30 dias para as eleições nos EUA: um resumo do que aconteceu até agora
Trump, Biden, colégio eleitoral, Black Lives Matter, coronavírus, Suprema Corte... O POVO resumiu os pontos mais importantes do que já aconteceu até agora nas eleições presidenciais dos EUATrump, Biden, colégio eleitoral, coronavírus, debate presidencial, Black Lives Matter, republicanos, democratas, convenções, primárias, Suprema Corte… Todas essas são palavras você deve ter ouvido, neste ano, desde o início do processo de sucessão presidencial nos Estados Unidos. A partir deste domingo, 4, faltam 30 dias para as eleições gerais, realizadas 3 de novembro - embora muitos estados já tenham começado a votar pelo correio -, quando os estadunidenses devem escolher não só o próximo presidente da maior economia e maior potência militar do mundo, mas também renovar parte do Congresso.
Em plena campanha eleitoral, a Casa Branca confirmou nessa sexta-feira, 2, que o presidente republicano Donald Trump, de 74 anos e a primeira-dama Melania Trump contraíram o novo coronavírus e vão entrar em isolamento. Em seguida, Trump foi internado em hospital militar, onde está em tratamento, embora, de acordo com a versão oficial, seus sintomas sejam “leves”.
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O indicado democrata para enfrentar Trump, Joe Biden, de 77 anos, lidera as pesquisas na disputa e desejou ao mandatário uma rápida recuperação. Mesmo com este parênteses, os embates eleitorais não devem amainar nos 50 estados do país. A disputa continua não só pelo voto, mas para conseguir que os eleitores compareçam às urnas - nos EUA, o voto não é obrigatório.
O POVO separou e resumiu os pontos mais importantes de tudo que já aconteceu para quem quer entender tudo que vai acontecer a partir de agora. Confira:
Os dois grandes partidos nos EUA: Republicano e Democrata
Nos EUA, duas grandes siglas monopolizam o cenário eleitoral: o Partido Republicano e o Partido Democrata. Os dois têm se alternado na Presidência e dominado as duas casas do Congresso Nacional - Senado e Câmara dos Representantes - desde a segunda metade do século XIX.
Embora existam outros partidos e mesmo candidatos independentes, a representação destes costuma ser ínfima a nível nacional. Dos 100 senadores norte-americanos, apenas dois não são republicanos ou democratas. Hoje, na Câmara, dos 435 assentos, 4 estão vagos e 1 é ocupado por um membro do Partido Liberal. O restante, 430, está dividido entre republicanos e democratas.
Por sua estrutura e capilaridade, ganhar a indicação de um dos dois partidos para concorrer à presidência é, atualmente, o único meio de ter chances reais de chegar à Casa Branca. Quando Donald Trump concorreu pela indicação em 2016, era um outsider, não fazia parte das fileiras do partido, mas disputou a máquina partidária com os caciques republicanos para concorrer sob a tradicional bandeira vermelha do partido.
Justamente por isso, as eleições presidenciais começam bem antes do período eleitoral propriamente dito. Começam ainda no início do ano, com as primárias, isto é, o período em que os partidos votam para escolher seus candidatos.
Quando começou o processo para concorrer à presidência nos EUA?
O processo para escolher o candidato que concorre nas eleições de novembro nos EUA é longo e complexo para os dois partidos. Neste ano, por Trump já ocupar a Casa Branca e ser, por ora, o líder incontestável do Partido Republicano, o processo foi mais simples para eles. Em vários estados, as primárias republicanas sequer ocorreram. Outros deram a vitória logo a Trump. Mas, de todo modo, o bilionário enfrentou alguns concorrentes, todos derrotados.
Já as primárias democratas podem ser utilizadas para explicar melhor como funciona este processo lá. As primárias ocorrem em todos os estados do país e nos territórios, como Porto Rico e Guam. Qualquer um pode se candidatar, desde que cumpra os requisitos constitucionais para ser presidente. Inclusive, quem não é do partido pode concorrer, como Bernie Sanders, que nunca se filiou aos Democratas oficialmente, mas sempre buscou a nomeação do partido.
Dentro do Partido Democrata existem 3.979 delegados, uma espécie de autoridade regional da sigla. São eles que votam para escolher o presidenciável. Para ter a indicação, é preciso conquistar 1.991 votos de delegados, no mínimo. E como isto ocorre? Nas votações estaduais. Cada estado tem um número de delegados do partido. Os eleitores de modo geral são convocados a votar para escolher quem eles querem que concorra. O candidato que ganhar no estado leva os delegados daquela região.
Existem dois tipos de votação nesses processos: as primárias (o mesmo nome) e os caucus. Os caucus são assembleias populares convocadas pelos partidos nas cidades. Lá, os cidadãos reunidos erguem as mãos para escolher entre os candidatos que se apresentam.
