Premier sudanês se demite dois meses após golpe de Estado e a violenta repressão

O primeiro-ministro Abdullah Hamdok, rosto da ansiada transição para um regime civil democrático no Sudão, anunciou sua demissão na noite deste domingo (2), dois meses após o golpe de Estado militar no país e depois de dias de uma repressão violenta.

Em discurso transmitido pela TV pública, Hamdok admitiu que tinha fracassado em sua tentativa de alcançar um consenso e alertou que a "sobrevivência" do Sudão está hoje "ameaçada".

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Segundo ele, as diferentes forças políticas neste país que saiu em 2019 de uma ditadura islamita-militar de 30 anos, chefiada por Omar al Bashir, estão "fragmentadas" demais. A isso se soma que os dirigentes civis e militares têm posturas irreconciliáveis para que um "consenso" encerre "um banho de sangue" e torne realidade o lema da revolta de 2019: "Liberdade, paz e justiça".

Este ex-economista da ONU, que conseguiu que parte da dívida do Sudão fosse enterrada e tirou o país do isolamento internacional, não teve um momento de descanso desde o golpe de 25 de outubro de 2021.

Naquele dia, o general Abdel Fattah al Burhan, comandante do exército, ordenou sua prisão domiciliar. E junto com ele, a de todos os que encarnavam a transição para um regime civil desde 2019.

O general Burhan prolongou seu mandato por dois anos e um mês após dissolver as instituições, voltou a colocar Hamdok no cargo de primeiro-ministro, mas após ter substituído várias autoridades desta transição civil.

Ao aceitar um acordo com Burhan, Hamdok deixou de ser um herói e se torna um traidor para muitos sudaneses. Os manifestantes que criticavam Burhan nas ruas, também passaram a criticá-lo. Em um país praticamente governado por militares nos últimos 65 anos, grande parte dos cidadãos não quer "nem associação, nem negociação" com o exército.

E o dizem em alto e bom som, embora ponham em risco suas vidas, como aconteceu neste domingo, quando milhares de sudaneses voltaram às ruas e três deles morreram nas mãos das forças de segurança, baleados e espancados.

Desde 25 de outubro, ao menos 57 civis morreram na violenta repressão destes protestos e centenas ficaram feridos.

As forças de segurança bloqueavam desde a madrugada de domingo as pontes que ligam Cartum aos subúrbios e as principais vias da capital, como fazem toda vez que são convocadas manifestações contra o golpe.

Além disso, as autoridades voltaram a cortar durante horas o acesso à internet móvel, bem como o funcionamento dos telefones celulares. E membros das forças de segurança vigiavam os pedestres do alto de blindados com armamento pesado.

Apesar desta mobilização, milhares de manifestantes atenderam neste domingo à convocação "em memória dos mártires" da violenta repressão.

Os manifestantes voltaram a pedir o retorno dos militares aos quartéis e foram dispersados violentamente ao se aproximar dos arredores do palácio presidencial, segundo um jornalista da AFP no local.

Os manifestantes destacaram que em 2022 deve "continuar a resistência" e pedem justiça não só para os civis mortos desde o golpe, mas também para as mais de 250 pessoas mortas durante a "revolução" popular de 2019, que forçou o exército a expulsar Bashir.

Além dos mortos e dos cortes de telefones e internet, a ONU denuncia o estupro de pelo menos 13 manifestantes em dezembro em um país que, desde sua independência há 65 anos, quase sempre esteve sob controle militar.

Os países europeus já tinham expressado sua indignação com a escalada de violência, assim como o secretário de Estado americano, Antony Blinken, e a ONU.

Todos defendem regularmente a volta do diálogo como condição prévia à retomada da ajuda internacional, interrompida após o golpe de Estado.

Blinken já tinha advertido que os Estados Unidos estavam "prontos para responder a todos aqueles que quiserem impedir que os sudaneses continuem aspirando a um governo civil e democrático".

bur-sbh/grp-bl/lda/mvv

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