Vizinhos brigam com a Argentina devido a taxa cobrada no Rio Paraná. As próximas eleições no país, no entanto, podem tornar ainda mais difícil encontrar uma posição comum na América do Sul.Uma crise causada pela cobrança de um pedágio no Rio Paraná evidenciou como é frágil o equilíbrio político e econômico no Mercosul – e isso num momento em que a comunidade de países sul-americanos deveria estar interessada em mostrar unidade, em meio às negociações com a União Europeia (UE). Desde 1º de janeiro, a Argentina cobra de todos os navios cargueiros que passam pelo Rio Paraná, na altura da cidade portuária de Rosário, um pedágio de 1,47 dólar por tonelada transportada. No início, quem protestou contra a cobrança unilateral foram sobretudo os governos da Bolívia e do Paraguai, que não têm saída para o mar e dependem do principal corredor fluvial no centro da América do Sul para suas importações e exportações. Mais tarde, Brasil e Uruguai também criticaram a cobrança. Mas, apesar da oposição maciça dos estados vizinhos e de várias reuniões em Assunção e Buenos Aires para tentar sanar a crise, não há acordo à vista. Como contramedida, o Paraguai interrompeu o fornecimento de eletricidade à Argentina pela usina hidrelétrica de Yacyretá, operada em conjunto no Rio Paraná. Desde então, a Argentina tem sido forçada a importar eletricidade do Brasil a um preço mais alto. A Argentina justifica o pedágio cobrado unilateralmente com os trabalhos de dragagem que realizaria para manter o rio navegável. Mas o governo se recusa a tornar transparentes os números do investimento. É improvável que algo mude logo nessa situação conturbada: a Argentina está passando por uma grave crise econômica, seus cofres de divisas estão vazios e, ao mesmo tempo, um novo governo será eleito em 22 de outubro. Receitas em moeda estrangeira são vitais para o governo poder pagar as importações de medicamentos ou eletricidade, por exemplo. Ao que tudo indica, o atual governo argentino também quer financiar a campanha eleitoral com as receitas – é o que dizem no Paraguai. A influente organização de jovens La Cámpora, do partido peronista do governo, e os sindicatos portuários da Argentina estariam por trás do aumento da taxa. Mercosul sob ameaça crescente Tradicionalmente a Argentina não tem boa reputação com os governos de seus vizinhos menores, como Uruguai e Paraguai, considerada um parceiro pouco confiável, que não respeita acordos. As relações políticas são propensas a conflitos. Os governos peronistas pós-2003, de Nestor Kirchner e de sua esposa Cristina, têm repetidamente demonstrado que não hesitam em restringir a integração no Mercosul de forma unilateral quando isso parece politicamente oportuno. De 2007 a 2010, a Argentina teve a ponte mais importante para o Uruguai bloqueada por ambientalistas, em protesto contra uma fábrica de celulose no Uruguai – que foi originalmente planejada para o lado argentino do rio. Se nenhum acordo com a UE for alcançado até 6 de dezembro, quando o Paraguai assume a presidência do Mercosul, as negociações serão interrompidas, e conversas com novos parceiros econômicos na Ásia e no Oriente Médio devem ser iniciadas. O Uruguai também é conhecido pelo interesse em concluir um acordo bilateral com a China. Após as eleições na Argentina, uma nova possibilidade de conflito ameaça o Mercosul: o candidato favorito à presidência, Javier Milei, espera pouco do bloco. Ele prefere ir em busca de novos parceiros comerciais mundo afora, disse durante a campanha eleitoral. Para ele, Lula é um comunista totalitário. Nada disso é bom sinal para o Mercosul. --- Há mais de 30 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil. Autor: Alexander Busch