De Camarões à França, a odisseia de Merline para fugir de um casamento forçado

10:08 | Jan. 26, 2022

Por: AFP

Casada à força aos 15 anos, Merline fugiu de Camarões iniciando uma odisseia migratória de quatro anos até a França, passando pelo deserto e o oceano Atlântico e marcada pela violência sexual.

"Me obrigaram a casar com um senhor (...) de 45 anos", explica essa mulher de 30 anos, com tranças de cor preta, dourada e vermelha, que em dezembro conseguiu chegar à França saindo da Espanha.

Com este homem teve seu primeiro filho, o qual deixou em Camarões.

"Agredida e maltratada", Merline, que prefere não fornecer seu sobrenome, ficou "destruída" com esse casamento e foi obrigada a se casar com o irmão de seu marido quando ele morreu em 2016.

"Fugi" no final de 2017, conta à AFP. Ameaçada pela família de seu marido, fugiu primeiro para a casa de sua mãe e depois para a de uma amiga que deu a ela 60 euros para pagar os contrabandistas para entrar na Nigéria.

Trabalhou lá durante três meses em um restaurante para arrecadar os 350 euros exigidos por outros contrabandistas para levá-la à Argélia através do Níger, pelo deserto.

Então "começa o mais difícil", porque no deserto "você não pode fugir" dos estupros, acompanhados de "chantagem" dos traficantes, que ameaçam abandonar suas vítimas.

O caminho para a Argélia é marcado por "abandonos", "mortes" e água que "cheira a combustível" distribuída em latas de gasolina, relata.

Ao chegar em Tamanrasset, no sul da Argélia, passou vários dias trancada em uma casa sem sair, com medo da polícia.

Os traficantes levam as "mulheres novas" recém-chegadas a "pequenos bares", onde muitas se veem "obrigadas" a se prostituir para pagar o resto de sua viagem à Europa. Ela escapou por pouco deste destino graças à ajuda de outro emigrante, do Camarões, o pai de seu segundo filho, que agora tem dois anos, e do terceiro, do qual está grávida.

Juntos foram levados ao Marrocos. Ela acabou partindo sozinha para o Saara Ocidental para depois tentar chegar ao arquipélago espanhol das ilhas Canárias, porque seu acompanhante carecia de recursos para pagar a travessia, mas espera poder se reunir com ela na França algum dia.

Na península de Dajla, no oceano Atlântico, Merline pagou 2.500 euros aos traficantes para levá-la junto ao seu filho.

Entrou no mar com um barco de pesca que compartilhou com cerca de sessenta pessoas, um terço delas mulheres e cerca de dez crianças.

"Lá você está nas mãos de Deus", porque, "no menor erro, você está na água, e não há ninguém que arrisque sua vida para vir te buscar".

Após dois dias no mar, chegou à ilha espanhola de Gran Canaria, onde passou dois meses antes de ser enviada pelas autoridades para um centro de acolhida de imigrantes em Sevilha (sul da Espanha).

Mas queria ir para a França para "educar meu filho em francês" e economizou para continuar sua viagem para a cidade fronteiriça de Irún, no País Basco, onde decidiu -- como muitos migrantes -- pagar 100 euros para cruzar a fronteira com um "táxi-máfia".

Se hoje Merline consegue contar sua história, é "para ajudar os que ficaram para trás e os que estão pensando em empreender neste caminho", diz essa "entusiasta de cabeleireiro", que também se vê cuidando de "pessoas idosas ou crianças".

tpe/mg/al/CHZ/zm/aa