Uma realidade política diferente após 'nova era' de financiamento climático
08:14 | Nov. 25, 2024
A promessa dos países ricos na COP29 de desbloquear 300 bilhões de dólares anuais (1,7 trilhão de reais) em financiamento climático para os países pobres provocou indignação, mas também reflete uma evolução na realidade política mundial.
As duas semanas da COP29 em Baku começaram pouco depois da eleição de Donald Trump, um cético da mudança climática e da cooperação internacional, nos Estados Unidos.
No início do próximo ano, as eleições na Alemanha, Canadá e Austrália podem levar os conservadores, tradicionalmente mais reticentes em matéria de política ambiental, ao poder.
Com exceção do Reino Unido, cujo governo trabalhista priorizou a agenda climática, na maioria dos países ocidentais, a inflação e as consequências orçamentárias da invasão russa à Ucrânia pesaram mais que as ambiciosas medidas climáticas.
Na COP29, a Alemanha e a União Europeia mantiveram sua postura de defesa climática, mas insistiram na necessidade de uma nova abordagem na ajuda financeira dos poluidores históricos para os países mais pobres.
"Não podemos nos iludir: enfrentamos grandes desafios geopolíticos", disse o negociador da UE, Wopke Hoesktra, aos delegados no encerramento da COP29 no domingo.
Mas prometeu que a Europa estará presente, e considerou a COP29 como "o começo de uma nova era" para o financiamento climático.
A ministra alemã das Relações Exteriores, Annalena Baerbock, do Partido Verde, também pediu certa flexibilidade: a Europa deve "assumir suas responsabilidades, mas sem fazer promessas que não consiga cumprir".
- "Contabilidade criativa" -
Do ponto de vista dos ambientalistas, o financiamento climático é um dever - não uma opção - dos países ricos, cujas emissões de gases de efeito estufa provocaram uma crise que atinge com maior força os mais pobres e vulneráveis.
O ano de 2024 está prestes a se tornar o mais quente já registrado. Desde a COP29, tempestades mortais atingiram as Filipinas e Honduras, e o Equador declarou emergência nacional pela seca e pelos incêndios florestais.
A promessa dos poluidores históricos de liberar 300 bilhões de dólares por ano até 2035 para apoiar a transição energética e a adaptação à mudança climática dos países em desenvolvimento é um avanço comparado ao compromisso anterior de 100 bilhões de dólares anuais (581 bilhões de reais), mas todos reconhecem que é insuficiente.
O acordo alcançado na COP29 cita também um objetivo global de financiamento climático oriundo de todas as fontes, por 1,3 trilhão de dólares (7,5 trilhões de reais).
Mas alguns ativistas mostram-se céticos sobre os 300 bilhões de dólares anuais.
"É, de alguma forma, uma promessa vazia", indicou Mariana Paoli da ONG Christian Aid.
Na opinião de Paoli, o objetivo é uma questão de "contabilidade criativa". Ela lamentou a falta de clareza sobre a parte que virá de fundos públicos e subsídios, em vez de empréstimos.
- Bancos multinacionais -
O acordo da COP29 em Baku também estipula que o financiamento climático para países pobres fornecido por bancos multilaterais pode ser contabilizado na meta de 300 bilhões.
O texto especifica que as contribuições financeiras são “voluntárias”. A China, o maior poluidor do mundo, se recusa a se submeter às mesmas exigências dos países desenvolvidos em nome de sua responsabilidade histórica.
Em um comunicado conjunto publicado durante a COP29, os bancos multilaterais de desenvolvimento estimaram que poderiam financiar 120 bilhões de dólares por ano (697 bilhões de reais) para o clima e mobilizar 65 bilhões de dólares (377 bilhões de reais) do setor privado até 2030.
Melanie Robinson, diretora do programa climático do World Resources Institute, justifica o uso dos bancos multilaterais de desenvolvimento pelo montante de capital que eles podem mobilizar e pelas ferramentas que têm à disposição.
“Eles são a maneira mais eficaz de transformar cada dólar de financiamento em impacto no local”, disse ela.
Robinson aguarda a COP30, que acontecerá no próximo ano no Brasil, motivada por uma iniciativa brasileira da última cúpula do G20 no Rio de Janeiro, que visa reformar as instituições financeiras para integrar as questões climáticas.
“Há uma oportunidade realmente grande: mudar todo o sistema financeiro”, insistiu ela.
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