Até 100ºC: conheça cinco animais adaptados ao calor

Graças a suas habilidades, estes animais conseguem sobreviver em ambientes inóspitos ou temperaturas extremas, como o deserto mais quente do mundo e próximo a fissuras geotermais

09:00 | Jul. 19, 2020

Por: Leonardo Igor
Camelos são desclassificados em concurso na Arábia Saudita por uso de botox e intervenções estéticas (foto: Wikimedia Commons)

Quando os termômetros disparam, os seres humanos abusam da criatividade para escapar às temperaturas escaldantes. Menos roupa, mais água, praia, ar-condicionado, ventilador, o que tiver à mão é válido. Mas, na natureza, é preciso ser mais criativo, afinal, os animais só podem contar com aquilo que está ao seu redor e com que aprenderam. E alguns deles precisam driblar temperaturas abrasantes, que podem até matá-los. Mas como eles conseguem sobreviver a tais condições térmicas?

Entre os animais selecionados pelo O POVO, há até um recordista de tolerância a calor, o que o insere na seleta lista de seres extremófilos, isto é, “organismos que vivem em condições que não favorecem formas de vida baseadas em carbono e que usam água como solvente. Essencialmente, quase toda a vida na Terra”, explica o professor do Laboratório de Evolução e Ecologia Comportamental da Universidade Federal do Ceará (UFC), Lorenzo Zanette. Segundo o docente, nessas condições se encaixam principalmente microrganismos, os animais macro são exceção.

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Estes animais que criaram adaptações a condições extremas - de temperatura ou de pressão, por exemplo - fizeram um longo percurso de adaptação evolutiva. “Quem determina essa variabilidade? Uma série de fatores, tamanho da população, histórico evolutivo dela, de onde veio, como, estabilidade do ambiente em que ocorre”, discorre Zanette. E acabam ficando, de certo modo, reféns do território que habitam: “Espécies encontradas em ambientes muito quentes, por exemplo, variam, mas não variam o suficiente para colonizar um lugar frio. Ou seja, quanto menor variabilidade nas condições do ambiente, em geral menor será variabilidade adaptativa”, conclui o especialista.

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Confira a seguir uma lista de animais que, graças a suas habilidades, consegue sobreviver em ambientes inóspitos ou temperaturas extremas. As informações são do National Geographic, do site Animalia e da União Nacional pela Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).

Cinco animais adaptados ao calor:

- O esquilo da terra do Cabo


Este animalzinho parece familiar por causa de um primo norte-americano famoso, o esquilo cinzento (Sciurus carolinensis), retratado em diversas produções de Hollywood - algumas até como protagonista. Mas, na verdade, eles são diferentes: este é o esquilo da terra do Cabo (Xerus inauris) e, diferente do parente, vive no Sul da África. Outra diferença entre os dois é que este esquilo tropical é mais terrestre - leva uma vida junto ao solo, e não nas árvores. Ele habita territórios de savana e de deserto. Chama atenção sua resistência à variação de temperatura: no seu habitat, os termômetros podem variar entre 30 e 60ºC de dia, dependendo da região. O pequenino vive em tocas na terra, que servem tanto para fugir do calor quanto para se camuflar dos predadores.

Para manter a termorregulação do corpo, estes mamíferos costumam tomar “banhos de areia” e usar a cauda espessa como um guarda-sol, protegendo a cabeça dos raios solares. Como são bem espertinhos, também usam o astro-rei a seu favor: pesquisas recentes descobriram que estes animais herbívoros escondem comida, mas, por exemplo, no deserto de Kalahari, onde eles podem ser encontrados, há poucos arbustos. Então, o Xerus inauris utiliza a posição do sol para esconder e encontrar os alimentos armazenados.


- A gazela dorcas


Este herbívoro ostenta um título singular: é a única espécie de antílope - grupo de mamíferos bovídeos - que vive em dois continentes. Isso porque a Gazella dorcas está tanto na África quanto na Ásia. Mas sempre em regiões desérticas e semidesérticas. Habita o Norte e o Chifre da África e até para lá do rio Nilo, chegando a Israel e a Jordânia, no Oriente Médio. Pode ser encontrada no Saara, o deserto mais quente do mundo. Para driblar as temperaturas sufocantes, quando o calor está asfixiante, esta gazela troca o dia pela noite e realiza suas atividades sob o céu estrelado e as temperaturas baixas.

