Madeleine Albright, a refugiada que comandou a diplomacia dos EUA
20:01 | Mar. 23, 2022
Ela chegou ainda criança como refugiada nos Estados Unidos e acabou se tornando a primeira mulher a comandar a diplomacia do país: Madeleine Albright, que faleceu nesta quarta-feira (23), foi uma pioneira que abriu portas.
Albright, que morreu de câncer aos 84 anos, foi escolhida a dedo pelo presidente Bill Clinton para liderar o Departamento de Estado depois de brilhar como embaixador na ONU.
A "voz dos Estados Unidos" cumpriu o papel deixando-se guiar por sua visão do "país mais poderoso do mundo", "sem contrapeso" no pós-guerra.
Seu currículo acadêmico brilhante e sua forte personalidade permitiram que essa poliglota de origem tcheca subisse aos altos escalões do poder após um divórcio que deu impulso às suas ambições.
A que se definia como "refugiada", "colecionadora de broches" e "americana grata" cursava um doutorado em relações internacionais quando seu professor, Zbigniew Brzezinski, se tornou membro do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca e a contratou. Foi seu trampolim para posições de liderança na política internacional.
Albright era "uma mulher e uma estrangeira", uma dupla desvantagem, mas não permitia que nenhuma barreira interferisse com suas ambições.
"Seja o que você quiser", disse às alunas da Universidade de Georgetown, em Washington, como relatou em suas memórias (Madam Secretary, 2003).
Apelidada de "a dama de ferro", como a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, Albright "proibiu qualquer sinal de fraqueza para não reforçar os preconceitos sobre o sexo frágil". "Por exemplo, eu nunca chorei, enquanto os homens hoje têm o direito de fazê-lo."
Em fevereiro de 1997, recém-nomeada secretária de Estado, Albright alegou que soube pela imprensa sobre sua origem judia e que seus três avós morreram em campos de extermínio nazistas.
Marie Jana Korbelova nasceu em 15 de maio de 1937 em Praga (então Tchecoslováquia) em uma família judia e era filha do diplomata tcheco Josef Körbel, que se converteu ao catolicismo antes de se refugiar em Londres em 1939 para fugir dos nazistas.
Em 1948, quando os comunistas tomaram o poder na Tchecoslováquia, para onde sua família havia retornado, a jovem, que estudava na Suíça, onde trocou de nome para Madeleine, emigrou com os pais para os Estados Unidos, primeiro para Denver, onde seu pai lecionava na universidade, e mais tarde para Nova York.
Falava inglês, tcheco, francês e russo e estudou no Wellesley College em Massachusetts, graduando-se em ciências políticas (1959), dois anos depois de se naturalizar americana.
Ela tinha então 22 anos e se casou com Joseph Medill Patterson Albright, herdeiro de um grupo de imprensa, com quem teve três filhas em 23 anos de casamento.
Em 1962, a família mudou-se para Washington, onde Madeleine estudou na Universidade Johns Hopkins, e depois para Nova York, onde fez doutorado em ciência política em Columbia.
De volta a Washington, trabalhou para o democrata Edmund Muskie no Capitólio, no Conselho de Segurança da Casa Branca e para o candidato presidencial Michael Dukakis.
Depois que o presidente republicano Ronald Reagan chegou ao poder em 1981, Madeleine Albright ensinou relações internacionais em Georgetown, onde foi eleita a melhor professora por quatro anos consecutivos.
Sua participação em grupos de reflexão democratas sobre questões de política externa levou o presidente Clinton a escolhê-la, em fevereiro de 1993, como embaixadora dos Estados Unidos na ONU e em seguida chefe do Departamento de Estado em janeiro de 1997.
Durante a intervenção da Otan no Kosovo, ela deixou sua marca no Conselho de Segurança da ONU, onde foi a "única saia no meio de 14 ternos".
Em 2001, após o fim do mandato de Clinton, criou o "Albright Group", uma empresa de consultoria em estratégia internacional com sede em Washington.
Albright nunca se afastou da política e, em janeiro de 2017, disse que estava disposta, em solidariedade, a registrar-se como muçulmana depois que o presidente Donald Trump anunciou uma ordem executiva contra a entrada nos Estados Unidos de cidadãos de certos países de maioria muçulmana.
Em fevereiro passado, quando cresciam os rumores de uma invasão russa da Ucrânia, Albright assinou uma coluna no The New York Times na qual considerava ser "um erro histórico" do presidente Vladimir Putin.
Albright era "uma força apaixonada pela liberdade, democracia e direitos humanos", declarou Bill Clinton nesta quarta-feira.
"Uma pioneira (...) que literalmente abriu as portas", acrescentou o atual porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price.
Segundo o presidente Joe Biden, Albright "mudou o curso da história".
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