Eleições na Alemanha: com Friedrich Merz, conservadores vencem pleito
Sob a liderança de Friedrich Merz, União Democrata Cristã (CDU) voltará a formar maior bancada no Parlamento, mas terá que formar coalizão para governar
Em meio a um cenário de crise econômica e tensões geopolíticas, os alemães foram às urnas neste domingo, 23, em eleições legislativas para definir os novos membros do Parlamento (Bundestag).
A contagem final aponta que a conservadora União Democrata Cristã (CDU) combinada com seu parceiro bávaro, a União Social Cristã (CSU), foi a legenda mais votada do pleito, com cerca de 28,6% dos votos de legenda, cacifando o líder conservador Friedrich Merz a ocupar o posto de chanceler federal.
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Merz irá substituir o impopular social-democrata Olaf Scholz na chefia do governo alemão. Apesar de ter superado o Partido Social-Democrata (SPD) de Scholz, a CDU/CSU não assegurou maioria entre as 630 cadeiras no Bundestag.
Assim, a legenda ainda terá que costurar alianças com outras siglas para solidificar a ascensão de Merz ao posto e garantir a formação de um governo estável, um processo que pode se arrastar por semanas.
SAIBA quem é Friedrich Merz, o líder conservador que caminha para ser o novo chanceler da Alemanha
Eleições na Alemanha: Scholz deve permanecer no posto interinamente
É considerado certo que os dias de Scholz à frente do governo estão contados. Castigado por desaprovação recorde, o atual chanceler federal e o SPD obteve apenas 16,4% dos votos de legenda – o pior resultado da legenda em mais de um século.
Com isso, o partido caiu para a terceira posição entre as maiores bancadas do Bundestag, algo que também não era observado desde o fim do século 19. Com o resultado, Scholz vai se tornar o chanceler federal mais breve desde a reunificação do país em 1990, tendo ficado menos de quatro anos no cargo.
Já a segunda maior bancada passará a ser ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), que obteve 20,8% dos votos numa eleição dominada por questões como imigração, crise econômica e acusações de interferência externa.
Com essa porcentagem, a AfD dobrou seu eleitorado em relação ao último pleito, em 2021. Os Verdes, parceiros de Scholz na atual coalizão de governo, sofreram um leve declínio, aparecendo com cerca de 11,6% dos votos.
Eles foram seguidos pelo partido A Esquerda (Die Linke), com 8,8%, uma marca que reverteu o desgaste sofrido pela legenda nos últimos anos. Os resultados também apontam que o Partido Liberal Democrático (FDP, na sigla em alemão) – cuja saída do governo em novembro levou à antecipação da eleição – ficou abaixo da cláusula de barreira de 5% e, por isso, ficará de fora do Bundestag.
Após horas de suspense, o mesmo ocorreu por pouco com a nova legenda populista de esquerda Aliança Sahra Wagenknecht (BSW), que conquistou 4,97% dos votos de legenda, ficando abaixo da cláusula de barreira por meros 13 mil votos.
O fracasso da BSW em formar uma bancada deve ser encarado com alívio pelo bloco CDU/CSU de Merz, já que entrada da legenda poderia ter pulverizado mais o Bundestag, dificultando a formação de alianças. A participação eleitoral neste domingo foi de 82,5%, a mais alta desde reunificação.
Eleições na Alemanha: começa a fase de negociações
Os resultados apontam que os conservadores da CDU/CSU conseguiram recuperar terreno entre o eleitorado em relação ao pleito de 2021, quando foram superados pelo SPD. O bloco cresceu cinco pontos percentuais – o resultado, porém, continua abaixo das marcas obtidas pela CDU/CSU sob a liderança da ex-chanceler Angela Merkel nos pleitos entre 2005 e 2017.
Por enquanto, a governabilidade para os conservadores permanece uma incógnita. Para conseguir liderar um governo estável na Alemanha, um pretendente a chanceler federal precisa garantir mais de 50% dos votos no Bundestag. Como nenhum partido obteve essa marca sozinho, vai entrar em cena a costura de alianças.
Na Alemanha, eleitores não votam diretamente nos candidatos a chanceler, mas em seus partidos e em candidatos a deputado pelas legendas. Normalmente, cabe à legenda que conquistar mais cadeiras no Bundestag e/ou que tiver mais chances de liderar a costura de uma coalizão com mais de 50% das cadeiras encabeçar o governo – e consequentemente escolher o chanceler federal.
Não é inédito que um aspirante conquiste a chancelaria sem que seu partido tenha terminado em primeiro lugar nas eleições. Isso já ocorreu em pleitos realizados na antiga Alemanha Ocidental em 1969, 1976 e 1980, quando partidos menos votados mostraram mais capacidade de formar coalizões.
No entanto, tal cenário é considerado improvável, considerando o declínio acentuado do SPD e o isolamento da AfD. Como Merz e a CDU/CSU descartaram uma aliança com a AfD, analistas apontam que Merz terá que cortejar os partidos que aparecem na terceira e quarta posições para garantir uma coalizão estável.
Ou seja, os social-democratas e verdes, que governaram a Alemanha nos últimos três anos.
