Em meio a tumulto e protestos, Assembleia Nacional da Venezuela toma posse em Caracas. Pela primeira vez em 16 anos, oposição detém maioria legislativa. No entanto, medidas de Maduro visam enfraquecer coalizão da MUD.
Cerca de um mês após a vitória eleitoral da oposição, a nova Assembleia Nacional da Venezuela tomou posse nesta terça-feira (05/01) em meio a tumulto, atrasos e protestos. Pela primeira vez em 16 anos de chavismo a oposição detém a maioria parlamentar, embora manobras recentes demonstrem que o governo do presidente Nicolás Maduro visa limitar o campo de ação dos deputados ligados à coalizão oposicionista Mesa de Unidade Democrática (MUD).
Em primeira votação, a oposição venezuelana conseguiu aprovar a indicação do novo presidente da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup, e a composição da mesa diretora da Casa. Além de Allup, o primeiro vice é Enrique Márquez, e o segundo vice é Simón Calzadilla, todos oposicionistas. A composição teve o respaldo de todos os 109 deputados da oposição. Já os parlamentares aliados de Maduro foram unânimes contra a indicação.
Allup, que pede a renúncia de Maduro, chegou a ser barrado por aliados do presidente venezuelano de entrar na Assembleia Nacional, na segunda-feira. Durante a noite, o prédio administrativo da Assembleia foi pichado com frases em defesa do chavismo e chamando Allup de fascista.
Durante seu juramento, Allup disse que o novo Parlamento está aberto ao diálogo com o governo, mas destacou que a oposição cumprirá sua promessa eleitoral de aprovar uma "Lei de Anistia" para libertar os presos políticos e disse que a oposição vai conseguir uma mudança de governo dentro dos próximos seis meses.
"Vamos buscar, a partir de hoje e dentro de um período de seis meses, uma saída constitucional, democrática, pacífica e eleitoral para o fim deste governo", reiterou.
Horas antes do início da sessão parlamentar, várias ruas e seis estações de metrô foram fechadas na capital, Caracas, devido a protestos convocados por partidários do governo e da oposição. Do lado de fora da sede, milhares de simpatizantes da oposição receberam os deputados oposicionistas com aplausos, enquanto vaiaram os parlamentares chavistas.
Manobras executivas de Maduro
Houve tumulto na entrada da Assembleia Nacional, com relatos de que a polícia local tentou barrar o acesso de 20 deputados oposicionistas do partido Primeiro Justiça, principal força da coalizão MUD. Já o deputado que presidiu a sessão, Héctor Aguero, gerou a primeira desordem parlamentar ao afirmar que quatro deputados entre eles três da oposição não haviam recebido suas credenciais.
Nas eleições, a coalizão formada pela MUD conseguiu 112 dos 167 assentos, contra 55 do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV). Com este resultado, a oposição teria a maioria absoluta de dois terços, necessária para passar legislações que afetam a Constituição ou para demitir altos funcionários.
Na semana passada, porém, a Justiça venezuelana impugnou três deputados da oposição, além de um aliado ao governo, cancelando os resultados no Estado de Amazonas. A justificativa para a impugnação seria uma suposta fraude eleitoral, com Maduro afirmando que a oposição teria comprado votos e infiltrado técnicos responsáveis pelas mesas de votação. Com isso, a oposição perdeu os dois terços, mas mesmo assim manteve, com 109 deputados, a maioria absoluta de três quintos, que já garante aprovar leis como a anistia de presos políticos.
A decisão do Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela (STJ) ocorreu poucos dias após a Assembleia Nacional, na época ainda sob domínio chavista, designar, em sessão extraordinária e por maioria simples, 13 magistrados ao STJ. Na época, a oposição chamou a decisão de "golpe judicial".
Além disso, Maduro aproveitou seus últimos dias antes de expirar sua prerrogativa de governar por decreto para aprovar orçamentos favoráveis aos aliados. E na segunda-feira, o presidente venezuelano tirou do Legislativo o poder de indicar a diretoria do Banco Central do país. Com a mudança, Maduro poderá indicar o presidente e os seis diretores do órgão de política monetária sem precisar da aprovação da Assembleia.
Maduro também limitou o acesso a informações econômicas e documentos secretos e confidenciais do Banco Central. Todas as solicitações, inclusive de parlamentares, terão que ser autorizadas ou negadas pelo próprio presidente do Banco Central. Isso prejudicará a capacidade da Assembleia Nacional de alterar a política econômica do país, que passa por uma crise financeira. A solução da crise foi justamente uma das principais promessas de campanha eleitoral da oposição.
Itamaraty pede respeito à democracia
Em nota, o Itamaraty afirmou, que "o governo brasileiro acompanha com atenção e interesse os desdobramentos das eleições legislativas venezuelanas" e que "confia que será plenamente respeitada a vontade soberana do povo venezuelano, expressada de forma livre e democrática nas urnas".
E em advertência às manobras de Maduro, o Itamaraty destacou ainda que "não há lugar, na América do Sul do século 21, para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia e ao Estado de Direito".
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