Entre balas, a angustiante rotina dos jornalistas mexicanos

É segunda-feira e María está pronta para trabalhar em Aguascalientes, no México, mas devido a ameaças de morte esta jornalista deve cumprir um ritual antes de sair de casa: pedir às autoridades que monitorem seus passos e entregar o itinerário aos seus acompanhantes.

Simultaneamente os fotógrafos Jesús Aguilar, em Tijuana; Lenin Ocampo, em Chilpancingo; Martín Patiño, em Guadalajara, e a repórter María Teresa Montaño, em Toluca, voltam às ruas para cobrir a violência do crime organizado e combater a corrupção.

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Todos vivem com o medo nas costas, observou a AFP depois de acompanhá-los durante um dia de trabalho. Essa realidade é agravada pelo assassinato de oito jornalistas desde janeiro, em comparação com sete em todo o ano de 2021.

O rastro de sangue continua crescendo no México, um dos países mais perigosos para a imprensa, com cerca de 150 assassinatos de repórteres desde 2000. O mais recente deles ocorreu na terça-feira em Michoacán (oeste), onde Armando Linares foi assassinado.

"Sei que minha vida está em risco todos os dias e é terrível conviver com a ameaça, com o medo de sair e nunca mais voltar", diz María Martínez, de 55 anos, em sua pequena casa em Aguascalientes protegida por várias fechaduras e câmeras de segurança.

Diretora do portal digital "Péndulo Informativo", ela denunciou ameaças por suas investigações sobre corrupção e vínculos entre funcionários públicos e traficantes de drogas.

Vários policiais foram presos após suas publicações.

"Você vai morrer, vadia!", alertou uma das ameaças recebidas em seu telefone e pela qual foi incluída em um programa do governo que protege 500 comunicadores.

Em Tijuana, o medo de Jesús Aguilar se intensificou em 17 de janeiro, quando o fotógrafo Margarito Martínez, com quem trabalhava diariamente naquela cidade, foi assassinado.

Lá também, dias depois, Lourdes Maldonado foi baleada, apesar de estar no programa de proteção. A trágica saga de 2022 é completada por José Luis Gamboa, Roberto Toledo (sócio de Linares), Heber López, Juan Carlos Muñiz e Jorge Luis Camero.

Cobrir acertos de contas de narcotraficantes e denunciar sua corrupção ou ligações com políticos e forças de segurança deixa esses repórteres à mercê de assassinos de aluguel.

"Quando um carro vem devagar atrás de mim, eu sinto que vai parar e que vão atirar em mim. Ou quando estou estacionando e vejo um veículo mais perto de mim, eu afasto o banco e me deito para me proteger", confessa Aguilar, de 32 anos.

Em Chilpancingo (sul), o fotógrafo Lenin Ocampo, 40 anos, diz que muitas vezes se depara com membros do Cartel de Nova Geração de Jalisco ou La Familia Michoacana. "Eles nos param, nos revistam. A ameaça é sempre latente."

Durante a noite, ao lado de um carro incendiado por desconhecidos em Guadalajara (oeste), seu colega Martín Patiño (41 anos) declara sua "impotência" pela impunidade nos crimes contra jornalistas, que segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras atinge 92%. "As autoridades não fazem nada."

Desde sua criação, em 2010, a Promotoria Especial para Crimes contra a Liberdade de Expressão alcançou 28 sentenças, em quase 1.500 denúncias por homicídio, agressões e ameaças contra jornalistas. Nem todos os casos entram em sua jurisdição.

O presidente de esquerda Andrés Manuel López Obrador promete "impunidade zero" e destaca que há 17 detidos pelos cinco assassinatos de comunicadores registrados pelo seu governo este ano.

Confrontado com um setor da imprensa tradicional que o acusa de servir a interesses privados, o presidente rejeitou como "interferência" os apelos recentes dos Estados Unidos e do Parlamento Europeu para proteger os repórteres.

Os fotógrafos entrevistados carecem de equipamentos de segurança e, como muitos jornalistas do interior do país, colaboram com diversos veículos de comunicação.

Dias antes de sua entrevista com a AFP, María Martínez sofreu um pré-infarto, o qual ela atribui ao estresse de sua situação e que, segundo ela, já causou um derrame.

A comunicadora, que descarta abrir mão do trabalho que ama, encerra o dia com uma entrevista com a ex-mulher de um traficante para seu primeiro livro.

"Minha família me pediu para sair do jornalismo, mas sou uma mulher com convicções, de valor (...), tenho uma responsabilidade social", justifica.

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