Isa Penna diz que não aceita "desculpas" de Cury até que ele reconheça assédio

Em entrevista, Isa Penna contou que nunca havia sofrido assédio sexual. Mas foram vários os comentários machistas que já ouviu na Alesp, onde exerce o seu primeiro mandato como deputada estadual

Quando chegou no Plenário da Assembleia de São Paulo (Alesp), na última quarta-feira, 16, Isa Penna (Psol) se deparou com parlamentares comentando sobre um vídeo em que aparece dançando funk. Dias atrás, o deputado Douglas Garcia (PTB) havia postado a gravação em seu Twitter, dizendo, em tom de ironia, que era "exemplo de decoro parlamentar".

A situação levou a deputada a comentar com o presidente da Casa, Cauê Macris (PSDB), o quanto era difícil ser mulher naquele ambiente. Era uma conversa informal, quase um desabafo. Foi quando Fernando Cury (Cidadania) se aproximou da parlamentar e, por trás, colocou a mão na lateral dos seus seios. "Pensar no toque dele é absolutamente nojento, me dá uma sensação de arrepio", lembrou ela em entrevista ao Estadão.

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O episódio ganhou repercussão no dia seguinte, após a exibição do vídeo no plenário da Casa e transmissão ao vivo no canal do Youtube da Alesp. No mesmo dia, Isa denunciou o caso ao Conselho de Ética da Assembleia e registrou um boletim de ocorrência eletrônico na Polícia Civil.

A presidente e única mulher do Conselho, Maria Lúcia Amary (PSDB), disse que as imagens de Cury mostram um comportamento "visivelmente inadequado" e que contrariam "todas as normas" da Casa. "A cena causou bastante constrangimento. São imagens muito fortes para um parlamento. Fiquei muito incomodada, como mulher e como política", afirmou a deputada.

Em entrevista, Isa Penna contou que nunca havia sofrido assédio sexual. Mas foram vários os comentários machistas que já ouviu na Alesp, onde exerce o seu primeiro mandato como deputada estadual. Sobre o pedido de desculpas de Cury em Plenário, disse que não aceita até que ele reconheça o assédio. O parlamentar alega não ter feito nada de errado. Abaixo, confira os principais trechos da entrevista:

O que a senhora e o presidente da Casa, Cauê Macris, estavam conversando no momento?

 

Era uma conversa tranquila, dessas que temos sempre em Plenário, e eu disse para o Cauê (Macris) que era difícil ser mulher ali. Ele respondeu que era mais difícil porque eu era feminista, no sentido de que eu sofria porque eu luto. Mas é o contrário: todas as mulheres sofrem com o assédio. Mas nós, feministas, sofremos menos, pois entendemos que é um problema coletivo e não somos culpadas.

O que a senhora sentiu no momento em que o deputado Fernando Cury se aproximou?

 

Ele estava tentando me encoxar e passar a mão na lateral do peito. Depois que eu vi o vídeo, tive outra dimensão do negócio. Mas ali, na Assembleia, eu senti ele muito próximo. Assim que virei, senti, sim, um cheiro de álcool. Antes de se aproximar, ele estava fazendo comentários sexualizados ao meu respeito. Sem dúvida nenhuma. Estava bêbado, e a bebida te dá coragem para fazer o que você fala e acredita. Foi aí que ele se mostrou, e eu fiquei chocada. Pensar no toque dele é absolutamente nojento. Me dá uma sensação de arrepio.

Foi a primeira vez que a senhora foi vítima de assédio sexual? Já passou por outras violências na vida política?

 

Na primeira semana como suplente na Câmara Municipal, eu sofri uma violência. O vereador Camilo Cristófaro me chamou de "vagabunda, terrorista". Mas tiveram outros casos. Uma vez fui pedir a assinatura de um parlamentar para uma moção, ou algo assim, e ele disse que o faria se pudesse assinar pegando na minha mão. Também já tiraram foto da minha bunda e ameaçaram expor a foto, que era simplesmente eu abaixada, pegando uma assinatura com o Toninho.

Na Alesp, casos como esses acontecem com frequência?

 

Sim, todos os dias. Fui pedir o voto de um deputado para o projeto de lei Dossiê Mulher Paulista, mas ao perceber que ele estava me olhando, acabei desistindo. Até que ele veio e perguntou: ‘Você não vai pedir meu voto?’. Aí, em uma saia justa, eu perguntei se ele conhecia o projeto e pedi para votar. Até que ele diz: ‘Qual é o seu preço?’. Eu respondi que há coisas na vida que não têm preço. Mas ele voltou: ‘Tudo na vida tem o seu preço’.

Você ainda foi educada na resposta…

 

Não é questão de ser educada, é sobrevivência. Caso contrário, no dia seguinte, esse cara vai pegar no seu pé. Até medo a gente tem. Eu sei com quem estou lidando, não sou amadora.

A senhora e outras deputadas já levaram para o conhecimento da presidência da Casa reclamações relativas ao comportamento dos parlamentares com as mulheres?

 

A gente já fez falas sobre isso. A deputada Monica (da Bancada Ativista) vive pedindo respeito como líder de bancada na Assembleia. Não é uma questão de levantar, é uma questão do presidente Cauê, até agora, em um caso que foi público, filmado e na frente dele, não ter se manifestado.

O Cauê Macris nunca se pronunciou sobre essas violências e comportamentos desrespeitosos com as mulheres? Ele foi omisso?

 

Não é que ele foi omisso. Ele reproduz o machismo. Por exemplo, quando ele interrompe o nosso microfone - é muito mais fácil ele fazer isso com uma mulher do que com um homem.

A senhora considerou o pedido de desculpas do deputado Fernando Cury?

 

Eu não aceito as desculpas dele. Primeiro, porque ele se esquiva da responsabilidade dele. Do necessário reconhecimento da prática que teve, consciente ou não. Se não for capaz de reconhecer, precisa ser cassado.

O que a senhora espera do Conselho de Ética?

 

Acho que o deputado tem que ser cassado. A gente assume um risco quando entra na política. E os parlamentares precisam começar a aprender isso: que temos mais responsabilidades do que as pessoas quando viramos uma autoridade pública.

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