Justiça cancela sessão que decidiria sobre cassação do prefeito de Granjeiro
Decisão tem caráter liminar e pode ser recorrida. Carros oficiais circularam pela cidade com sirenes ligadas, estimulando aglomeração, mas prefeitura nega que tenha promovido carreata
15:56 | Mai. 20, 2020
A sessão legislativa desta quarta-feira, 20, que votaria a cassação do prefeito do município de Granjeiro, Ticiano Tomé, foi suspensa por decisão liminar concedida pelo juiz Judson Pereira Spindola Junior, da Comarca de Caririaçu. A posição provisória da Justiça foi proferida nessa terça-feira, 19. Ao lado do pai, Vicente Félix, o gestor é dos principais suspeitos de envolvimento no assassinato do antecessor, o ex-prefeito João do Povo, de quem ele era vice. Se tivesse ocorrido a votação, a maior probabilidade era de que o mandato do atual prefeito fosse cassado, já que o plenário é composto por nove vereadores, dos quais seis são oposição.
A suspeição de envolvimento no crime é uma das razões que embasam parecer do relator, vereador José Bacelar Pereira, o Naldo, que aponta para o impedimento de Tomé. Outro ponto que consta no documento do Legislativo municipal é referente ao suposto superfaturamento da gestão em empenhos com empresa de controle interno (entenda aqui).
Após a decisão que beneficiou o gestor, ambulâncias da Prefeitura circularam pelos arredores da praça principal do município com sirenes ligadas, o que estimulou aglomeração de pessoas, de acordo com vídeos repassado pelo O POVO pelo presidente da Câmara Municipal de Granjeiro, o vereador Marcio Pereira. O município não tem casos confirmados do novo coronavírus, de acordo com números desta quarta-feira, 20, do IntegraSus, da Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa-CE). São três casos suspeitos.
Marcinho, como é conhecido, disse que o Legislativo recorrerá da decisão judicial. No vídeo, um dos moradores da cidade aparece soltando fogos com a passagem dos carros.
Procurada por O POVO, a procuradora-geral de Granjeiro, Jorgeana Cunha, confirmou que o trânsito de veículos oficiais de fato aconteceu. Porém, ela contrapôs a versão da oposição de que houve carreata, sustentando que os carros estavam exclusivamente a caminho do Legislativo para serem entregues a quem seria o novo prefeito em caso de cassação, o presidente da Câmara Municipal de Granjeiro, Marcinho.
"Como a sessão não ocorreu, os carros voltaram para a garagem. Iria entregar os carros, mostrar a situação dos veículos e entregá-los. Porém, devido à suspensão, os carros voltaram para a garagem." Questionada, então, sobre o porquê de as sirenes estarem ligadas, já que não se tratava de uma carreata, mas de uma simples entrega dos veículos, ela respondeu que aquele foi modo de atestar a boa condição dos veículos.
Contudo, a decisão em favor do prefeito é de terça-feira, 19, o que já indicaria a impossibilidade de a sessão acontecer. Indagada neste sentido, Jorgeana alegou que, apesar da data da decisão, a administração municipal só teve ciência da suspensão da sessão no horário em que ela ocorreria. Novamente questionada, agora sobre o uso das sirenes, já que se tratava de uma simples entrega, ela respondeu que foi um modo de atestar o bom estado dos veículos.
Ela frisou que a gestão recebeu os equipamentos "sucateados" e, ali, com as sirenes ligadas, quis "mostrar para a população" que "o Granjeiro tem ambulâncias de qualidade." Sobre o ato de "mostrar para a população" ser ou não político, ela afirmou que a sessão do impeachment é pública e que "a população não poderia estar de olhos vendados para o que estava acontecendo."
A assessoria de comunicação da Prefeitura de Granjeiro enviou ao O POVO, às 13h21min, informe em que dizia que a administração municipal foi notificada sobre a suspensão da sessão na madrugada desta quarta-feira. O comunicado vai de encontro com a versão de desconhecimento da proibição da sessão de cassação apresentada por Jorgeane, que integra Prefeitura.