Eleições na Alemanha: a ascensão de Merz
Se ascender mesmo ao posto de chanceler federal, Merz será o terceiro membro da CDU a chefiar o governo alemão desde a reunificação do país, em 1990. Neste domingo, após o anúncio da boca de urna, Merz discursou para seus apoiadores, afirmando que se tratava de "uma noite de eleição histórica" para os conservadores da CDU/CSU.
"Nós, o bloco da União, vencemos esta eleição. Ganhamos porque a CDU e a CSU trabalharam muito bem juntas e se prepararam muito bem", disse.
Em seguida, Merz abordou as complicadas negociações para a formação de uma coalizão que já se anunciam.
"O mundo não vai esperar por nós, não vai esperar por longas negociações de coalizão. Precisamos ser capazes de agir novamente com rapidez, para que possamos fazer a coisa certa na Alemanha, para que estejamos presentes novamente na Europa e para que o mundo veja: A Alemanha tem novamente um governo confiável", continuou.
Eleições na Alemanha: social-democratas amargam derrota histórica
Com 16,4% dos votos no pleito, o SPD de Scholz obteve uma das piores votações da sua história. Em comparação com 2021, foram quase dez pontos percentuais a menos. O resultado negativo só é comparável aos obtidos nos primeiros anos da legenda, entre os anos 1870 e 1880, durante o antigo Império Alemão.
A última vez que o partido havia ficado abaixo da marca dos 20% foi no pleito de 1933, quando os nazistas já estavam no poder e a campanha foi marcada por intimidação.
Com o resultado deste domingo, os social-democratas caíram para a terceira posição entre as bancadas no Parlamento. Novamente um feito histórico: a última vez que a legenda não ocupou o primeiro ou segundo lugares ocorreu em 1887.
Com seus dias aparentemente contados como chanceler, Scholz também se tornará o líder de governo menos longevo desde a reunificação, em 1990.
Após a divulgação da boca de urna neste domingo, Scholz falou de um "resultado eleitoral amargo".
Eleições na Alemanha: agonia dos liberais e estagnação dos Verdes
O SPD de Scholz não foi o único partido da coalizão de governo a ser castigado pelo eleitorado. Membros remanescentes da coalizão de Scholz, os Verdes sofreram uma leve redução entre o seu eleitorado, terminando a eleição com 11,6% dos votos - contra 14,8% em 2021.
Numa campanha dominada pela economia e imigração, os Verdes tiveram dificuldades para promover sua agenda ambiental. Já o Partido Liberal-Democrático (FDP), parceiro do chanceler até a ruptura de novembro, obteve nesta eleição um dos piores resultados da sua história.
Na contagem final, o partido apareceu com 4,3% dos votos de legenda, abaixo da cláusula de barreira de 5%. Com isso, o FDP vai ficar fora do Parlamento.
Eleições na Alemanha: ultradireita dobra votação
Já a ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD) vai dobrar sua atual bancada de mais de 70 deputados no Parlamento e se tornar o segundo maior partido da Casa, apenas atrás da CDU/CSU.
No entanto, esse aumento expressivo entre o eleitorado não deve se traduzir necessariamente em poder para a AfD, já que todos os partidos tradicionais já avisaram que não pretendem se aliar com a sigla para formar um novo governo.
Nesta eleição, a AfD, redobrando seu discurso anti-imigração, especialmente após uma série de ataques cometidos por homens de origem estrangeira desde novembro nas cidades de Magdeburg, Aschaffenburg e Munique, também recebeu endossos externos durante a campanha.
Exemplos desses apoios foram do bilionário sul-africano Elon Musk e do vice-presidente americano J.D. Vance, o que levou rivais a acusarem interferência externa.
Eleições na Alemanha: esquerda renasce das cinzas
A eleição deste domingo também foi palco de um renascimento que parecia improvável há poucos meses. Ao conquistar 8,8% dos votos, o partido A Esquerda (Die Linke) se juntou ao clube de legendas que registrou crescimento, quase dobrando seu eleitorado.
Eleições na Alemanha: novo partido de esquerda "antiwoke" fracassa em estreia
O pleito deste domingo também marcou a estreia em eleições federais da Aliança Sahra Wagenknecht (BSW), legenda populista de esquerda formada em 2024 que leva o nome da sua fundadora.
No entanto, a noite não foi favorável para o partido de Wagenknechtm, que por apenas 13 mil votos votos ficou abaixo da cláusula de barreira 5%. Assim, a legenda não poderá contar com uma bancada no Bundestag.
Antes de lançar a BSW no ano passado, Wagenknecht era uma figura proeminente da legenda A Esquerda, No entanto, Wagenknecht vivia às turras com seus antigos correligionários por causa da sua oposição à imigração ilegal e ao "identitarismo".
Ao estrear em 2024 nas eleições europeias e três pleitos estaduais na Alemanha, a BSW se apresentou para o eleitorado com uma agenda heterodoxa: esquerdista em assuntos econômicos, porém mais próxima da ultradireita em questões como imigração e diversidade.
Analistas chegaram a apontar que a nova legenda poderia tomar quase todo o espaço do partido A Esquerda e pesquisas no final do ano passado sugeriram isso. No entanto, conforme a campanha avançou, a BSW foi perdendo fôlego, e acabou sendo superada pela velha agremiação de Wagenknecht. (Por Jean-Philip Struck)
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