Bolsonaro tentou se manter no comando do Brasil de um quarto de hospital

A saída de Jair Bolsonaro do hospital, após mais de duas semanas de internação, deve reativar a agenda do governo, começando com a crucial reforma da aposentadoria prometida pelo candidato aos investidores, dizem os analistas.

Bolsonaro, de 63 anos, recebeu alta após superar as complicações decorrentes de uma cirurgia abdominal à qual foi submetido em decorrência da facada que sofreu durante a campanha eleitoral no ano passado.

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Durante este período de administração em ritmo de espera, ficaram expostos atritos e lutas pelo poder em seu novo governo.

Segundo seu porta-voz, Otávio do Rego Barros, o ex-capitão do Exército acordou "animado e ansioso para voltar a Brasília, sua casa".

Nos próximos dias, será feita uma avaliação para decidir o ritmo de retomada de sua agenda.

Uma dos elementos de tensão ocorridos nesses dias de internação manifestou-se entre Bolsonaro e seu vice-presidente, Hamilton Mourão, que só o substituiu no cargo no dia da operação e no dia seguinte.

Desde então, Bolsonaro voltou a assumir suas funções, mesmo do quarto de hospital, embora os médicos o mantivessem até agora em um regime de visitas restritas e recomendaram que ele falasse o menos possível.

"Você quer me matar? ", indagou Bolsonaro a Mourão em uma conversa por telefone no fim de semana passado, segundo relatou o vice-presidente à imprensa, esclarecendo que se tratava de uma brincadeira.

Vários analistas, no entanto, consideram que a atividade reduzida de Bolsonaro gerou consequências.

Houve "uma espécie de vácuo de poder nessas semanas, com a longa ausência do presidente", afirmou Thomaz Favaro, diretor da empresa de consultoria Control Risks.

"Acho que gera um pouco de preocupação. O governo já nomeou centenas de funcionários para as empresas públicas, órgãos reguladores, até ministros de gabinete, e, embora eles tenham recebido normativas ou ideias sobre como devem se portar, muitos ainda tem dúvidas sobre como eles devem implementar a sua agenda", acrescentou.

Bolsonaro, 63 anos, foi submetido em 28 de janeiro a uma cirurgia para retirar a bolsa de colostomia que precisou usar após o atentado de 2018.

Durante sua hospitalização, Bolsonaro quis manter a imagem de um líder à frente do país. Sua principal ferramenta, como durante a campanha eleitoral, tem sido as redes sociais, através das quais publica textos, fotos e vídeos de suas atividades diárias e o progresso de sua recuperação e comentários sobre questões políticas.

Seus poucos visitantes eram vistos usando máscaras higiênicas, como uma condição médica clara para que pudessem se encontrar com o chefe de Estado convalescente.

Os brasileiros monitoraram diariamente seu estado de saúde por meio de boletins médicos e coletivas de imprensa de seu porta-voz, que relatou contratempos como o registrado há alguns dias com o surgimento de uma pneumonia.

Mas as disputas entre seus aliados em torno das prioridades de seu governo e das diretrizes da reforma previdenciária criaram alguns desgastes que Bolsonaro deverá resolver rapidamente assim que retornar a Brasília.

E terá de conter a influência de Mourão, um general na reserva que, apesar de não tê-lo substituído oficialmente, andou bem ativo em seus contatos com políticos, jornalistas e diplomatas.

O vice-presidente irritou as pessoas mais próximas de Bolsonaro - incluindo seus filhos, três dos quais são políticos - ao questionar publicamente os argumentos oficiais que justificaram a flexibilização da posse de armas e a promessa presidencial de transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém.

Em editorial, o Estado de São Paulo lamentou a "paralisia administrativa" causada pela prolongada hospitalização de Bolsonaro.

"O governo hoje é exercido por alguém sem condições de saúde para tal, sofrendo influência direta e ampla dos filhos - que não receberam um único voto para presidente nem ocupam cargos de ministros. O exercício da Presidência pelo vice-presidente deve respeitar o que diz a Constituição, e não o que ditam os filhos do presidente. Não se trata de uma questão familiar, mas institucional".

A reforma da Previdência complica ainda mais a situação nos bastidores. Bolsonaro conquistou a presidência, em parte, por prometer aos investidores uma revisão da economia protecionista do Brasil. A tarefa foi delegada a seu ministro da Economia, Paulo Guedes, um liberal formado nos Estados Unidos.

Os dois estão publicamente em sintonia, mas mantêm diferenças em torno do tema da reforma previdenciária, essencial para a limpeza das contas públicas.

O chefe do gabinete, Onyx Lorenzoni - que diz ter uma relação distante com Guedes - disse que o projeto será apresentado esta semana antes de ser enviado ao Congresso, mas somente depois de ter o apoio de Bolsonaro.

O vazamento de um rascunho na semana passada mostrou divergências dos conceitos inicialmente defendidos por Bolsonaro sobre a idade mínima para se aposentar.

A reforma exigirá mudanças constitucionais que devem ser votadas por maioria qualificada de três quintos do Congresso.

Se aprovada, poderá gerar uma economia de até um bilhão de reais em uma década, segundo Guedes.

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