando análise do presidente Evandro Leitão (PDT) de um parecer da Procuradoria Legislativa. Fontes ouvidas pelo O POVO, no entanto, confirmaram que o projeto voltou à pauta após reportagem desta segunda-feira, com avaliação de que os novos fatos exigem a entrada do Legislativo nas apurações.

A matéria que serve como base para a articulação revelou que o Ministério Público do Ceará (MPCE) conseguiu na Justiça a quebra dos sigilos fiscal e bancário de entidades e pessoas físicas suspeitas de envolvimento no motim de fevereiro de 2020. No caso, que integra Procedimento Investigatório Criminal (PIC) em andamento, o MP quer saber quem financiou atos do movimento.

Ao todo, foram coletados por determinação da Justiça, emitida ainda em 2020, dados financeiros de até cinco anos anteriores ao motim, que durou entre 18 de fevereiro e 1º de março do ano passado. Segundo O POVO apurou, as quebras de sigilo envolvem pelo menos quatro pessoas jurídicas e três pessoas físicas - incluindo militares e civis.

Uma das lideranças da categoria de policiais militares do Ceará, o deputado federal Capitão Wagner (Pros) criticou nesta terça-feira, 10, a possível instalação da CPI. Confirmando a articulação para o grupo no plenário da Câmara dos Deputados, Wagner destacou que o governo pretende usar o grupo para “fazer cortina de fumaça” e “desgastar adversários”.

“Parece que querem copiar a fórmula de criar CPI para desgastar o adversário. Deu certo no Senado, então estão querendo articular uma para investigar, vejam só que absurdo, as associações de profissionais de segurança pública”, disse o parlamentar.

Investigação em curso

Uma das situações que serve de base para a apuração tocada pelo MPCE é a manifestação de 18 de fevereiro de 2020 em frente à Assembleia Legislativa, dia em que seria votada proposta de reajuste da categoria. Horas após o ato, amotinados passaram a ocupar o 18º Batalhão da PM, no bairro Antônio Bezerra, com policiais à paisana e esposas fechando acesso do quartel.

Um dia antes, em 17 de fevereiro, o MP-CE havia pedido o bloqueio de contas de cinco associações ligadas a policiais militares. Segundo a denúncia, os grupos estariam realizando "atividades típicas de representação sindical e mobilizando as respectivas categorias para participar de atos públicos", o que é vedado por lei para militares.

Com os 13 dias de paralisação, o Ceará teve o mês de fevereiro mais violento desde 2013, com 456 homicídios. Desse total, 312 - quase 70% - ocorreram durante a paralisação dos agentes. Na época, o governador Camilo Santana (PT) cedeu a apenas parte das reivindicações dos militares, se recusando ainda a discutir a anistia aos envolvidos.

A investigação do caso no MPCE tem andamento semelhante à de um inquérito policial, mas é conduzida dentro do próprio Ministério Público. Como ainda não houve apresentação de denúncia e o caso segue em segredo de Justiça, O POVO optou por não divulgar nomes de investigados. Todos os dados, no entanto, já foram recebidos pelos promotores do caso.