Videogame sobre Holocausto quebra tabus
É possível ensinar o que foi o Holocausto, usando um videogame? É o que propõe "The Light in the Darkness" (A luz na escuridão, em tradução livre), primeiro título que reproduz, de maneira fiel, o dispositivo criado pelos nazistas para exterminar os judeus.
Neste jogo, disponível para computador e em breve para console, o jogador encarna uma família judia francesa oriunda da Polônia, acompanhando-a em sua jornada sob o regime de Vichy até sua detenção em 1942 e transferência para o campo de Pithiviers.
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A evocação do Holocausto continua sendo um tabu no mundo dos jogos e, por isso, poucos programadores se arriscam a abordar o tema.
"Existe o medo de fazer um jogo trivial, ou de simplificar demais" a questão, explica Eugen Pfister, pesquisador da Escola de Artes de Berna e especialista em videogames.
"Também há o medo de que você não consiga fazer um jogo de forma ética", acrescenta.
Entre os títulos de maior sucesso nos últimos anos, há uma exceção: a série Wolfenstein, em particular "The New Order" (2014), cujo personagem principal é introduzido em um campo de concentração fictício na Croácia.
"The New Order" é ambientado, entretanto, em um universo alternativo, no qual os nazistas vencem a Segunda Guerra Mundial. Não propõe uma representação realista do Holocausto.
"Veem-se as chaminés, os vagões e até a seleção de prisioneiros, mas nunca se fala sobre campos de concentração, ou mesmo sobre judeus", diz Pfister.
Para Luc Bernard, criador francês de "The Light in the Darkness", o fato de o Holocausto não ser abordado nos videogames é problemático.
"Os jovens jogam jogos sobre a Segunda Guerra Mundial, como 'Call of Duty', onde (o Holocausto) quase não é mencionado", lamenta.
"É um pouco como negar que existiu", continua esse programador de 36 anos, morador de Los Angeles.
Na história criada por Bernard, o jogador não pode controlar o desenvolvimento da história e assiste, passivamente, ao destino trágico dos personagens.
"Eu não poderia fazer um jogo, em que você ganha no final", alega o desenvolvedor. "Não foi assim no Holocausto, não havia escolha".
Para a criação do jogo, Bernard fez uma extensa pesquisa nos arquivos dos museus sobre o Holocausto de Washington e de Los Angeles. Também recorreu aos depoimentos de sobreviventes. Em uma próxima versão do jogo, o programador planeja acrescentar alguma dessas explicações.
Há cerca de 15 anos, Bernard já havia desenvolvido um primeiro jogo sobre o Holocausto, "Imagination is the Only Escape" (Imaginação é a única saída, em tradução livre), o qual pretendia lançar pela Nintendo DS.
O jogo foi inspirado na história de sua avó, que transportou crianças judias para o Reino Unido durante a guerra.
O projeto não teve continuidade por falta de financiamento. Segundo o criador, sofreu uma campanha de desprestígio por parte da imprensa.
Mas os tempos mudaram, e "agora ninguém me ataca", diz ele.
Para Pfister, a evolução da mentalidade é comparável ao que aconteceu no cinema após a série "Holocausto" (1978) e o filme "A Lista de Schindler" (1993), de Steven Spielberg.
"O consenso hoje é que Hollywood é capaz de fazer filmes sobre o Holocausto", resumo o historiador.
"Sou otimista com a possibilidade de os videogames também encontrarem uma linguagem para falar disso", completou.
"The Light in the Darkness" está disponível gratuitamente na loja on-line da Epic Games. O jogo também está em exibição no Museu da Cultura Pop, em Seattle.
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