Ucrânia evacua porto estratégico de Mariupol após anúncio de cessar-fogo temporário
07:28 | Mar. 05, 2022
As autoridades ucranianas ordenaram neste sábado a saída dos habitantes do porto estratégico de Mariupol, cercado pelas forças russas, após um cessar-fogo temporário de Moscou para permitir que os civis escapem de uma das zonas de combates mais violentas do conflito.
O prefeito de Mariupol, Vadim Boichenko, afirmou que a cidade, que em um período normal tem 450.000 habitantes, está submetida a um "bloqueio", sem energia elétrica, alimentos, água, gás e transportes. As forças separatistas pró-Rússia e o exército de Moscou anunciaram que a cidade está cercada.
Depois que o ministério russo da Defesa declarou um cessar-fogo para a "abertura de corredores humanitários", a prefeitura do porto estratégico do Mar de Azov anunciou que a evacuação começaria às 9H00 GMT (6H00 de Brasília).
"Não é uma decisão fácil. Mariupol não são as casas e ruas. Mariupol somos nós e vocês", afirmou Boichenko no Telegram.
O controle de Mariupol tem caráter estratégico para a Rússia, porque permitiria garnatir uma continuidade territorial entre suas forças procedentes da península de Crimeia e as unidades dos territórios separatistas pró-Moscou da região ucraniana de Donbass, ao leste.
Correspondentes da AFP que visitaram a cidade neste sábado viram cenas de destruição, apesar da insistência do presidente russo Vladimir Putin de que suas forças não atacam áreas residenciais.
Um funcionário da ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) que está refugiado em Mariupol com sua família afirmou que eles coletaram "neve e água da chuva" para utilizar diante da impossibilidade de conseguir água devido às longas filas nos locais de distribuição.
"Queríamos conseguir também o pão 'social' (distribuído pelas autoridades locais), mas o horário e os pontos de distribuição não estavam claros. Segundo a população, muitos armazéns foram destruídos pelos mísseis e o que sobrou foi levado pelas pessoas mais necessitadas", disse.
As tropas russas se aproximam ao mesmo tempo da capital Kiev, onde encontram uma intensa resistência, e bombardeiam bairros dos subúrbios ao oeste da capital ucraniana. A cidade de Chernihiv, ao norte, também é alvo de bombardeios constantes, que deixaram muitas vítimas civis nos últimos dias.
O ministro ucraniano da Defesa, Oleksiy Reznikov, afirmou neste sábado que a Rússia mudou de tática ao observar a grande dura resistência que fretou seu aparente plano de conquistar rapidamente as grandes cidades e derrubar o governo do presidente Volodymyr Zelensky.
"Sim, o inimigo avançou em algumas direções, mas controla apenas uma pequena área. Nossos defensores estão impedindo e expulsando os ocupantes", afirmou no Facebook.
"Aviação de todo tipo bombardeia cidades e infraestruturas civis", acrescentou, antes de acusar o exército russo de "covardia" e de ter capacidade apenas de atacar "crianças, mulheres, civis desarmados".
Desde que o presidente Vladimir Putin ordenou a invasão da Ucrânia em 24 de fevereiro, a Rússia bombardeou várias cidades da Ucrânia e matou centenas de civis. Também atacou a maior central nuclear da Europa, provocando um incêndio que gerou o temor de uma nova catástrofe nuclear como a de Chernobyl em 1986.
As tropas russas conquistaram o controle de duas cidades importantes em 10 dias de invasão: Berdiansk e Kherson, na costa do Mar Negro, sul da Ucrânia.
O presidente Zelensky afirmou que o ataque contra a central nuclear de Zaporizhzhia "poderia acabar com a História. A história da Ucrânia. A história da Europa".
"Os comandantes dos tanques russos sabiam contra o que estavam disparando", disse Zelensky, que discursará neste sábado para o Senado dos Estados Unidos por Zoom a pedido de Kiev, informou uma fonte do Legislativo de Washington.
A embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield, afirmou que o ataque foi "incrivelmente perigoso". Mas o embaixador russo nas Nações Unidas, Vassily Nebenzya, classificou a acusação de que seu país bombardeou a central como parte de "uma campanha de mentiras sem precedentes".
Alguns congressistas americanos pediram ao presidente Joe Biden que adote uma postura mais severa contra a Rússia, incluindo a suspensão das importações de petróleo.
A Otan descartou a aplicação de uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia pelo temor de provocar outro conflito com a Rússia.
Zelensky criticou duramente a decisão e afirmou que, assim, a Aliança Atlântica "deu luz verde a mais bombardeios das cidades ucranianas".
Os temores de uma escalada militar com uma potência nuclear levaram Washington e Moscou a estabelecer uma linha direta entre suas Forças Armadas para reduzir o risco de um "mal-entendido".
Putin, no entanto, não parece afetado pelo isolamento econômico, esportivo e cultural da Rússia.
Segundo o Kremlin, Putin disse ai colega bielorrusso Aleksander Lukashenko que "as tarefas fixadas para as operações (na Ucrânia) prosseguem de acordo com os planos e serão cumpridas em sua totalidade".
As autoridades russas adotaram uma censura de informações e dois meios de comunicação liberais interromperam as operações.
Vários sites de notícias, incluindo a BBC, estavam parcialmente inacessíveis na Rússia, ao mesmo tempo que o Twitter enfrenta restrições e o Facebook foi bloqueado.
BBC e Bloomberg anunciaram a suspensão de sua presença na Rússia depois que Moscou aprovou uma lei que impõe multas e penas de até 15 anos de prisão para quem publicar "notícias falsas" sobre o exército.
A CNN afirmou que suspenderia as transmissões na Rússia, enquanto o jornal independente russo Novaya Gazeta anunciou que removeria o conteúdo sobre a Ucrânia após a aprovação da nova lei.
Os procuradores do Tribunal Penal Internacional (TPI) investigam possíveis crimes de guerra cometidos no bombardeio da cidade ucraniana de Kharkiv.
O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, exigiu a formação de um tribunal especial para os "vários casos de, lamentavelmente, estupros de mulheres em cidades ucranianas por soldados russos".
O Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou uma investigação de alto nível das violações cometidas na invasão.
"A mensagem a Putin é clara: está isolado a nível mundial, o mundo inteiro está contra você", afirmou a embaixadora ucraniana no Conselho, Yevhenia Filipenko.
A ONU afirma que mais de 1,2 milhão de refugiados saíram da Ucrânia desde 24 de fevereiro.
A organização também alertou para uma crise alimentar na Ucrânia e aumento da insegurança no mundo, pois Rússia e a Ucrânia são responsáveis por 29% do trigo consumido globalmente.
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