Já as votações primárias são mais semelhantes a eleições como conhecemos: o voto é secreto, tem um horário definido, são utilizadas urnas. Assim, é necessário ganhar em um determinado número de estados para ir colhendo delegados.
Quem concorreu nas primárias nos EUA?
Pelo menos 13 candidatos concorreram pela indicação democrata em 2020. Entre eles, o veterano Bernie Sanders e Joe Biden, ex-vice-presidente no governo Obama. Além destes dois, apenas 4 do total de candidatos conseguiu amealhar algum delegado.
Os ex-prefeitos Pete Buttigieg e Michael Bloomberg conseguiram 26 e 61 delegados, respectivamente. As senadoras Elizabeth Warren e Amy Kobluchar chegaram a 64 e 7 delegados, respectivamente. Quando eles desistiram da corrida, restaram Biden, com 664 delegados, e Sanders, com 573.
A partir daí, os pré-candidatos dividiram-se em apoios. A maioria apoiou Biden, que finalizou a corrida pela indicação. Quando Sanders desistiu da disputa, Biden já estava na casa dos 1.200 delegados, a uma distância de pouco de mais de 700 para ganhar a indicação, mas em um estágio já considerado irreversível para a campanha de Sanders.
Não obstante, em meio às primárias, outro evento de escala mundial veio a lançar esta concorrência interna em segundo plano - a pandemia do novo coronavírus.
A pandemia do coronavírus e as eleições nos EUA
Quando o coronavírus lançou sobre o mundo a sombra da maior crise sanitária do século, os EUA estavam a todo vapor para as eleições. Com a chegada do vírus a solo norte-americano, os democratas interromperam as primárias presenciais e as atividades de campanha. Joe Biden entrou em isolamento, enquanto o presidente Donald Trump minimizou a pandemia, embora tenha adotado algumas medidas sanitárias como a interrupção de voos internacionais para os EUA.
Hoje, os Estados Unidos são o país com o maior número de mortes pela doença, mais de 200 mil, um quinto de todas as mortes ocorridas no mundo. É justamente neste ponto que Trump é pior avaliado pelo eleitorado, sobretudo em um país que discute há anos medidas para facilitar o acesso ao sistema de saúde, que é privado e bastante caro.
Joe Biden acusa Trump de negligência e culpa o presidente pelas mortes. Assim como o Brasil, o país vive uma onda negacionista de pessoas que não acreditam no vírus e se recusam a utilizar máscara. Com as medidas de distanciamento social em vigor em vários estados, a campanha eleitoral ganhou novos ares, com eventos menores, máscaras, forte investimento digital.
Para Trump, foi uma reviravolta. No início do ano, o presidente vivia um dos seus melhores momentos. Havia sido absolvido de um processo de impeachment, os índices de emprego eram os melhores em décadas, os democratas estavam à deriva sem um nome que unificasse o partido como fez Barack Obama em 2008.
A chegada do vírus mudou a direção dos ventos para Trump, ventos que se agitaram até virar tempestade com a eclosão dos protestos anti-racismo no país.
Os protestos anti-racismo do Black Lives Matter nos EUA
No dia 25 de maio, o policial Derek Chauvin pôs o joelho sobre o pescoço de George Floyd, de 46 anos, e por mais de 9 minutos sufocou o homem enquanto era filmado por populares. A cena foi simbólica em um país marcado por uma escravidão violenta e ainda brigado com o seu passado: era um homem branco, um agente do Estado, matando à luz do dia um homem negro já rendido.
Quando as imagens circularam o mundo, eclodiram por todo o território dos Estados Unidos alguns dos maiores protestos vistos desde os movimentos liderados por Martin Luther King. Houve confrontos, prisões, mortes. Trump impôs ao movimento anti-racista uma pecha de violento, perigoso, ameaçou pôr as Forças Armadas nas ruas. Sugeriu que os democratas estavam envolvidos e encontrou na ocasião uma oportunidade para se apresentar como o único candidato que poderia restabelecer a ordem no país.
Biden e os democratas condenaram depredações e violência, mas demonstraram apoio ao movimento que ficou conhecido por Black Lives Matter (Vidas negras importam). A pauta anti-racista entrou com força na campanha e é, segundo mostram as pesquisas, um dos calcanhares de Aquiles de Donald Trump. Mais tarde, Biden, um homem branco septuagenário, escolheu a senadora californiana Kamala Harris, uma mulher negra filha de pais imigrantes, como candidata à vice-presidente.