O POVO então encaminhou o release de modo a questioná-la sobre sua versão, se não significaria uma contradição em relação ao informe da assessoria de comunicação da Prefeitura, que assume ter sido notificada. Ela afirmou que o período da madrugada não é propício para envio de notificações. "Não posso te dizer se alguém teve conhecimento da suspensão, só posso te dizer que nós da administração não tivemos." Marcinho rebate: "Mentira. Isso (os carros transitando) era chateação. Avisei sobre o cancelamento (da sessão) a eles."
Às 13h33min, a assessoria enviou outro release, sob justificativa de que o primeiro estava redigido com informação equivocada. Na comparação entre as duas notas, a unica diferença é de que na segunda o trecho referente à Prefeitura ter sido avisada do cancelamento da votação foi suprimido, o que reforça a tese de que os veículos estava em carreata.
COMPARE OS DOIS INFORMES
Íntegra da primeira nota
A sessão da câmara municipal de Granjeiro marcada pra essa quarta feira (20), foi suspensa pela justiça. A pauta da sessão seria a votação do impeachment do atual da cidade, Ticiano Félix da Fonseca, conhecido por Ticiano Tomé. A liminar concedida pelo juiz de Caririaçu, Judson Pereira Spindola Júnior, e que também responde pela comarca de Granjeiro, alegou que o direito de defesa não seria plenamente contemplado.
Concedida na terça feira (19), a liminar afirma que o rito processual, que culminaria na votação de impeachment, não foi obedecido. O presidente da Câmara Luiz Márcio Pereira comunicou a suspensão da sessão na madrugada de hoje. Na manhã desta quarta feira (21), os carros da frota municipal foram levados até a prefeitura por determinação de Ticiano Tomé. O objetivo era entregar os veículos ao presidente da câmara, que no caso do impeachment, assumiria a gestão municipal. Assim, os veículos seriam averiguados seus estados de uso e ficariam à disposição do novo gestor. Como a sessão e a eventual posse não ocorreram, os veículos retornaram as suas pastas pra uso dos serviços públicos."
Íntegra da segunda nota
A sessão da câmara municipal de Granjeiro marcada pra essa quarta feira (20), foi suspensa pela justiça. A pauta da sessão seria a votação do impeachment do atual da cidade, Ticiano Félix da Fonseca, conhecido por Ticiano Tomé.
A liminar concedida pelo juiz de Caririaçu, Judson Pereira Spindola Júnior, e que também responde pela comarca de Granjeiro, alegou que o direito de defesa não seria plenamente contemplado. Concedida na terça feira (19), a liminar afirma que o rito processual, que culminaria na votação de impeachment, não foi obedecido. Na manhã desta quarta feira (21), os carros da frota municipal foram levados até a prefeitura por determinação de Ticiano Tomé.
O objetivo era entregar os veículos ao presidente da câmara, que no caso do impeachment, assumiria a gestão municipal. Assim, os veículos seriam averiguados seus estados de uso e ficariam à disposição do novo gestor. Como a sessão e a eventual posse não ocorreram, os veículos retornaram as suas pastas pra uso dos serviços públicos."
A decisão
A decisão não se atém ao mérito do processo, ou seja, sobre se os motivos pelos quais Tomé é processado são ou não convincentes. Vez disso, o magistrado aponta inconsistências na condução do rito de deposição do gestor, a exemplo da marcação da sessão de julgamento no plenário da Câmara sem que o prefeito ou o advogado tivessem sido notificados.
"Pediram a suspensão da sessão alegando não ter recebido os atos da comissão mas receberam sim e vamos provar e recorrer", rebate ao O POVO o presidente da Câmara Municipal de Granjeiro, Luiz Marcio Pereira, chamado de Marcinho na cidade.
Por outro lado, o juiz também frisou que "não se mostra pertinente" a anulação de todo o trabalho da comissão que aprovou a cassação de Ticiano. Ele determinou, inclusive, que a Câmara reúna documentos que comprovem o cumprimento do "devido processo legal" pela Comissão Processante, no prazo de cinco dias, "ocasião em que a presente decisão poderá ser revista."