Apesar de não ser uma espécie de hábitos monogâmicos, quando os termômetros disparam e, por consequência, os alimentos escasseiam, estes antílopes costumam viver como casais: assim, um ajuda ao outro e só precisam dividir o alimento entre si. A Gazella dorcas é caçada para alimentação pelas populações locais, e chegou a desaparecer de algumas regiões. Atualmente, a União Internacional para Conservação da Natureza considera a população desta espécie em franca redução.

 

- Camelo


O camelo é possivelmente o animal mais famoso desta lista. Símbolo do deserto, o quadrúpede vive na África, na Ásia e até na Oceania. Atualmente, o animal está praticamente extinto na vida selvagem - quase toda a sua população, que supera os milhões, é domesticada. Apenas na China (no deserto de Gobi) e na Austrália (para onde foram levados no século XIX) é possível encontrar estes espécimes em bom número na natureza. Hoje, sobreviveram apenas duas espécies: o dromedário (Camelus dromedarius), que possui apenas uma corcova nas costas, e o camelo-bactriano (Camelus bactrianus), que possui duas corcovas.

O camelo é moldado para resistir ao calor. Sua pelagem evita a transpiração. Urina bem pouco apesar da sede: pode beber, de uma parada, mais de 100 litros de água. Ao contrário da crença popular, a corcova não serve para guardar água. O lugar contém uma gordura rica em energia que o camelo metaboliza para se manter quando há pouco alimento. Graças a este metabolismo, pode se manter por semanas.

No Império, dom Pedro II acreditou que os animais, pela resistência e características, podiam ser úteis para o Nordeste brasileiro. Mandou trazer um pequeno rebanho, que desembarcou no Brasil em 1859. Faltavam, no entanto, criadores especializados. A maior parte dos animais acabou por morrer e os sobreviventes viraram atração turística.

 

- Formiga-prateada-do-Saara


A classe de insetos detém a menor expectativa de vida do reino animal - crescem mais rápido e morrem primeiro. Talvez por isso, a formiga-prateada-do-Saara (Cataglyphis bombycina) não perde tempo: é a mais rápida do mundo. E a pressa é justificada, para além do relógio da vida. A formiga vive um ambiente de areias escaldantes, em que a temperatura pode chegar a 60ºC, o suficiente para matá-la. Portanto, a colônia sai para buscar alimentos apenas uma parte do dia, quando o clima está mais ameno, por volta de 47ºC.

A Cataglyphis adota uma técnica que permite andar 47 passos (seus pequenos passos de formiga) por segundo e até mesmo dar alguns galopes, de modo a não afundar na areia. Mas a preparação para a corrida começa antes de sair do ninho. Assim como outros animais, esta corredora produz as proteínas do choque térmico (HSP, na sigla em inglês), que ajudam a proteger o metabolismo das altas temperaturas externas. Mas, diferentes dos outros animais, o organismo da formiga-prateada-do-Saara não espera o calor para começar a produzir a proteção. A produção de HSP começa antes dela se expor ao sol abrasante do deserto mais quente do mundo. Assim, quando saem da toca, estão protegidas.

 

- Verme-de-pompeia


Já pensou viver em uma panela de água fervendo? É mais ou menos como vive o verme-de-pompeia (Alvinella pompejana). Só que sua água é salgada, pois vive nas profundezas do mar. E o calor não vem do fogo, mas de fissuras geotermais, por onde emerge o calor do núcleo da Terra para o oceano, em um fluxo conhecido como fumarola. As fumarolas negras, carregadas de metais, podem chegar a 300ºC. Já as fumarolas brancas atingem 60ºC. É neste clima que vive o verme-de-pompeia.

Ele pode suportar até 105ºC, o que o torna animal complexo mais tolerante ao calor conhecido pela ciência. Por isso, é classificado como um extremófilo, denominação atribuída a animais que vivem em condições extremas, prejudiciais a maioria das outras formas de vida. Inclusive, seu nome vem da antiga cidade romana de Pompeia, destruída pelo calor e pelas cinzas da erupção do vulcão no monte Vesúvio, em Nápoles, na Itália.