A nova vaga para a Suprema Corte nos EUA
Em setembro, um novo terremoto redesenhou a disputa eleitoral. A juíza progressista Ruth Bader Ginsburg, integrante da Suprema Corte, faleceu aos 87 anos após complicações em decorrência de um câncer. A morte RBG, como era conhecida, lançou no debate eleitoral a discussão de quem deveria indicar o nome para suceder RBG: o atual presidente, em fim de mandato, ou o vencedor das eleições de 3 de novembro?.
Biden defende que o próximo presidente, seja ele ou mesmo Trump, indique o nome. Isto é, que a discussão da vaga ocorra somente após as eleições por aquele chancelado nas urnas. Trump, por outro lado, já apresentou o nome de Amy Coney Barrett para a vaga de RBG. Barrett é uma juíza federal católica e ultraconservadora que, como temem vários setores mais progressistas da sociedade, pode fazer com que a mais alta Corte de justiça do país ganhe uma composição majoritariamente conservadora por décadas, já que nos EUA o cargo é vitalício.
A decisão final, no entanto, é do Senado, de maioria republicana. Em 2016, no ocaso do governo Obama, o juiz da Suprema Corte Antonin Scalia faleceu inesperadamente. Obama indicou um nome para a vaga, mas o Senado republicano afirmou que, pela proximidade das eleições, marcadas para dali a dez meses, a indicação deveria ser feita pelo novo presidente. Desta vez, no entanto, a um mês das eleições, o mesmo Senado acredita que Trump tem o direito de fazer a indicação e pretende confirmá-la o quanto antes.
O início da campanha nos EUA
Após restar apenas Biden na corrida pela indicação democrata, ele se tornou indicado de fato o partido, embora ainda precisasse passar pela convenção partidária. Convidou Kamala Harris, com quem concorreu pela nomeação democrata, para sua vice-presidência. Trump relançou a chapa composta por ele e o atual vice, Mike Pence. Tanto o democrata quanto o republicano foram confirmados por seus partidos nas respectivas convenções no mês de agosto, realizadas em parte presencial, em parte online.
Na terça-feira, 29 de setembro, os dois protagonizaram um debate agressivo, principalmente pela atuação de Trump, que interrompeu e desdenhou Biden ao longo de toda a discussão. O presidente chegou mesmo a discutir com o moderador, um apresentador da emissora conservadora Fox News.
Diante da ferocidade de Trump, Biden gaguejou, riu e chegou a chamar Trump de “palhaço”, além de ter mandado o presidente da maior potência do mundo “calar a boca”. Segundo pesquisa da CNN, a maior parte do eleitorado acredita que Biden venceu o debate, embora, como demonstram vários levantamentos, a esta altura a maior parte dos norte-americanos já está decidida.
Outros dois debates ainda estão previstos até o dia 3 de novembro. Embora tenham efeito limitado para mudar a percepção do eleitor, têm como principal objetivo mobilizar a base das candidaturas e, sobretudo, incentivar os eleitores a votar, já que nos EUA o voto não é obrigatório.
Os próximos dias da corrida eleitoral nos EUA
Iniciada a corrida final pelo cargo, os candidatos precisam conquistar uma maioria de 270 delegados no Colégio Eleitoral, o órgão que escolhe o presidente, já que nos EUA o voto popular elege o presidente indiretamente. Cada estado tem um número de delegados baseado em sua população.
Acontece que a maioria dos estados tem uma preferência há décadas: sempre vota em um republicano ou em um democrata. Os estados que mudam de voto, ora republicano, ora democrata, são chamados estados-pêndulo. São poucos, mas é neles que está a chave para vencer.
O diagnóstico de Donald Trump, infectado com coronavírus, é mais elemento para bagunçar a esta conturbada eleição presidencial. Se a doença seguir o ciclo comum, de 14 dias, Trump ainda perde quase metade do tempo de campanha que ainda resta, em um momento que o seu adversário, Joe Biden, figura a frente de todas as pesquisas.
Trump estava de viagem marcada para a Flórida, um dos estados-pêndulo e um dos estados com o maior número de delegados no Colégio Eleitoral. A saúde do presidente costuma ser um tema caro aos norte-americanos, por isso assessores de Trump avaliam que o mandatário faça um pronunciamento à nação afirmando estar bem e governando o país.
Biden fez o teste de Covid-19 e deu negativo. Ainda assim, a percepção do estado de saúde de Trump no eleitorado pode refletir no democrata de 77 anos. Os dois tinham um segundo debate marcado para 15 de outubro, mas agora deve ser adiado. A tendência também é que eventos de campanha fiquem ainda menores, com menos pessoas.
A situação toda é singular. Segundo a mídia norte-americana, nenhum presidente na história recente teve um problema de saúde em pleno processo eleitoral, o que pode complicar as pretensões de reeleição de Trump em um momento que, segundo a maioria das pesquisas, Biden lidera por 7 pontos de vantagem a preferência do eleitorado.