Dois mortos em repressão de manifestantes no Sudão
14:10 | Jan. 02, 2022
As forças de segurança sudanesas mataram, neste domingo (2), dois manifestantes nos arredores de Cartum, durante protestos contra o poder militar, que continuam apesar do gás lacrimogêneo, do corte de comunicações no país e da mobilização de soldados armados.
Os dois manifestantes morreram em Omdourman, nos arredores da capital Cartum. De acordo com um sindicato de médicos pró-democracia, uma das vítimas foi baleada no peito e a outra sofreu "uma violenta pancada na cabeça que partiu seu crânio".
Como em todos os protestos, que se tornaram regulares desde o golpe de Estado do general Abdel Fattah al-Burhane em 25 de outubro, as autoridades tentaram, mais uma vez, neste domingo, impedir a mobilização erguendo barreiras físicas e virtuais.
Cartum está isolada há vários dias por contêineres colocados nas pontes sobre o Nilo. A internet e redes de telefonia pararam de funcionar esta manhã e, nas principais estradas, membros das forças de segurança em veículos blindados com metralhadoras vigiavam os transeuntes.
Apesar disso, milhares de sudaneses responderam ao apelo dos militantes para se manifestarem "em memória dos mártires".
Porque se 54 pessoas morreram e centenas ficaram feridas desde o golpe, o país experimentou um novo pico de violência na quinta-feira, com seis manifestantes mortos em Cartum, de acordo com um sindicato de médicos pró-democracia.
Violência que aconteceu a portas fechadas naquele dia porque, além de isolar o país do mundo e Cartum de sua periferia, policiais prenderam e espancaram jornalistas de dois canais sauditas.
Hoje, milhares marchavam aos gritos de "os soldados no quartel" e "poder ao povo", enquanto jovens em motocicletas cruzavam a multidão, prontos para socorrer feridos, pois a cada mobilização as ambulâncias são bloqueadas pelas forças de segurança.
Os militantes pedem que 2022 seja "o ano da resistência", exigindo justiça para os manifestantes mortos desde o golpe, mas também para os mais de 250 civis mortos durante a "revolução" de 2019.
Naquele ano, a pressão popular obrigou o exército a destituir um dos seus, Omar al-Bashir, após trinta anos de ditadura militar islamita.
Depois, generais e civis concordaram com um cronograma de transição que exigia a entrega de todo o poder aos civis antes de eleições livres em 2023.
Mas em 25 de outubro, o general Burhane estendeu com o que chama de "correção do curso da revolução", mantendo seu mandato à frente do país por dois anos e reinstalou um mês depois o primeiro-ministro civil Abdallah Hamdok.
Este último não aparece em público há dias, enquanto os rumores de demissão aumentam.
O poder ainda luta para apresentar aos 45 milhões de sudaneses o governo civil que havia prometido no final de novembro ao libertar Hamdok da prisão domiciliar.
Num país quase sempre sob o domínio militar desde a sua independência há 65 anos, os manifestantes proclamam: "nem parceria, nem negociação com o exército".
Mais uma vez neste domingo, as autoridades sudanesas serão observadas pela comunidade internacional que denuncia a escalada.
Além das mortes e cortes de telecomunicações, as forças de segurança também são acusadas de terem recorrido em dezembro a uma nova ferramenta de repressão: o estupro de pelo menos 13 manifestantes, segundo a ONU.
E todos os dias e em cada bairro, os Comitês de Resistência - pequenos grupos que organizam manifestações - anunciam novas prisões ou desaparecimentos.
Os europeus já expressaram indignação, assim como o secretário de Estado americano, Antony Blinken, e a ONU.
Todos defendem o retorno ao diálogo como pré-requisito para a retomada da ajuda internacional, que foi cortada após o golpe.
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