Bombardeio russo em Kiev atinge área próxima a local simbólico de massacre nazista
No bombardeio a torre de TV, vítimas seriam de uma mesma família, dizimada pelo ataque
12:10 | Mar. 02, 2022
Durante a madrugada, uma fina camada de neve cobre os corpos, deitados na estrada, das cinco pessoas que morreram no bombardeio russo contra a torre de televisão de Kiev, perto do local simbólico de um massacre nazista. Ninguém se atreve a chegar perto dos corpos.
"Nos pediram para ficar longe, os sabotadores russos podem andar por aí", explica à AFP Volodymyr Rudenko, advogado de 50 anos, voluntário da defesa que passou a madrugada de quarta-feira (2) no local, à espera dos legistas.
De acordo com policiais, as vítimas, ainda não identificadas, seriam de uma família, dizimada pelo ataque: pai, mãe, filha e filho adolescentes. Eles foram mortos quando saíam de uma loja, onde fizeram compras, pouco antes do toque de recolher.
O alarme da loja, com os vidros destruídos, continua tocando.
A quinta vítima é um jornalista de um canal estatal, de acordo com a credencial de imprensa encontrada entre seus pertences.
Uma caminhonete militar, com a palavra "necrotério", chega durante a manhã e os soldados responsáveis pela retirada dos corpos carbonizados lutam contra o frio e o choque para cobrir os cadáveres com uma lona de plástico.
A torre de televisão, uma estrutura de metal de 300 metros de altura, permanece de pé, apesar do impacto da explosão. Outra antena da televisão estatal está sendo usada agora para continuar com as transmissões.
Ao pé da grande estrutura de metal, estilhaços e destroços são observados por dezenas de metros.
"Esta torre é nosso símbolo de verdade, das notícias verdadeiras, da informação livre: é nossa verdade que está sendo atacada", afirma Rudenko.
O local também tem outro simbolismo.
Ao redor, ao longo de vários quilômetros, fica a área de Babi Yar, uma vala comum que contém os restos mortais de 33 mil judeus mortos a tiros neste lugar, em 1941, quando a cidade estava sob ocupação nazista.
O monumento em sua memória, um parque especialmente condicionado que fica a um quilômetro da torre da televisão, não foi diretamente afetado pelos bombardeios.
Em meio às bétulas, o silêncio da neve é subitamente interrompido pelo som inquietante de uma sirene de bombardeio antiaéreo. As esculturas em memória das vítimas, incluindo uma enorme Menorá, o castiçal judeu, permanecem intactas, como observou um jornalista da AFP.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que é judeu, acusou a Rússia de tentar "apagar" a Ucrânia e sua história. Ele pediu que os judeus "não permaneçam em silêncio".
Para o grande rabino da Ucrânia, Moshe Asman, que organiza a retirada da comunidade local da cidade de Kiev, o bombardeio russo contra civis no local é um "crime de guerra".
"Não consigo acreditar no que vejo", afirmou o grande rabino na terça-feira (1º).
Durante a última cerimônia memorial organizada há um mês, em Babi Yar, ele recorda que advertiu: "Uma guerra é muito fácil de começar, mas muito difícil de terminar".